Os economistas do mercado financeiro elevaram pela nona semana consecutiva a projeção mediana do IPCA – o índice oficial de inflação – para 2020. Conforme o Relatório de Mercado Focus, divulgado na manhã desta terça-feira pelo Banco Central, a projeção para o índice este ano passou de 2,12% para 2,47%. Esta é a maior projeção registrada desde 9 de abril (2,52%), quando as estimativas estavam em queda livre, na esteira da pandemia do novo coronavírus.

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Nas últimas semanas, o IPCA vem acelerando, de forma gradativa, em meio a pressões específicas. Na semana passada, em entrevista a uma rádio, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, lembrou que a alta do dólar ante o real gera inflação sobre os produtos importados, o que contamina os índices de preços. Além disso, citou a alta dos preços de alimentos – um fenômeno que, segundo ele, também atinge países emergentes como México, Colômbia e Índia.

Apesar da elevação vista nas últimas nove semanas, a projeção do IPCA segue bem abaixo do centro da meta de 2020, de 4,00%, sendo que a margem de tolerância é de 1,5 ponto porcentual (índice de 2,50% a 5,50%). Isso é resultado direto da pandemia do novo coronavírus, que reduziu a atividade econômica e a renda, deixando pouco espaço para reajustes de preços.

Entre os índices de inflação compilados no Focus, chama a atenção o movimento registrado pelo Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M). A projeção do IGP-M subiu pela 13ª semana consecutiva, de 16,59% para 16,93%. Esta é a maior projeção registrada até o momento.

A disparada do IGP-M – principal referência para o reajuste dos contratos de aluguel no Brasil – está ligada a sua metodologia de cálculo. O IGP-M é calculado com base em três índices, sendo que o mais importante, com peso de 60%, é o que mede os preços no atacado para produtores. Os preços no varejo para os consumidores têm peso de 30% e na construção civil, de 10%.

A pressão atual do IGP-M está justamente no atacado – ou na “inflação da porta da fábrica”, como dizem os economistas. Isso porque esta parcela do IGP-M reflete os reajustes de preços ligados a matérias-primas brutas, como minério de ferro, milho, soja, trigo, farinha de trigo, proteínas de animais vivos, cana-de-açúcar, café e laranja, entre outras. Na pandemia, os preços de várias dessas commodities subiram.

No entanto, economistas do mercado financeiro e o próprio Banco Central têm defendido que, apesar da disparada do IGP-M, as projeções para o IPCA seguem controladas. A visão é de que a “contaminação” do IPCA pelo IGP-M, pelo menos por enquanto, não é tão preocupante.

Os dados do Focus refletem esta percepção mais geral. Mesmo com um IGP-M projetado em 16,93% em 2020 e em 4,30% em 2021, a expectativa para o IPCA nestes anos é de 2,47% e de 3,02%. No caso de 2021, a meta do IPCA é de 3,75%, com margem de 1,5 ponto (de 2,25% a 5,25%). Na prática, a inflação esperada para o próximo ano segue abaixo da meta de inflação (dentro da margem de tolerância).

Economistas e o próprio BC têm alertado, no entanto, que todos os cálculos dependem da política fiscal. Na semana passada, Campos Neto afirmou que o Brasil precisa demonstrar aos investidores globais que possui disciplina fiscal. “Quando há uma situação fiscal mais frágil, o gasto do curto prazo pode inibir o crescimento de longo prazo”, alertou.