“Nothing is a mistake. There’s no win and no fail, there’s only make”. Em uma tradução livre, “Nada é um erro. Não há vitória ou fracasso. Há simplesmente o fazer”. A regra é uma das dez listadas pela Irmã Corita Kent como parte de um projeto que realizou para uma classe que lecionou no final dos anos 60. E a julguei extremamente adequada para abrir este artigo.

Sem nada a perder e anabolizados pelos hormônios de frequentar os primeiros meses na POLI-USP, ao fundarmos o Buscapé eu e meus sócios (na foto) não tínhamos a menor noção dos incontáveis percalços que surgem (e realmente surgiram) no caminho de quem decide se aventurar a empreender.

Não sabíamos até onde poderíamos chegar, mas carregávamos a certeza de que o pior a fazer era desistir. E estejam certos de que não foram poucas as vezes que o mais sensato parecia ser mesmo jogar a toalha.

Munidos de muita resiliência e uma boa dose de insensatez (ingredientes indispensáveis aos que enxergam no eventual fracasso o caminho para o sucesso), sentimos na pele a delícia e a dor de construir um negócio que, não faltavam indicativos, tinha tudo pra dar errado.

Nossos familiares não entendiam o que fazíamos, os amigos nos olhavam com um misto de pena e curiosidade e, um tanto ressabiados, conseguiam no máximo desejar boa sorte.

Os varejistas resistiam em compartilhar conosco a lista de preços para publicarmos na Internet e permitir ao consumidor comparar suas ofertas com as dos concorrentes. Quando não batiam o telefone na nossa cara, “vocês estão loucos!” era a reação mais branda que ouvíamos.

Mas a inovação sempre vence, doa a quem doer. Sem falsa modéstia, o Buscapé foi disruptivo para o comércio como o Uber está sendo para o transporte público e o Airbnb para o mercado imobiliário. Hoje, ninguém mais imagina fazer compras, seja na Internet ou no shopping vizinho, sem antes acessar o Buscapé. Há 16 anos os varejistas sequer davam preço por telefone.

Feita esta introdução e como inovar é criar algo que ninguém ainda pensou, o importante mesmo é manter as janelas abertas para o que ainda está por vir. E há, certamente, muito o que fazer. Por isso, não vou desperdiçar mais linhas e abusar da paciência dos leitores fazendo um resgate da nossa história.

Quero, permitam-me, aproveitar este post para anunciar o início de uma nova etapa na minha jornada empreendedora.

Com o sentimento bipolar típico dos adolescentes, após 16 anos deixo hoje o posto de CEO do Buscapé Company. O cargo passa a ser ocupado pelo ‘prata da casa’ Rodrigo Borer, que já vem liderando a operação brasileira do Buscapé desde 2010 com extrema competência.

Sigo como Chairman da pequena lojinha que fundamos com nossas bolsas como estagiários do LARC, da USP, intermináveis noites insones, uma coletânea de erros e muito, mas muito aprendizado. Uma lojinha que se tornou uma das maiores empresas digitais do planeta e a única companhia de Internet brasileira a se tornar global.

Time do Buscapé, amigos, amigas, conselheiros, parceiros, fornecedores, clientes, investidores, muitíssimo obrigado por fazerem parte desta aventura. Me afasto do dia a dia da operação, mas continuo envolvido na estratégia, no desenvolvimento de novos negócios e na área de relações públicas, deixando um legado que, confessemos, não habitava nossos sonhos mais impossíveis. Mas, como costumo dizer, o empreendedor deve sempre ligar o radar para novos negócios quando ouvir a palavra “impossível”. Continuem contando comigo, estejam onde estiverem. Sempre.

Pai, mãe, irmãos, um beijo enorme no coração. Obrigado por todo apoio, compreensão, tolerância, ensinamentos e orações.

Rodrigo Borges, Ronaldo Takahashi e Mario Letelier, não me afasto de nossa criação. Apenas, como vocês, abro as portas de casa para que o filho possa deixar o conforto do lar, siga e construa seu próprio caminho. Mas, pai zeloso, mantenho os olhos e braços sempre abertos para orientar, apoiar, aconselhar.

Levo a experiência adquirida com a educação do primogênito para ajudar novos empreendedores, que se hoje encontram um cenário econômico adverso, contam com as benesses deixadas por nós, veteranos, bandeirantes da web, desbravadores das estradas digitais.

Em meio ao turbilhão que vivemos na nossa adolescência empreendedora, foram muitos os mentores que nos pegaram pelas mãos para nos guiar e ajudar a vencer nossa inexperiência de jovens aventureiros. E é chegada a hora de retribuir, como já tenho feito como investidor-anjo e através da minha atuação na Endeavor como mentor e membro do conselho.

Reza a cultura empreendedora que não há melhor forma de aprender senão ensinar o que sabe. Este é um dos sustentáculos do Vale do Silício. Compartilhar conhecimento, investir em educação e mentoria, trocar práticas de gestão e ajudar mentes brilhantes a despertar todo potencial são obrigações dos que já atravessaram o deserto da cruzada empreendedora.

Sim, vou dedicar meu tempo livre ao empreendedorismo. Ajudar outros empreendedores nessa travessia. Empreender novos empreendedores. Empreender pelas mãos de outros. Dedico agora meu tempo a dar e a receber, a cultivar a paixão pelo empreendedorismo.

A experiência adquirida à frente do nosso primeiro negócio na Internet é a melhor herança que levo destes anos, desde que abrimos nossa primeira pequena sala na Vila Madalena até ocuparmos a cobertura de um prédio na Avenida Paulista após a venda para a Naspers.

Toda esta bagagem me tornou um investidor mais sagaz, mais astuto, mais adulto. Em troca, os novos empreendedores me ajudarão a ser um Chairman capaz de, mesmo distante do cotidiano da operação, continuar a contribuir para o futuro do Buscapé.

A Irmã Corita Kent também elencou outras regras aos aprendizes. Tomo a liberdade de reproduzir três delas como mantras que continuarei entoando no muito que ainda pretendo fazer ao lado de uma nova geração de empreendedores da indústria digital brasileira:

“Tirem tudo que puderem de seu professor; tirem tudo que puderem de seus colegas”;

“Considere tudo como um experimento”; e

“A única regra é trabalho. Se você trabalhar chegará a algum lugar. São as pessoas que fazem todo trabalho, todo tempo, que eventualmente irão conquistar as coisas”.

E a estas me atrevo a adicionar uma quarta e derradeira: “Leia muito, vire a página quando aprender, mas não largue o livro. Ao invés disso, ajude a escrever os próximos capítulos”. Vamos juntos?