Entre no escritório de Gabriel Jaramillo, presidente do banco Santander no Brasil, e terá uma surpresa. A ampla sala é decorada apenas com uma foto da sede do Banespa, que pertence ao Santander, e uma pintura de um papagaio vermelho. Na estante, estão alguns poucos livros de arte e um retrato de Jaramillo ao lado do presidente eleito Lula. Em cima da mesa, vê-se duas folhas de papel e três pequenos peões ? brinquedos que o executivo coleciona. O ambiente é quase impessoal, como se os móveis tivessem acabado de chegar e o imóvel ainda não tivesse sido ocupado. Esse estilo peculiar revela mais do que se pode imaginar à primeira vista sobre o modo de trabalho de Jaramillo e como conseguiu transformar o Banespa no banco mais lucrativo do Brasil em 2002, batendo recordes históricos de rentabilidade. Foi esse desempenho que levou Jaramillo a ser escolhido o Empreendedor do Ano em finanças.

?Odeio ficar no meu escritório?, afirma o colombiano que preside a filial brasileira do Santander há três anos. E ele fica o menos que pode na sede do banco no bairro de Santo Amaro, em São Paulo. Nos dias de folga, Jaramillo viaja para a praia no litoral paulista ou passeia pelo interior do Brasil, do Pantanal à Amazônia. Na sua rotina no banco, visita o maior número possível de agências, na maioria das vezes de surpresa. Na primeira incerta que deu, na agência de São Luís de Paraitinga, no interior de São Paulo, chegou dirigindo o próprio carro e precisou mostrar o crachá para convencer os funcionários de que era o presidente do banco que estava ali. Acabou sendo levado ao encontro de um cliente e concedendo um empréstimo na mesma hora.

 

A estratégia por trás dessas visitas é clara: Jaramillo acredita que, antes de ser o resultado de um punhado de números, um banco se baseia no relacionamento pessoal com os clientes. Ele vai às agências e pede aos funcionários que lhe contem o que pode fazer para ajudá-los a se aproximar da freguesia. ?Temos que ser amistosos e conquistar a clientela?, resume Jaramillo. Assim como o presidente vai às agências, a ordem para os gerentes é sair a campo e atrair os fregueses.
No interior, onde o Banespa tem tradição de financiamento
agrícola, o banco mantém 30 agrônomos para atender os produtores em suas fazendas. ?Temos que gastar a sola dos sapatos?, diz Jaramillo, repetindo uma frase que se tornou um dos lemas do banco em sua gestão.

Resultado recorde. Com esse estilo ousado de cativar a freguesia, o Banespa conseguiu ampliar sua base de clientes depois da privatização, em novembro de 2000, o que muitos concorrentes diziam que era impossível. Falava-se que o banco era antiquado e ultrapassado tecnologicamente e que, sem os privilégios de uma instituição estatal, seria engolido pelos competidores nacionais. Hoje, o Banespa tem 3,5 milhões de clientes, 500 mil a mais do que na época do leilão. As operações de crédito aumentaram 19% em dois anos e ajudaram o banco a atingir uma taxa de rentabilidade recorde no sistema financeiro nacional.

De janeiro a setembro de 2002, o Banespa lucrou R$ 2,323 bilhões, mais do que o Itaú (R$ 1,687 bilhão) e o Bradesco (R$ 1,325 bilhão). O resultado cresceu 404% em relação ao mesmo período do ano passado. O que chama ainda mais a atenção é que o Banespa obteve um lucro maior mesmo sendo um banco menor que os concorrentes. Nos primeiros seis meses do ano, o Banespa deu um retorno de 66% sobre o patrimônio líquido, muito acima da média dos dez maiores bancos nacionais, de 22%, de acordo com a ABM Consulting.

?É a maior taxa de retorno que tenho notícia entre os
grandes bancos nacionais?, diz Alain Marinovic, analista da ABM Consulting. A explicação para esse lucro recorde, segundo Marinovic, é o aumento de eficiência do banco. Enquanto a receita com crédito e com a valorização dos títulos públicos de sua carteira cresciam, caiam as despesas administrativa e com pessoal. ?O banco investiu forte em informática, cortou gastos e, ao mesmo tempo, fez operações mais rentáveis de crédito e de compra de títulos públicos?, diz o analista. O resultado, avalia Marcelo Bessan, consultor de bancos da KPMG, mostra que o Santander conseguiu passar por uma prova de fogo do mercado nacional. ?É um dos bancos estrangeiros que soube enfrentar melhor a forte concorrência no varejo no Brasil?, diz Bessan.

 

É possível sustentar os resultados excepcionais de 2002 nos próximos anos? Jaramillo não garante, mas diz que o banco deve continuar avançando. ?Na Europa, um banco só cresce se tira mercado de outro?, diz o presidente do Santander brasileiro. ?Aqui há espaço para todos e dá para crescer muito.? De acordo com o executivo, o banco entrará numa segunda fase no Brasil. Num primeiro momento, logo depois de assinar o cheque de R$ 7 bilhões pelo Banespa, procurou arrumar a casa. Além de investir pesado em informática, gastou R$ 750 milhões na reformulação das agências e deu 1,5 milhão de horas de treinamento para os funcionários. À equipe de 1,1 mil gerentes foram somados outros 2,5 mil profissionais. O quadro geral de funcionários, porém, caiu. Cerca de 8,3 mil pessoas saíram num programa de demissões voluntárias.

 

Agora, terminou a fase de adaptação da antiga estrutura do Banespa. ?Nós dobramos, triplicamos de tamanho em quatro anos?, diz Jaramillo. ?Nossa prioridade agora é criar um patamar de atendimento superior aos dos nossos concorrentes no Brasil.? Além de buscar melhorar o atendimento, o banco estabeleceu algumas metas de negócios em 2003, que seguem as mesmas prioridades da agenda econômica do presidente eleito. O Banespa-Santander quer oferecer mais crédito para pequenas e médias empresas, exportadores e financiamento agrícola. Apesar dos novos planos, um princípio básico não muda. A receita de Jaramillo para enfrentar a dura concorrência dos bancos de varejo brasileiros ? que abateu muitos rivais estrangeiros ? é tentar se adaptar ao mercado local, sem impor a todo custo todos os métodos e estratégias da matriz. ?Temos que preservar o sabor paulista?, diz Jaramillo.