Há pouco menos de dez dias, o empresário gaúcho Celso Perini circulava com desenvoltura pelas ruas e colunas sociais de Cuiabá. Agora, o proprietário do frigorífico Frigoverdi está desaparecido e é procurado, ao melhor estilo velho Oeste americano. Se der as caras em Mato Grosso, corre o risco de levar um tiro. Quem poderá apertar o gatilho é um dos cerca de 200 pecuaristas nos quais ele aplicou um golpe de R$ 60 milhões. Perini chegou ao Mato Grosso, comprou o gado oferecendo melhores preços, vendeu a carne e não pagou ninguém. E mais: se endividou com bancos e deu o calote em impostos estaduais e municipais. O resultado da aventura da Frigoverdi foi a concordata no dia 22 de setembro, pouco antes do vencimento de uma série de dívidas. Cuiabá e o resto de Mato Grosso pararam. ?Se antes trabalhávamos 14 horas por dia na fazenda, agora vamos ter de trabalhar 20 para compensar a perda?, diz João Carlos Velasco, pecuarista de Tangará da Serra. Ele vendeu R$ 106 mil em bois ao Frigoverdi. ?Nunca houve um escândalo dessa proporção na região?, diz um fazendeiro que perdeu R$ 60 mil e não quis se identificar.

BOI BOBO: Perini levou gado e dinheiro
Vindo de Caxias de Sul há quatro anos, o empresário desbancou a concorrência, pagando a arroba do boi acima da tabela do mercado. Perini oferecia até R$ 38,50 por arroba, quando a carne era negociada entre R$ 36 e R$ 36,50. Não houve quem resistisse. O jovem pecuarista gaúcho não era um joão-ninguém e entendia do negócio que estava tocando. Sua família, dona do Grupo Perini, tem empresas bem-estabelecidas no setor agropecuário e metalúrgico no Rio Grande do Sul. Em seus primeiros anos no Centro-Oeste, Perini fazia os pagamentos aos pecuaristas normalmente e vendia a carne para empresas de primeira linha, como Sadia e Perdigão. Além disso, seu frigorífico exportava mensalmente cerca de US$ 1,5 milhão. Segundo Velasco, o Frigoverdi tinha boa reputação entre os fazendeiros por abater um dos maiores rebanhos da região, o gado da Fazenda São Marcelo, de propriedade do Carrefour. Em julho, Perini e o Carrefour firmaram um contrato para comercializar carne livre de aftosa. O grupo francês figura na lista de credores do processo de concordata com uma dívida a receber de R$ 2,3 milhões.
Quem encabeça a lista dos principais credores de Perini são os bancos. Apenas o BicBanco, Bradesco, Banco do Brasil, Banrisul, Rural, Comercial do Uruguai e Bilbao Viscaya emprestaram juntos cerca de R$ 20 milhões ao empresário. Por enquanto, não há sinal de que vão receber alguma coisa. O superintendente do BicBanco de Cuiabá, Éder de Moraes Dias, que emprestou para Perini R$ 3,3 milhões, acredita que a culpa não é do empresário. ?Até a véspera da concordata, qualquer um daria crédito ao Frigoverdi?, diz. Isso confirma a tese de que, quando a dívida é grande, o problema é do executivo do banco tanto quanto do devedor. Dias atribui o imbróglio do gaúcho ao bloqueamento de um financiamento de R$ 10 milhões do BNDES, que seria aplicado na construção de um novo frigorífico no Estado, e fruto do mar de débitos. Em Cuiabá, comenta-se que os amigos poderosos de Perini, entre eles o governador Dante de Oliveira e o ministro da Agricultura, Pratini de Moraes, ensaiam uma ajuda na liberação do dinheiro. Os fazendeiros, porém, falam que o governador está furioso com a mácula que o episódio deixará sobre a pecuária do Mato Grosso.

Uma das teses correntes em Cuiabá é que o caos financeiro da Frigoverdi seria uma manobra de Perini e sua família, que estariam concentrando as dívidas no frigorífico, uma espécie de empresa laranja, para manter saudável a parte gaúcha do grupo. Há dois meses, os parentes deixaram a sociedade. Perini virou o único dono do frigorífico. Outro fato no qual as vítimas enxergam premeditação é que, na mesma época da cisão societária, o empresário se separou da mulher, que seguiu com os filhos para o Sul. ?Parece que ele mandou a família na frente, antes de dar o golpe?, ataca um dos fazendeiros prejudicados. Com a concordata, a dívida deverá ser alongada em dois anos e paga com juros leves de 0,5%. Se não for cumprida, a Justiça poderá decretar falência da empresa. Por enquanto, os advogados do empresário procuram seus credores propondo o pagamento da dívida com cerca de 30% de deságio. Como os pecuaristas não estão muito dispostos a conversa, é bom Perini manter-se escondido.