“É como se nada de alerta surtisse efeito”, reclama um graduado assessor na Esplanada dos Ministérios, depois de constatar a quase paralisação dos investimentos na pasta devido à falta de aprovação do Orçamento de 2021, ainda pendente de votação no Congresso. Parece inacreditável, mas o País está prestes a entrar em abril sem um plano de custeio avalizado pelos parlamentares. De forma generalizada, os ministérios passaram a enfrentar severas restrições no movimento do caixa por insuficiência de verbas para o seu funcionamento. O “shutdown” está evidente desde meados de dezembro passado, quando a peça orçamentária deveria ter sido liberada e não foi.

No governo, a orientação é a de ir levando até onde der. O presidente Bolsonaro, pessoalmente, não tem realizado esforço algum para mudar o enorme atraso do cronograma. Segundo a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), só é possível, nessas circunstâncias, executar despesas correntes de caráter estritamente inadiável. As demais não podem. Persiste a indefinição. Salários de abril dos servidores, por exemplo, estão em vias de não serem pagos. Enquanto as contas seguem ao Deus dará, na longa e interminável lista de técnicos da Economia que estão deixando o barco por decepção com os rumos tomados, mais um se apresentou.

O Secretário de Gestão e Desempenho de Pessoal da equipe de Guedes, Wagner Lenhart, pediu para sair. Vai voltar à iniciativa privada. Antes dele, já foram embora, dentre outros, Salim Mattar, que cuidava das privatizações, Paulo Uebel, que tratava da Reforma Administrativa, Mansueto Almeida, secretário do Tesouro, Marcos Cintra, da Receita Federal, Amaro Gomes, da Coordenação e Governança de Estatais, e Joaquim Levy, do BNDES. Praticamente todos os principais players da seleção do “Czar” jogaram a toalha. Pediram o boné. Menos o próprio – por enquanto.

Nesse caldeirão de indefinições, a economia brasileira definitivamente se descolou da do resto do mundo – e para pior – colocando ainda mais pressão no Banco Central pela alta de juros. Enquanto as projeções de atividade produtiva em outras praças crescem dia a dia, a do mercado interno encolhe. Ao mesmo tempo, a inflação dá sinais de aceleração. Um quadro que tornou inevitável a remarcação dos juros. O movimento daqui é inverso ao de fora porque a gestão na Saúde e, por consequência, nos fundamentos macroeconômicos, detonaram uma crise de confiança sem precedentes e empurraram o PIB para baixo.

Nem a alta de commodities no mercado internacional tem sido o suficiente para salvar o ano de 2021 dos brasileiros. A situação é tão complicada que expôs o desconforto de diretores do BC em tomar decisões monetárias fora dos planos. Os constantes e pesados leilões de moedas para conter a defasagem de câmbio entram na mesma cesta de ajustes forçados. Todos os levantamentos já prevêem a inflação acima da meta também em 2022 e para barrar o risco de descontrole de preços não há outra saída que não a da volta de calibragens, para cima, na Selic. Impressões colhidas com economistas de várias vertentes apontam para uma frustração e preocupação com os rumos fiscais do País. A maioria teme a perda de efeito de uma política monetária mesmo mais dura.

A inflação não tem dado trégua e os números do PIB não chegaram nem perto do esperado. Neste semestre, a recessão parece precificada, com a carestia chegando perto de 7% ao ano na taxa acumulada de 12 meses. É, segundo a maioria, um processo ainda incipiente, mas já notório, de estagflação. Ninguém tinha na conta até aqui que a alta de preços seria tão virulenta. O câmbio desfavorável ao real vem propiciando mais exportações de produtos e gerando, internamente, a escassez. Isso força a variação no valor do que é ofertado. Os juros em alta somente agravam o poder de compra internamente.