Ao assumir o cargo de CEO de uma das maiores empresas de segurança privada do Brasil no primeiro dia de 2020, o carioca Bruno Jouan já previa grandes desafios durante seus primeiros meses. Ele acertou na projeção, mas errou na dimensão e intensidade dos problemas. E de onde eles viriam. Poucas semanas depois de assumir a companhia, veio a pandemia, o isolamento social e uma crise econômica sem precedentes no País. Shoppings fechados, fábricas com atividades suspensas e comércio com restrição de funcionamento fizeram com que a demanda por segurança e limpeza desabasse. Resultado: menos receitas, mais dificuldade em renovar contratos e sumiço de novos clientes. “Como atuamos em quase todos os segmentos da economia, fomos fortemente atingidos”, afirmou o CEO.

O plano de Jouan para blindar a empresa foi partir para o ataque. Internamente, ele colocou para rodar uma profunda reestruturação do modelo de operação. A primeira ação, como forma de imprimir seu estilo de comando e moldar a empresa a seu gosto, foi um golpe claro. Demitiu o CFO, o diretor de RH, o chefe de operações e o diretor de marketing. Aí foi para a rua. Renegociou contratos com terceiros – como prestadores de serviço de TI – e reduziu custos em todos os departamentos. “Tudo isso foi necessário”, disse. “Uma reestruturação geral para amortecer o impacto da crise.”

A estreia intensa fez com que o novato CEO se sentisse, segundo ele, um experiente na empresa. “A sensação de pouco mais de um ano no comando da companhia é ter vivido sete anos. É igual a idade de cachorro.” Mas encarar a crise parece ter dado certo. A leveza com que o executivo trata o assunto é resultado de uma queda até suave, de 3%, no faturamento da empresa no comparativo com 2019, para R$ 1,2 bilhão no ano passado. Para este ano, a expectativa é alcançar faturamento de R$ 1,5 bilhão, 25% abaixo do esperado para 2021 antes do início da pandemia, mas igualmente 25% acima do alcançado em 2020.

NOVO OLHAR Fechamento de estabelecimentos e redução no movimento resultam na troca de vigilantes pela segurança através de câmeras. (Crédito:Divulgação)

Para quem trabalha com segurança, ser cauteloso não significa ter medo. Olhando o copo meio cheio, Jouan planeja intensificar o processo de transformação tecnológica da Gocil, iniciado em 2020 por meio da digitalização de processos e migração de servidores para o serviço em nuvem. O novo foco em transformação digital acontece em um cenário onde a tecnologia ganha prioridade (saem os vigilantes, entram as câmeras de segurança). Para este ano, a previsão é dobrar os investimentos e alcançar um aporte de R$ 40 milhões. Com 35 anos de mercado e 1,2 mil clientes, a participação do digital na empresa ainda é pequena, de 5%. O objetivo é alcançar 35% dentro dos próximos anos. “O crescimento tem que ser orgânico e depende de investimentos de cerca de R$ 100 milhões”, disse. “Precisamos de um cenário mais certo e seguro para poder investir e consolidar esse objetivo”.

Enquanto esse panorama mais tranquilo não chega, a preocupação do executivo está em garantir caixa positivo para a companhia e manter os salários dos 22 mil funcionários em dia. Com a maioria dos estabelecimentos como shoppings, aeroportos e empresas fechados ou com a atividade reduzida, parte das medidas de contenção significou o corte de 12% no número de funcionários durante a pandemia. E o cenário futuro não parece pegar leve para a empresa de segurança. Para o CEO, com o novo lockdown em diversas cidades do País muitos clientes passam a pedir por novos cortes ou redução de contratos. Como solução, o executivo aguarda pela decisão do governo federal sobre o retorno do Benefício Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda. “A manutenção dos empregos está diretamente ligada à manifestação do governo com relação a essa medida provisória.”

Desde o início do mandato, em 2019, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) incentivou o acesso a armas no País. A quantidade bateu recorde e superou os quase 151 mil registros liberados em um período de dez anos, de 2009 a 2018. Para Jouan, os protocolos de segurança mudam a partir do momento em que mais pessoas saem às ruas armadas. “A vulnerabilidade aumenta e fica impossível realizar a segurança de um local sem estar armado.” Para o executivo especialista em segurança, esse novo cenário demanda maior treinamento dos profissionais e uma nova visão das empresas, que antes optavam por segurança não armada. O pequeno vírus parece ter transformado a vida da Gocil mais do que toda sua trajetória de 20 anos.