A retomada deu à rede americana de hotéis Hilton uma cara nova no Brasil, embora siga com o mesmo nome. O grupo pega impulso na recuperação puxada pelo turismo doméstico, que vem motivando a diversificação do seu portfólio no País. No segundo semestre, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) revisou a projeção de aumento do faturamento no setor para 19%. Nesse embalo, a rede norte-americana pretende chegar a 18 hotéis até 2024, crescimento de 125% desde o início da pandemia. “A demanda das viagens executivas ficou suspensa por quase um ano, o que provocou essa reavaliação do ecossistema”, afirmou Jorge Giannattasio, Vice-Presidente Sênior e diretor de operações para América Latina e Caribe. “Decidimos trazer mais serviços para atender uma carteira de clientes maior.” Até 2019, a oferta da rede no mercado brasileiro era pouco mais de 6% em relação aos EUA. Com maior concentração na região da capital paulista com bandeiras corporativas, a empresa consegue ganhar mercado em outras regiões à medida que equaciona negócios e lazer. Hoje a empresa soma oito unidades no pipeline a partir do próximo ano, e deve chegar ao interior e a capitais como Porto Alegre e Recife.

O momento da operação segue os passos dos resultados financeiros. No segundo trimestre, o Hilton fechou um balanço no azul pela primeira vez desde o início da pandemia. A perspectiva de manter essa ascensão pautou o plano de negócio, que projeta 110 novos hotéis na América Latina e Caribe, crescimento de 64% em quatro anos. A região corresponde a cerca de 6% do Ebitda ajustado, acumulado em US$ 598 milhões no primeiro semestre deste ano. Globalmente, o Hilton fechou o segundo trimestre com pouco mais de 1 milhão de quartos em cerca de 6,6 mil unidades, sendo que a operação latino-americana responde por apenas 0,3% do total, ou 30,5 mil. No Brasil, são 2 mil. Para fechar essa lacuna, o passo inicial passa pela abertura de 20 endereços nesses mercados em 2021 – com taxa de expansão 6 p.p. acima da média anual.

O bom desempenho dos resorts no México e no Caribe no último período reportado foi o gatilho para o Hilton elevar a aposta no turismo de lazer. As reservas da rede superaram os patamares de 2019 após o tombo de 97% de ocupação no setor hoteleiro dessas regiões em 2020. “A demanda represada em todos os mercados criou esse fenômeno de compensação, que ainda deve se fortalecer nos próximos anos”, disse Giannattasio. No Brasil, o plano é atrair o hóspede “fadigado pela rotina de confinamento”.

FRENTE DE NEGÓCIOS Hoteleira está concentrada na capital paulista com bandeiras corporativas. (Crédito:Divulgação)

No começo do ano, o grupo trouxe a categoria lifestyle com a bandeira Canopy para São Paulo. Já em setembro, reabriu o Almenat. Na região de Mata Atlântica de Embu das Artes, a 35 quilômetros da capital paulista, a placa do Almenat ainda é a mesma, mas ganhou o aposto “by Hilton”. Introduzindo a Tapestry Collection no portfólio da América do Sul, uma linha focada no turismo local. O hotel retomou as atividades depois de um ano e meio fechado ao público. A proposta, pelo menos por enquanto, é atender duas demandas latentes na rede: a busca por um refúgio da selva de pedra e a agenda das reuniões de negócios. “Só veremos uma retomada dos grandes eventos corporativos no fim de 2022. Neste momento, a principal procura ainda é pela hospedagem de lazer”, afirmou o executivo.

PARALELOS No mercado há mais de um século, nenhum episódio abalou a operação global do Hilton como o coronavírus. Ao longo de 2020, o grupo acumulou perdas de US$ 720 milhões. Entre outras medidas, para atravessar a crise, anunciou 2 mil demissões em junho do ano passado e recorreu a um empréstimo de US$ 1,7 bilhão. Já tendo alcançado a “outra margem do rio”, a empresa vê oportunidades para acelerar o ritmo de crescimento. “Nosso objetivo é trabalhar com conversões, porque muitos hotéis desse setor, principalmente os selos independentes, não sobreviveram.” A estratégia citada pelo executivo está no DNA do grupo, e remonta a 1919, quando seu fundador, Conrad Hilton, transformou prédios de bancos e pensões que faliram com a devastação da gripe espanhola no pós-Primeira Guerra nos primeiros hotéis que levaram o seu sobrenome.

Enquanto a Covid-19 assola o século 21, já tendo matado mais pessoas nos Estados Unidos do que a influenza 100 anos atrás, de acordo com os dados da Universidade Johns Hopkins, a América Latina – e especialmente o Brasil – vive mais um capítulo de insegurança política. Mas o executivo responsável pela região, argentino de nascença, não se deixa abalar pelas perspectivas de um ano eleitoral turbulento no País, que é um dos maiores mercados sob o seu comando. “Bem-vindo à América Latina”, disse. “O ambiente de volatilidade aqui exige um plano de negócios mais flexível e de longo prazo. É uma resiliência que os grandes grupos têm em vantagem.” Não só o tamanho, mas os aprendizados do século 19 vêm se mostrando cada vez mais úteis para os negócios do Hilton hoje.