Foi aberta a contagem regressiva. Depois de uma ressaca de anos, um batalhão de empresas, consultores e fornecedores de bens de capital trabalha em ritmo frenético para garantir um tempo de bonança ao abastecimento de energia no País. Começa em 2001 a construção de dezenas de termoelétricas, hidrelétricas e centenas de quilômetros de linhas de transmissão, obras que elevarão a capacidade energética de 70 mil para 91 mil megawatts até 2003. Esse salto deverá eliminar o risco de o Brasil ficar no escuro nos próximos anos. E o melhor: essa operação de guerra vai movimentar cerca de US$ 90 bilhões nos próximos quatro anos, segundo cálculos da Associação Brasileira de Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib). ?Nada se compara ao que está sendo feito agora na área de energia no Brasil?, diz Teofrasto Barbeiro, diretor da área comercial de eletromecânica da Schahin Engenharia.

Há, na realidade, uma corrida contra o relógio ?O risco de falta de energia é grande. Em parte de 2000, consumimos a capacidade nominal?, diz Frederico Peiró, consultor da área. Para Paulo Ludmer, diretor da Associação Brasileira dos Grandes Consumidores de Energia Elétrica (Abrace), se houver algum imprevisto na geração, como, por exemplo, interrupção no fornecimento de energia nuclear, o País terá problemas para 2001. Os analistas do setor concordam em um número: a necessidade por energia no Brasil cresce cerca de um ponto porcentual acima do PIB. Se esse cálculo se confirmar em 2001, o País cresce entre 4% e 4,5% ? segundo dados do Ministério da Fazenda ? e a demanda deve chegar a 5,5%. Ou seja: se o PIB brasileiro avança, a necessidade de megawatts também cresce. Por isso, desde a década de 70, quando o País se preparava para a construção da hidrelétrica de Itaipu, não se via tanto otimismo por parte dos empresários do setor. Com a estagnação econômica dos anos 80 e início dos 90, os investimentos nessa área foram congelados. Quando o País voltou a esquentar as turbinas, toda a reserva de energia foi rapidamente absorvida. ?Em 1999, embora o crescimento econômico tenha sido pequeno, o consumo de energia aumentou 4,8%?, diz Nestor Cevró, gerente-executivo de energia da Petrobras. ?É preciso atender essa demanda reprimida.?

Hoje, o Brasil opera muito próximo do limite de sua capacidade. O consumo de energia cresce cerca de 5% ao ano, número que deverá se repetir nos próximos anos. O sinal de alerta disparou quando os planos de um crescimento vigoroso do País poderiam ir água abaixo pela simples falta de luz. Num raro golpe de agilidade, o governo tirou da manga um ambicioso programa para mudar a cara do setor. No campo da geração, foi lançado o Programa Prioritário, que prevê a construção de 55 centrais termoelétricas, das quais 12 pertencem ao Programa Emergencial. Seis delas serão inauguradas em 2001.

Além das usinas termoelétricas, abastecidas a gás, o governo deve promover em 2001 a licitação para a construção de mais 17 hidrelétricas, que vão consumir R$ 21 bilhões em obras. No caso das linhas de transmissão, serão necessários investimentos de R$ 3 bilhões para cobrir cerca de 5 mil quilômetros de Norte a Sul do Brasil.

De olho nos planos do governo, as empresas preparam-se para brigar por esse mercado bilionário. Gigantes multinacionais da geração de energia como Duke Energy, AES, EDF, Endesa e EDP querem ampliar sua participação no Brasil. O consumo per capita aqui ainda é baixo em comparação aos países desenvolvidos. O brasileiro utiliza cerca 200 kwh por mês. Nos EUA e na Europa, a média do consumo é oito vezes maior. ?Com a melhoria das condições de vida da população, o crescimento do consumo é uma forte tendência?, diz José Mário Abdo, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), órgão que regula o setor. Segundo cálculos do Ministério de Minas e Energia, serão necessários R$ 8 bilhões em investimentos por ano para que o sistema acompanhe o crescimento do mercado consumidor. O apetite dessas empresas pelo mercado brasileiro também foi despertado pela possibilidade de venda direta de energia para o consumidor brasileiro. Assim como é feito na telefonia, qualquer pessoa poderá escolher o fornecedor. Especialistas do ramo estimam que o sistema deve estar em prática em três anos. ?O que hoje está no gargalo, no futuro vai se transformar em sobra?, diz Barbeiro. Quem também vai lucrar nesse processo é uma grande cadeia de fornecedores de equipamentos, que trabalha a todo vapor para entregar encomendas para essas usinas. A Alstom Power, fabricante de turbinas e geradoras para hidro e termoelétricas, investiu US$ 60 milhões no Brasil nos últimos três anos. Em 2001, a empresa de capital francês, suíço e americano investirá mais US$ 20 milhões. ?Nosso objetivo é ampliar a capacidade de geração de 3 mil para 4 mil megawatts?, diz José Nogueira Reis, presidente da Alstom Power no Brasil. ?Temos planos de adquirir outras empresas no Brasil?. Bom, se depender do otimismo dos empresários, o setor vai crescer rapidinho.

APOSTA NA ENERGIA

Barbeiro: mudança de estratégia na Schahin
A marca Schahin sempre foi associada à construção civil. Houve um tempo no qual 85% do faturamento da empresa vinha de grandes obras públicas. Isso é passado. A Schahin, uma das cinco maiores de sua área, está mudando e agora quer ser uma empresa de infra-estrutura. Nos planos da companhia, a energia tem lugar estratégico. Comandada pelo engenheiro Teofrasto Barbeiro, a divisão energética da Schahin é responsável por 15% do faturamento de R$ 550 milhões do grupo. Por enquanto, os negócios na área estão concentrados na construção de linhas de transmissão e subestações. A empresa acaba de ganhar a concessão para levantar 252 quilômetros da linha que liga Blumenau a Campos Novos, em Santa Catarina. Com o novo negócio, em parceria com a Alusa e Celesc, Barbeiro acumulou também a presidência da Empresa Catarinense de Transmissão de Energia (ECT).

Em 2001, a empresa planeja disputar a licitação de uma hidrelétrica, mas não revela detalhes. Para a Schahin, a opção pelo investimento em energia oferece uma dupla vantagem. Primeira: alavanca a divisão de construção civil do grupo, já que os negócios em energia exigem grandes obras. Segunda vantagem: a empresa alonga seus pagamentos, melhorando o fluxo de caixa. ?As obras em construção são trabalhos de curto prazo. Em uma concessão do setor de energia é possível securitizar os pagamentos?, diz Barbeiro. Os empreendimentos devem durar cerca de 24 meses e gerar 10 mil empregos. Metade dos trabalhadores especializados será treinada para esses serviços, já que com a ressaca do mercado brasileiro, não há quase oferta dessa mão-de-obra disponível. Há dois anos, o Brasil teve que trazer operários da Bolívia para construir a linha Norte-Sul.