O mercado de títulos de crédito ganhou projeção nos últimos meses e tem atraído muitos investidores do varejo. Com a recente volatilidade das aplicações em renda variável, um número maior de investidores optou por se proteger aplicando em recebíveis, entre os quais estão os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (Fidics). Dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostram que somente no primeiro trimestre de 2020 foram capitalizados mais de R$ 63,6 bilhões em títulos de crédito. Os fundos de duração com baixo grau de investimento (high grade) foram o destaque de resgates em março, com R$ 44 bilhões, e também no trimestre (R$ 75,9 bilhões), o que aponta para o conservadorismo do investidor. Enquanto isso, a captação no trimestre dos fundos de ações foi de R$ 45 bilhões e dos fundos multimercados, R$ 14,4 bilhões.

Agora a situação é outra. Muitos investidores querem saber como o mercado de fundos de recebíveis irá se comportar, sobretudo diante do cenário de piora dos resultados das pequenas e médias empresas em função da crise provocada pela Covid-19. E os sinais de alerta já movimentam o mercado. “Não podemos afirmar que a evasão da renda fixa tem como destino o mercado de ações ou os multimercados, mas levando em consideração a situação do País (e até do mundo), sabe-se que quanto mais vende, mais cai o preço”, afirma Otávio Vieira, sócio gestor da Taler Gestão de Patrimônios. “Esse fluxo de resgates mais acentuado faz com que os fundos anunciem os papéis ao mercado para tentar trocar esses títulos por liquidez e assim entregar o dinheiro para o cotista que estava resgatando”, diz Juliano Custódio, CEO da EQI Investimentos.

“Seja por conta de despesas pessoais ou porque o investidor enxerga oportunidade em ativos que tiveram queda de preço, ele busca sua liquidez”Juliano Custódio CEO da EQI Investimentos. (Crédito:Divulgação)

É possível perder dinheiro na renda fixa? Muita gente pensa que não, mas é possível. Em momentos de crise como a que estamos vivendo, uma procura enorme por liquidez toma conta do mercado, não apenas no Brasil, mas no mundo como um todo. “Estamos passando por esse momento agora, muito parecido com que ocorreu no fim de 2019. Seja por conta de despesas pessoais, ou porque o investidor enxerga oportunidade em ativos com mais risco que tiveram quedas, como as ações, ele busca sua liquidez”, diz Custódio. Se a busca por liquidez é geral, quem irá comprar os títulos que estão à venda? “Boa parte desses fundos tem resgate quase imediato — o cotista pede o resgate e o dinheiro cai na conta em até um dia útil —, então o gestor não tem muito tempo para pensar, precisa vender e vender rápido para atender esse resgate”, diz Felipe Prata, CEO da Nest Asset Management.

“Não podemos afirmar que a evasão da renda fixa tem como destino o mercado de ações, mas sabe-se que quanto mais vende, mais cai o preço” Otávio Vieira, sócio da Taler Gestão de Patrimônios. (Crédito:Divulgação)

PODER AO BC A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 10/20, também conhecida como Orçamento de Guerra, prevê medidas que têm por objetivo aumentar a liquidez de empresas, mas cujo efeito colateral é deixar o Tesouro Nacional exposto a papéis com alto risco de inadimplência. Pelo texto da PEC (leia mais à página 18), o Banco Central poderia atuar na negociação de títulos privados no mercado secundário — como debêntures, carteiras de créditos e certificados de depósitos bancários (CDBs). A indefinição do Orçamento de Guerra no Senado é vista com preocupação pelo mercado. “Precisamos de medidas drásticas para uma quarentena vir a ser cumprida de verdade pelos brasileiros e os casos pararem de crescer. Quanto mais incertezas, mais decisões erradas e prejuízos”, diz Otávio Vieira, sócio gestor da Taler Investimentos. “O Brasil não tem noção das consequências que sofrerá com a incerteza plantada pelo governo. Não é hora de aumentar esse sentimento e sim de executar as políticas econômicas que já estão aprovadas”, conclui.