Por Roberto Samora

VARGINHA, Minas Gerais (Reuters) – Em um sobrevoo pela região cafeeira de Varginha, no Sul de Minas Gerais, é possível ver manchas amarronzadas em grande parte das plantações, sinais de como as geadas do último dia 20 queimaram os cafezais e indicam perdas para as próximas duas safras, pelo menos.

“Foi pior do que eu imaginava… Difícil ver uma lavoura que não sofreu nada”, disse o engenheiro agrônomo Adriano Rabelo de Rezende, coordenador técnico da cooperativa Minasul, depois de sobrevoar, pela primeira vez após as geadas, fazendas nos municípios de Varginha, Elói Mendes, Paraguaçu, Alfenas, Machado, Boa Esperança, Nepomuceno e Carmo da Cachoeira.

Após avaliação visual das manchas escuras nos cafezais, o agrônomo estimou na quinta-feira que entre 20% e 30% das lavouras foram afetadas pelo frio intenso, destacando que o fenômeno climático, que vem sendo comparado com as históricas geadas de 1994, atingiu com maior intensidade as áreas mais baixas, onde o ar congelante se concentra nas madrugadas.

A Minasul atua em importantes polos produtores do Sul de Minas Gerais, região que respondeu por cerca de 40% da produção de café arábica do Brasil em 2020. A área da cooperativa foi mais uma entre várias brasileiras –como o Cerrado Mineiro– golpeada pelo fenômeno climático da semana passada, que fez disparar os preços em Nova York para o maior valor desde 2014, diante da intempérie no maior produtor e exportador mundial.

Nesta sexta-feira, o Sul de Minas voltou a ser atingido por geadas, mas o frio foi menos intenso, segundo os relatos iniciais, com exceção de algumas áreas que tiveram registro do fenômeno pontualmente mais forte. Isso também ocorreu em municípios cafeeiros da Serra da Mantiqueira, onde a Minasul também atua.

“A geada foi no mesmo nível ou mais fraca do que a registrada na semana passada, então, os danos aparentemente vão ficar naquilo mesmo”, comentou Rezende.

Apesar de fazer uma estimativa da área queimada pelas geadas, o agrônomo considera que é cedo para falar sobre o tamanho das perdas.

Ele explicou à Reuters, que também participou do sobrevoo pelas regiões cafeeiras, que a intensidade das “queimaduras” causadas pelas geadas varia dentro de um mesmo talhão, o que torna difícil qualquer avaliação no momento. Mas considera um fato que haverá perdas.

“É fato, 2022 não vai ser um ano de alta (produtividade)”, comentou, em referência ao ciclo bianual do café arábica, que em 2021 estava na baixa. Ele ponderou ainda que os cafezais já vinham sofrendo os efeitos de uma seca prolongada.

Em mais um mês, observou o coordenador técnico ao visitar juntamente com a Reuters a fazenda Mato Dentro, em Varginha, as folhas ressecadas pelas geadas estarão todas no chão, e ficará mais fácil saber até que ponto os pés de café foram atingidos.

Aqueles afetados com maior severidade terão que passar por uma poda mais radical, chamada recepa.

“Se for recepa, a próxima safra com produção significativa será só em 2024”, avaliou, ao comentar o impacto da geada em uma lavoura que já havia sido podada em 2021 para produzir bem somente em 2022, mas que agora terá produção zero no ano que vem e renderá pouca coisa em 2023.

“É MUITO TRISTE”

Para o produtor Flávio Figueiredo de Rezende, com propriedades em Varginha e Carmo da Cachoeira, atingidas em intensidades variando de 90% a 20%, a safra de 2022 seria recorde, mas agora se for igual a de 2021 “está de bom tamanho”.

“É muito triste, mas faz parte da nossa luta”, disse ao mexer nos ramos, ainda com frutos da safra atual, de uma lavoura de 15 anos totalmente queimada na fazenda Coqueiro –a geada, em geral, não resulta em problemas para os grãos prontos para colheita, e sim para safras futuras.

Ele relatou ainda que o setor foi “surpreendido” pela intensidade do frio da semana passada, que segundo ele só pode ser comparado à geada de 1994, o último grande evento climático congelante para os cafezais do Brasil.

Nesta sexta-feira, a fazenda Coqueiro voltou a registrar geadas, mas com menor intensidade, como previu na quinta-feira o proprietário, que acreditava que dificilmente perdas relevantes adicionais à região de Varginha seriam geradas dada a severidade do fenômeno anterior.

“Não foi intensa como no dia 20”, confirmou na manhã desta sexta-feira o gerente da Coqueiro, Denis Roberto Leonel, apontando dessa vez menos folhas, ramos e frutos congelados, nos mesmos talhões amplamente atingidos na semana passada.

MUDAS QUEIMADAS

José Marcos Rafael Magalhães, presidente da cooperativa Minasul, que tem fazendas em Coqueiral e Nepomuceno, avalia que a geada consumiu a maior parte do potencial produtivo de seu café, e aponta ainda que as lavouras deverão levar três anos para se recuperar.

Ele relatou ainda que mudas foram queimadas pelo frio intenso, o que deverá dificultar a vida daqueles que pretendem avançar com novas áreas.

“Vai demorar a recuperação, além de ter queimado lavouras novas, não tem muda para plantar e expandir”, lamentou ele, ressaltando que, mesmo áreas sem danos aparentes, terão a produtividade afetada na próxima safra, uma vez que o frio intenso resulta no abortamento das gemas florais.

Por conta dos prejuízos, Magalhães está confiante de que o governo federal virá em socorro dos cafeicultores, opinião compartilhada pelo outro produtor, que lembrou de um programa de renegociação de dívidas após as geadas de 1994.

Numa conta simples, com a saca de 60 kg tendo subido para mais de mil reais, Magalhães avalia a perda de produção no Sul de Minas entre 5 bilhões a 6 bilhões de reais, no próximo ano, valores que dão a dimensão de um impacto que pode se desdobrar para toda a cadeia produtiva sem uma ação governamental.

Ele disse acreditar que a situação gerada pelas geadas levará o Brasil a apoiar produtores em um programa que torne a cafeicultura mais “resiliente”, incentivando o uso de variedades mais produtivas por meio de financiamentos à renovação do parque cafeeiro. “O governo vai fazer, do limão, uma limonada”, estimou.

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