Por Anthony Boadle

BRASÍLIA (Reuters) – Os dois únicos homens conhecidos do povo indígena brasileiro piripkura vivem isolados em terras ancestrais da floresta amazônica, resistindo a décadas de invasão de madeireiros e pecuaristas.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) renovou nesta sexta-feira uma ordem de proteção para a área de 242.500 hectares no oeste do Mato Grosso. Mas esta só irá durar seis meses, ao contrário das prorrogações de três anos concedidas ao território desde 2008.

O destino dos piripkura é um teste dos direitos indígenas no governo do presidente Jair Bolsonaro, que critica as reservas por concederem terras demais a poucas pessoas e impedirem a ampliação da mineração e da agricultura.

Defensores dos direitos indígenas pressionaram por uma prorrogação de três anos como as anteriores, e o grupo Survival International a classificou como uma “suspensão de execução” do governo para medir as reações antes de acabar de vez com a proteção.

“Ainda estamos profundamente preocupados, já que o futuro dos piripkura ainda está indefinido, enquanto os grileiros estão circundando e prestes a invadir”, disse Fiona Watson, diretora de pesquisa e defesa da Survival International.

A Procuradoria-Geral da República pediu ao governo para renovar as ordens de proteção que estão prestes a expirar para quatro grupos indígenas –Terras Indígenas Piripkura (MT), Jacareúba/Katawixi (AM), Piriti (RR) e Ituna-Itatá (PA). Segundo nota técnica, o Brasil é o país sul-americano com o maior número de indígenas vivendo voluntariamente em isolamento, com 114 povos isolados registrados.

O procurador federal Ricardo Pael, que pleiteia uma prorrogação nos tribunais, disse que ela deveria ser renovada até a Funai tomar uma decisão final sobre a conversão dos piripkura em uma reserva oficial.

Mas ele disse que a agência selecionou uma equipe para estudar a demarcação de terra que não tem experiência com povos nunca contatados e que alguns de seus membros têm conflitos de interesse devido a ligações com o setor agrícola.

Os homens piripkura, Baita e o sobrinho Tamanduá, só foram vistos nos últimos anos em encontros esporádicos com funcionários da Funai. Com cabelos e barbas compridos e nus, eles desaparecem rapidamente na floresta, onde se acredita que outros piripkura vivem.

A irmã de Baita, Rita Piripkura, é o contato dos homens com o mundo exterior desde que saiu para se casar com um integrante de outro povo na reserva próxima de Karipuna.

“Tem muita gente andando lá. Vão matar eles dois. Se matar, aí não tem mais”, disse Rita uma entrevista gravada, relembrando um massacre de seu povo anos atrás.

“Gente branca chegou na madrugada e mataram a todos, mataram a minha sogra, mataram nove. Minha família fez uma canoa e escapo”, disse.

Em julho, Pael obteve uma medida liminar para a expulsão de agricultores da terra piripkura, o território mais desmatado de qualquer povo amazônico isolado ou contatado recentemente. A polícia ainda não executou a ordem.

Antropólogos dizem que os povos isolados da Amazônia não podem sobreviver sem suas terras e estão cada vez mais enfrentando invasores armados interessados ​​em caça furtiva, agricultura e mineração em seu território.

A PGR informou em sua nota que há 55 pedidos de exploração mineral sobrepostos ao território indígena interditado somente na Terra Indígena Piripkura, que ficarão retidos pela ordem de proteção por mais seis meses.

Os defensores dos indígenas temem que o fracasso na renovação dessas ordens signifique uma eventual extinção dos territórios protegidos.

“É o fim dessa história. Seria um genocídio”, disse Fabrício Amorim, integrante do Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI).

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