O governo e o Ministério Público chegaram a um entendimento para agilizar a negociação de acordos com empresas corruptoras, como as que foram pegas na Operação Lava Jato. A ideia é que integrantes do MP, da Advocacia-Geral da União (AGU) e do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) participem desde o início das tratativas para que os termos da colaboração e os valores a pagar pelas empresas sejam definidos conjuntamente, disse Grace Mendonça, ministra da AGU, em entrevista ao Estado.

Segundo ela, o plano já está em andamento e um acordo de colaboração com base nesse modelo será anunciado nos próximos dias. “Para nós, é um problema superado. Já temos bases claras para trabalhar em conjunto daqui para frente”, afirmou. Ela não revelou o nome da empresa, mas confirmou que é uma das companhias envolvidas na Lava Jato.

A solução encontrada, disse a ministra, foi negociar em conjunto e assinar “acordos-espelho”. Um contrato será firmado pela empresa colaboradora e pelo MP. Ao mesmo tempo, outro contrato idêntico será assinado pela empresa e por AGU e CGU – as duas pastas já atuam em parceria na negociação de acordos desde dezembro de 2016.

Esse modelo permitiu acomodar os interesses do Tribunal de Contas da União (TCU), que não abre mão de fiscalizar os acordos firmados por AGU e CGU, e de não ferir a independência do Ministério Público, que não aceitava que seus acordos passassem pelo TCU.

O novo formato é uma tentativa de colocar fim a uma longa disputa entre os órgãos e à reclamação das empresas de que, diante da burocracia e da confusão entre os entes do governo, não conseguem acertar suas contas com o Estado.

A Lava Jato começou em 2014 e o primeiro acordo de leniência entre o MP e as grandes empreiteiras saiu em 2015 com a Camargo Corrêa. Andrade Gutierrez e Odebrecht seguiram o exemplo. Até hoje, contudo, nenhuma delas conseguiu fechar colaboração com AGU, CGU ou TCU – apenas no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), que investiga casos de cartel, houve avanço.

Dessa forma, as empresas continuam correndo o risco de sofrer sanções, como ter bens bloqueados ou serem declaradas inidôneas – impedidas de fechar contratos com o poder público. O objetivo do governo é evitar esse descompasso, tornando as negociações mais céleres.

Roteiro. O Tribunal de Contas da União seguirá fora das tratativas. Ficou acertado que os acordos terão cláusula indicando de forma expressa que eles não dão quitação total à empresa dos danos causados ao erário. Caso mais tarde o TCU identifique um dano maior que o calculado – e previsto no valor a pagar pela empresa – ela se compromete a acertar com a corte esse ressarcimento adicional.

A lei estabelece que o prejuízo ao Estado tem de ser ressarcido integralmente. Há espaço para negociação no valor da multa e no prazo de pagamento. O TCU será avisado que o acordo foi finalizado e ele já passará a valer. O tribunal, por sua vez, se comprometerá a não expedir medidas cautelares contra a empresa ou pedir sua declaração de inidoneidade enquanto verifica o acerto feito.

Esse novo roteiro foi definido durante as tratativas para o acordo da SBM, envolvida em irregularidades reveladas pela Lava Jato. O governo pretendia que a colaboração da multinacional fosse a primeira a seguir o novo modelo, mas o TCU, ao tomar ciência, impediu que AGU e CGU o assinassem.

Ao fim, o tribunal concordou em não mais barrar os acordos, sob a condição de poder fiscalizá-los posteriormente. Diante do atraso, o MP ajuizou uma ação de improbidade, o que fez a SBM desistir de assinar o acordo de leniência.

Mendonça diz que esse descompasso não deve se repetir e que os entraves foram vencidos. “Já dialogamos com o MP, estamos estabelecendo acordos idênticos, numa aproximação extremamente profícua. Há ok do TCU de que podemos assinar. Temos o formato. Se caminharmos assim, dará certo”.

Em nota, a CGU disse que “ressalta o trabalho em conjunto com AGU e Ministério Público Federal – 5.ª Câmara de Coordenação e Revisão para a criação de modelo que atenda ao interesse público e que garanta a segurança jurídica do processo”. O MPF não concedeu entrevista. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.