Em vigor desde o dia 1º de agosto, as ofertas públicas de Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas da Agroindústria (Fiagro) em análise na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) já apontam uma captação de mais de R$ 1,4 bilhão em cinco operações de Fiagro Imobiliário. Além dos fundos, há outras quatro ofertas de direitos creditórios do agronegócio em preparação. Os responsáveis são a securitizadora Ecoagro, com R$ 1,56 bilhão previstos, e empresas como Vamos Locação (R$ 1,06 bi) e Caramuru Alimentos (R$ 300 milhões).

No Fiagro Imobiliário, a XP será a coordenadora de três emissões: FG Fiagro Imob, Riza Agro e XP Crédito Agrícola. Já o Itaú será coordenador do fundo Kinea Crédito Agro, enquanto o banco digital Modalmais cuida do processo da gestora Santa Fé Investimentos para o fundo Terra Mater. Vale lembrar que neste ano, mesmo antes da entrada em vigor do Fiagro, três fundos imobiliários com a temática agro já haviam sido registrados na CVM, com R$ 1,65 bilhão em captações: BTG Agro Logística, BTG Terras Agrícolas e Riza Terrax. “São mais de dez ofertas públicas previstas de Fiagro para os próximos meses. Nós vemos um grande potencial nesse produto, a exemplo do CRA (Certificados de Recebíveis do Agronegócio), que capta mais de R$ 25 bilhões por ano nas emissões”, disse a gestora de investimento da Quasar Asset Management, Sofia Caccuri.

Andre Hanni

“A grande vantagem do Fiagro é que ele nasceu com uma estrutura pronta e pode atingir a maturidade rapidamente” Carlos Ferrari sócio do escritório NFA Advogados.

Na avaliação de Carlos Ferrari, sócio do escritório NFA Advogados, o Fiagro nasce com muito potencial de crescimento, pois ele vai aproveitar a bem-sucedida experiência regulatória dos 15 anos dos Fundos de Investimento Imobiliários (FIIs) que oferecem o benefício fiscal para investidores pessoas físicas. “O Fiagro é muito parecido com o fundo imobiliário, que avançou no varejo e reúne mais de 3 milhões de investidores. A legislação é muito boa, com experiências já superadas, e o novo veículo de investimento possui todas as condições de avançar ainda mais”, disse Ferrari. “A grande vantagem do Fiagro é que ele nasceu com uma estrutura pronta, pode atingir a maturidade muito antes, mais de R$ 10 bilhões no primeiro ano de atividade.”
Segundo Ferrari, a CVM ainda deve abrir uma audiência pública em 2022 para debater uma regulamentação específica para o Fiagro. Enquanto isso não ocorre, o regulador estabeleceu regras provisórias para três modalidades desse fundo: Fiagro Direitos Creditórios, Fiagro Imobiliário e Fiagro Participações, todos regulamentados por instruções específicas. “As primeiras ofertas devem atrair o interesse de investidores qualificados e profissionais, mas toda a estrutura é voltada para o varejo, com listagem posterior na bolsa (B3) para dar condições de liquidez para pessoas físicas”, afirmou o advogado.

Segundo Ferrari, o impacto dos novos produtos no desenvolvimento das cadeias produtivas agroindustriais será intenso, pois os fundos permitem captar recursos para projetos de investimento, uma das metas da legislação. “Os gestores dos fundos vão olhar o setor com uma ótica mais global, observando potencialidades em toda a cadeia. Há projetos diversos para soja, cana-de-açúcar e algodão”, disse ele. Na Quasar Asset, a gestora Cristina Tamaso conta que a agregação de valor desse desenvolvimento das cadeias produtivas é uma das principais estratégias de investimento. “Uma das teses do nosso fundo é diminuir a lacuna de armazenagem do setor”, disse ela. Em outras palavras, há ganhos potenciais se a produção não tiver de sair direto do campo para o porto com vistas à exportação rápida, por falta de locais de armazenagem.

ALÍVIO Fiagro permite ao agronegócio depender menos dos bancos para receber recursos. (Crédito:Divulgação)

DINHEIRO PÚBLICO Na visão de Sofia Coccuri, o Fiagro alivia parte da necessidade de obter empréstimos direcionados para o agronegócio nos bancos públicos. “O governo tem dificuldade em conseguir mais recursos para a agricultura familiar. O desenvolvimento do Fiagro tende a aliviar a sobrecarga sobre os bancos públicos (BB e Caixa) em atender um setor estratégico e essencial”, afirmou. Para ela, as empresas do agronegócio tendem a profissionalizar a administração para obter os recursos no mercado de capitais. “Antes, muitas empresas familiares do agro não eram auditadas, agora começam a se profissionalizar.”

Para João Paulo Minetto, sócio da área de mercado de capitais do escritório de advocacia Demarest, o Fiagro tem tudo para ser “um sucesso” para complementar o crédito bancário. “É um setor que precisa de ciclos de financiamento e, na outra ponta, há demanda dos investidores por ativos de maneira geral”, afirmou. Mas Minetto pondera que mesmo que o novo veículo tenha sido testado pelo mercado com a experiência anterior de fundos imobiliários e do CRA os cuidados devem ser mantidos. “Uma aplicação inadequada pode trazer uma má experiência”, afirmou. “Eventual fraudes também podem ser muito ruim para a imagem do produto. O regulador precisa garantir maior proteção para o investidor.”