Iniciada no dia 1º de novembro, a paralisação dos caminhoneiros não teve o alcance nacional esperado inicialmente e segue apenas com os caminhoneiros autônomos, ligados ao agronegócio, no Mato Grosso, apesar do êxito conquistado entre os motoristas que abastecem o Porto de Santos. A categoria, no entanto, pode voltar a se mobilizar a partir de dezembro.

Segundo o diretor da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes e Logística (CNTTL), Carlos Alberto Litti, uma nova assembleia será realizada em Canoas (RS) no dia 11 de dezembro e pode dar novo fôlego aos caminhoneiros, que seguem descontentes com o governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

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“A greve encerrou com o processo em Santos e faremos uma nova assembleia para avaliar a conjuntura”, disse Litti.

Já o presidente da Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Automotores (Abrava), Wallace Landim “Chorão”, afirma que segue articulando a greve em outros estados e com outras categorias, como a de motoristas de aplicativos.

“Estive em Goiânia, fizemos reuniões com a categoria, transportadoras, indústrias, tentando chegar em um consenso entre os setores porque hoje o transporte pede socorro”, afirmou Chorão.

“Converso com os setores porque a pauta de combustíveis é uma pauta de toda a sociedade, não apenas dos caminhoneiros. Trabalho para que todos os setores tenham o mesmo pensamento, e isso vai acontecer naturalmente porque vai ter mais aumento dos combustíveis”, disse.

Em nota, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) diz que “no momento, não há negociação direta entre e a ANTT e representantes da categoria”. Além disso, a ANTT afirma que uma nova proposta de revisão do piso mínimo do frete de caminhoneiros, que será implantada a partir de 20 de janeiro de 2022, está em processo de consulta pública.

Preço dos combustíveis
O preço da gasolina, diesel e gás de botijão subiram pela quinta semana seguida, de acordo com dados da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Assim, o preço médio da gasolina subiu para R$ 6,09. O preço mais alto da gasolina no País foi registrado em Bagé (RS): R$ 7,88. Já o mais barato é do Amapá: R$ 6,23.

O preço médio do diesel está em R$ 5,339 – o diesel teve alta de 65,5% desde o início deste ano. Já o do etanol tem preço médio de R$ 5,294. Enquanto a inflação avança no Brasil, os caminhoneiros perdem boa parte de sua renda sem uma atualização de frete que corrija os novos valores semanais.

Entenda

A alta no preço da gasolina pode ser explicada pelo aumento da cotação do petróleo no mercado internacional e a desvalorização do real diante do dólar – a Política de Paridade de Preços (PPI), que atrela o preço da gasolina ao valor do petróleo internacional, adotada pela Petrobras é a principal queixa dos caminhoneiros que entraram em greve.

“Temos um câncer: a PPI, que vincula o preço do combustível ao dólar. Mas nós não ganhamos em dólar. Precisamos que o governo tenha sensibilidade. Ficou claro que não querem desvincular o PPI. Lugares para mexer existem, mas o Ministério da Economia trabalha para os acionistas e leva o setor de transportes ao colapso”, argumenta Chorão.

Em entrevista à Rádio Jovem Pan de Curitiba na última segunda-feira (8), o presidente Bolsonaro declarou que existe a “tendência de caminhoneiros de parar o Brasil. Vamos reclamar de quem é realmente responsável por isso: a Petrobras”. O mandatário ainda defendeu “baratear os combustíveis” e criticou os dividendos da Petrobras.

“Os dividendos são, no meu entender, absurdos. R$ 31 bilhões em três meses. Eu não quero na parte da União ter esse lucro fantástico”.

Um dia depois, na última terça (10), Bolsonaro voltou a atacar a Petrobras e pediu sua privatização em entrevista à Rádio Cultura do Espírito Santo. “A Petrobras é um monstrengo, é uma coisa estatal, tem monopólio e vive em função dela. Ela vive das legislações existentes para que os acionistas nunca tenham, não digo prejuízo, mas lucro bom”.

Fim em Santos e começo no Mato Grosso

Após cinco dias de paralisações, caminhoneiros autônomos ligados a transportadoras do Porto de Santos, o maior da América Latina, conseguiram um aumento de 10% em cima do piso mínimo do frete. A diretoria do Sindicato dos Caminhoneiros Autônomos da Baixada Santista (Sindicam) ainda conseguiu que as empresas arcassem com custos de pedágios.

“Trata-se de um momento histórico. O caminhoneiro do Porto de Santos terá um parâmetro para seus fretes”, declarou, em nota, o presidente do Sindicam, Luciano Santos de Carvalho. Com a conquista, as paralisações terminaram no último dia 8.

Já os caminhoneiros autônomos do Mato Grosso ligados ao agronegócio são os únicos atualmente em greve para negociar o preço do frete. A paralisação é liderada por empresas de transporte que negociam os preços para fazer a subcontratação dos caminhoneiros.

“Se as empresas não conseguem negociar, imagina o subcontratado caminhoneiro autônomo que presta serviço”, diz Litt. O dirigente nega que o movimento seria locaute, já que as empresas em greve não possuem contratos ativos com os caminhoneiros, pagos por entregas. Locaute é uma prática proibida por lei e se caracteriza quando empregadores impedem os trabalhadores de exercer suas atividades, fomentando uma paralisação que atende a seus próprios interesses.

 A briga com o governo

A proibição judicial em diversos estados do bloqueio de rodovias, como ocorreu em 2018, afetou a mobilização e o alcance da greve iniciada em novembro. Chorão aponta que houve bloqueio de rodovias na paralisação de caminhoneiros governistas em 7 de setembro e critica que, ao contrário do que ocorreu neste mês, não gerou nenhuma reação judicial.

“O presidente chamou manifestação contra a democracia deste País. Fiz campanha para ele, hoje não faço nem se ganhar R$ 1 milhão por dia. O povo está sofrendo, pega comida do lixo, 2022 está aí para a gente mostrar nossa indignação. O Tarcísio (Gomes de Freitas, ministro da Infraestrutura), junto com a Advocacia Geral da União (AGU) soltou diversas liminares para impedir os bloqueios de estrada. A Polícia Rodoviária Federal não deixou a gente ficar nas estradas para se manifestar e foi contra o direito de manifestação e greve”, acusa Chorão, que descartou o bloqueio de estradas. “O governo é estrategista, temos que ser também”, finalizou.

Um levantamento feito pelo Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) indica que a alta dos preços dos combustíveis aumenta os cofres da União em ao menos R$ 70,1 bilhões até o fim deste ano – foram R$ 36,2 bilhões em 2020. O governo ganha em três frentes com o valor dos combustíveis:

– R$ 15,2 bilhões com PIS e Cofins, tributos federais sobre combustíveis, até setembro deste ano;
– R$ 23 bilhões com dividendos da Petrobras, da qual o governo federal é o maior acionista;
– R$ 31,9 bilhões com participação e royalties pagos pelas petroleiras para exploração de petróleo até o final do ano.

Para conter os grevistas caminhoneiros, o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) congelou o ICMS, tributos estaduais, cobrado sobre os combustíveis, mas apenas por 90 dias. O prazo termina no início de fevereiro de 2022.