A França de Vichy foi cúmplice de um genocídio em 16 de julho de 1942, ao entregar milhares de crianças judias aos nazistas, afirmou à AFP o historiador Serge Klarsfeld, na véspera do 75º aniversario da deportação de menores separados brutalmente de seus pais.

Em uma cerimônia no local do antigo Velódromo de Inverno de Paris será inaugurado neste domingo um jardim-monumento com os nomes das crianças detidas, deportadas e mortas em Auschwitz Birkenau.

O presidente francês, Emmanuel Macron, e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, assistirão à cerimônia, realizada como parte do dia nacional de recordação das vítimas dos crimes racistas e antissemitas do Estado francês do marechal Pétain e em homenagem aos Justos da França.

“Se pudesse, teria feito um monumento maior, com as indicações de onde vieram, porque são filhos de Paris e Paris deve honrar sua memória, no mesmo local em que tanto sofreram”, afirma o historiador, de 81 anos.

Serge Klarsfeld tinha seis anos quando seu pai, detido em Nice em 1943, foi deportado para Auschwitz. Dedicou sua vida, junto à mulher, Beate, a escrever sobre a história do Holocausto na França e tentar levar à Justiça os criminosos nazistas.

Em 16 e 17 de julho de 1942, 13.152 homens e mulheres, sendo 4.115 crianças judias, foram detidos por milhares de policiais frances por ordem do governo. Eles levaram as famílias para o Velódromo de Inverno e os casais sem filhos e os solteiros para o acampamento de Drancy, perto de Paris.

Essa redada, a maior feita em território francês, representa quase um terço dos 42.000 judeus enviados da França para Auschwitz em 1942 como parte do plano de deportação de judeus da Europa elaborado pelos alemães na conferência de Wannsee nesse mesmo ano.

– ‘Muralha’ –

Para Serge Klarsfeld, o episódio do Velódromo de Inverno (Vel d’Hiv) foi “o crime mais brutal desde a matança de São Bartolomeu”, massacre de protestantes ocorrido em 1572, e, por seu alcance, é comparável aos dias da “Comuna de Paris, a insurreição de 1871, apesar de, neste caso, “as crianças não terem sido assassinadas”.

“O simples fato de entregar milhares de crianças ao ocupante nazista, depois de separá-las de seus pais, deportando-as sozinhas, em meio a uma angústia tremenda, é para a França de Vichy uma cumplicidade de crime contra a Humanidade e de genocídio”, enfatiza.

Em aplicação da “Solução Final na França”, essa redada começou em julho, em Paris e periferia, e continuou em todo o território até novembro de 1942.

“Os alemães pediram inicialmente 40.000 judeus e lhes foi entregue o contingente solicitado. Vichy poderia ter entregue 100.000, mas foi dissuadido pelos protestos da população e das Igrejas”, ressalta Klarsfeld.

Segundo o historiador, é uma diferença essencial em relação à Holanda e à Bélgica, onde a população não desempenhou este “papel de muralha”. Sem esta mobilização na Franca e a ação de muitos Justos, o massacre teria sido muito pior.

Um total de 76.000 judeus, entre eles 11.000 crianças, foram deportados da França. Apenas 2.500 sobreviveram.

Sobre o discurso histórico do presidente Jacques Chirac, que, em 1995, reconheceu a responsabilidade da França, o historiador assegura que, desde então, as autoridades mantêm a mesma postura. Antes, o general de Gaulle e François Mitterrand afirmavam que a França legítima se encontrava em Londres.

“Em 2012, François Hollande reforçou a declaração de Jacques Chirac, dizendo, como deverá fazer Emmanuel Macron: este crime foi cometido na França pela França”.