Os deputados franceses vão examinar nesta quinta-feira (8) um novo projeto de lei para legalizar a eutanásia, mas a bancada conservadora planeja torpedear a votação com uma bateria de emendas que impossibilitariam sua aprovação a tempo.

Se o projeto de lei for ratificado, a França se tornará o quinto país da União Europeia a descriminalizar a eutanásia, depois de Holanda, Bélgica, Luxemburgo e Espanha.

Para o deputado Olivier Falorni, promotor do texto, autorizar a eutanásia permitiria acabar com a “hipocrisia” de deixar os franceses “irem para o exílio” na Bélgica, ou na Suíça, para recorrer a ela, ou fechar os olhos aos “2.000 a 4.000” procedimentos de eutanásia clandestinos realizados todos os anos na França.

Seu projeto de lei estabelece que “qualquer pessoa capaz, maior de idade, em estágio avançado, ou terminal, de doença grave e incurável, qualquer que seja sua causa, que cause sofrimento físico ou psicológico que não possa ser aliviado, ou que considere insuportável”, poderá solicitar “assistência médica” para morrer “com ajuda ativa”.

O texto busca dar uma nova resposta ao doloroso e delicado debate sobre o fim da vida e a eutanásia, cinco anos após a lei Claeys-Leonetti, que autorizou a sedação profunda e contínua de pacientes terminais, mas fechou as portas para a eutanásia ativa.

Para o sociólogo Philippe Bataille, defensor da eutanásia, os franceses “reclamam há 20 ou 25 anos uma lei sobre o assunto (…) mas o Parlamento continua surdo”.

Segundo pesquisa de 2019, 96% dos franceses são a favor da lei que autoriza o corpo médico a pôr fim, sem sofrimento, à vida de pacientes em estado terminal.

– 3.000 emendas –

O debate sobre a eutanásia está presente há mais de quatro décadas no cenário político francês. Mas a questão, embora tenha um certo consenso, mostra posições diferentes, dependendo do partido político.

O projeto conta com amplo apoio dos deputados comunistas, socialistas e da esquerda radical. Na bancada do partido do governo (LREM, centrista) de Emmanuel Macron, muitos deputados já anunciaram seu apoio ao texto, apesar de não ter o aval do Executivo.

Macron, cujo mandato termina em um ano, não assumiu qualquer compromisso a esse respeito durante sua campanha eleitoral em 2017. Ele se limitou a pedir que “a lei Claeys-Leonetti seja totalmente implementada primeiro”. No entanto, acrescentou: “Eu gostaria de escolher meu fim da vida”.

Aqueles que se opõem à proposta acreditam que é prematuro pensar em ir mais longe, quando a lei “Claeys-Leonetti” ainda não se aplica a todo país. Um quinto dos departamentos franceses ainda não dispõe de um centro de cuidados paliativos.

Os deputados hostis à eutanásia apresentaram 3 mil emendas, o que vai desacelerar os trâmites até tornar praticamente impossível qualquer votação dentro do prazo previsto, ou seja, quinta-feira à meia-noite.

Do total, 2.300 emendas foram apresentadas por deputados do partido conservador Os Republicanos.

Falorni, ex-membro do Partido Socialista, disse à AFP que as emendas equivalem a uma “obstrução”.

“Queremos debater. Queremos votar. Chegou a hora do Parlamento. Respeitemos”, convocaram 270 deputados de todas as bancadas, ou seja, a quase maioria, em artigo de opinião publicado no domingo no Journal du Dimanche (JDD) contra a “guerra de guerrilha” travada por meio das emendas.

Entrevistado pela AFP antes da votação, Alain Cocq, um homem de 58 anos que sofre de uma doença incurável e dolorosa há 35 anos, pediu aos deputados que adotem o direito à eutanásia na França, sem o qual ele se veria “forçado” a “morrer no exílio” na Suíça.

Em 2020, Cocq ganhou a primeira página de todos os jornais quando tentou se deixar morrer, parando de comer e de se hidratar e transmitindo sua agonia ao vivo no Facebook.

“Os médicos me salvaram nove vezes in extremis. Lamento porque não é a minha vida: é uma vida imposta pela doença”, desabafou ele.

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