O Ministério do Meio Ambiente recebeu nesta quarta-feira (31) com “surpresa e preocupação” a decisão do governo eleito de Jair Bolsonaro de fundir a pasta com o Ministério da Agricultura, um projeto que segundo críticos deixaria o cuidado do meio ambiente nas mãos do poderoso setor do agronegócio.

“Os dois órgãos são de imensa relevância nacional e internacional e têm agendas próprias, que se sobrepõem apenas em uma pequena fração de suas competências”, afirma o ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, em um comunicado.

A declaração alerta, em sintonia com representantes da sociedade civil, que a medida terá consequências negativas para o cuidado do meio ambiente e para a economia do país.

Com a fusão, “economia nacional sofreria, especialmente o agronegócio, diante de uma possível retaliação comercial por parte dos países importadores”, acrescenta o comunicado.

“Protegemos nossas riquezas naturais, como os biomas, a água e a biodiversidade, contra a exploração criminosa e predatória, de forma a que possam continuar cumprindo seu papel essencial para o desenvolvimento socioeconômico”, explica Duarte, que propõe um diálogo transparente e qualificado com o governo eleito no período de transição.

Pelo menos dois abaixo-assinados circulam nas redes sociais na tentativa de frear a iniciativa. Uma deles, no site peticaopublica.com.br, já havia recolhido mais de 460.000 adesões nesta quarta-feira.

Bolsonaro, que assumirá o cargo em 1º de janeiro, foi eleito no domingo com 55% dos votos válidos e conta com amplo apoio do agronegócio, responsável por uma parcela considerável do PIB.

Entretanto, mesmo entre os membros da bancada ruralista da Câmara dos Deputados esse projeto desperta “preocupação”.

“Precisamos ainda entender como viria isso, por isso não vou dizer se sou a favor ou contra, mas nos traz sim uma preocupação de trazer para dentro da Agricultura um ministério desse tamanho e complexidade”, disse a líder da bancada ruralista, Tereza Cristina (DEM-MS) , citada pelo jornal O Globo.

O Ministério do Meio Ambiente se ocupa entre outros temas das licenças ambientais às concessões de obras de infraestrutura, como a construção de hidrelétricas ou de plataformas de petróleo.

Em agosto, e uma visita ao estado amazônico de Roraima, Bolsonaro criticou os controles das agências estatais de temas ambientais, ICMbio e Ibama, que “prejudicam quem quer produzir”.

O general Oswaldo Ferreira, provável ministro do Transporte no próximo governo, declarou em uma entrevista recente ao jornal Estado de S.Paulo que na década de 1970 – quando o governo militar construiu uma rodovia que atravessa a floresta amazônica – não existiam órgãos reguladores para “encher o saco”.

Durante a campanha, Bolsonaro indicou que poderia voltar atrás na fusão, mas manteve a decisão depois de eleito.

“Agricultura e Meio Ambiente estarão no mesmo ministério, como desde o primeiro momento”, anunciou na terça-feira o deputado Onyx Lorenzoni, futuro chefe de gabinete.

– Críticas de ONGs e abaixo-assinados –

A ONG Greenpeace se opõe à fusão, por considerar que colocará o Brasil, o país mais biodiverso e com a floresta mais importante do mundo, na “contramão do resto do mundo”.

“Mercados internacionais e consumidores querem garantias de que o nosso produto agrícola não esteja manchado com a destruição florestal. Ao extinguir o Ministério do Meio Ambiente, reduziremos o combate ao desmatamento, perdendo competitividade, o que pode inclusive afetar a geração de empregos”, afirmou o Greenpeace em comunicado.

A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura – composta por dezenas de organizações da sociedade civil, acadêmicos e também por empresas que defendem a indústria sustentável -, também criticou a fusão.

“Ambas as agendas (meio ambiente e agricultura) são fundamentais para garantir o balanço entre a conservação ambiental e a produção sustentável e devem ter o mesmo peso na tomada de decisão do governo”, escreveu a coalizão em comunicado.

Para a ONG Observatório do Clima, a decisão “antecipa o início do desmonte da governança ambiental do Brasil”.