A carioca Flavia Bittencourt, presidente da rede varejista de produtos de beleza Sephora no Brasil, gosta de surpreender. Sem qualquer constrangimento, ela confessa que não entende nada do mercado de beleza. Até dezembro de 2013, quando assumiu a rede mundial de lojas do Grupo LVMH no País, a especialidade dela eram os setores financeiro e de telecomunicações – trabalhou na Oi e nos bancos Nacional e Unibanco. O desconhecimento rendeu a Flavia uma vantagem: ela nunca se envergonhou de fazer perguntas simples.

Por exemplo, ela questionava por que uma cliente compraria determinada marca ou como poderia simplificar uma história de sucesso, de uma categoria de produto no exterior, para a brasileira compreender a tendência da moda. Esse comportamento franco fez com que ela convecesse o CEO mundial, Christopher de Lapuente, sobre um novo modelo de negócio no País. Ela queria lançar quiosques, para incrementar as vendas e atrair um novo público, mas Lapuente resistia em razão do fracasso dos quiosques em outros países.

Com uma pequena verba de marketing, Flavia testou sua tese. Em três meses, o CEO mundial entendeu por que a executiva brasileira insistia tanto nesse modelo para o Brasil. Flavia avaliou que poderia reduzir a margem de lucro da marca própria Sephora Collection para se aproximar da consumidora que se sentia intimidada com uma loja premium. “Hoje, o quiosque está em outros países”, diz Flavia, escolhida a EMPREENDEDORA DO ANO NO VAREJO. “Eu aprendo não por que trouxe de outras indústrias ou de outras empresas, mas por conversar com a equipe de vendas e por observar as clientes enquanto elas compram.”

O CEO mundial gostou tanto do que viu no Brasil que autorizou a abertura de cinco novos quiosques e dividiu a estratégia com outros países. “A Sephora compete, no mundo, com lojas de departamento e no Brasil, com as segmentadas”, diz Alberto Serrentino, fundador da Varese Retail. “Ela tem aproveitado essa deficiência estrutural do País para ocupar espaço e diversificar o formato da loja premium com quiosques para aumentar seu potencial de expansão com outros públicos.”

Os resultados têm agradado. Com 24 lojas e 11 quiosques (ao todo são 2,3 mil lojas em 33 países), o índice de retorno de uma cliente na loja é de 62% e o tempo médio de permanência, de 45 minutos. “Não sou mais varejo, sou entretenimento”, diz Flavia. “A cliente entra na loja para se divertir, se maquiar, aprender um novo truque e brincar com uma marca que ela não conhece. A compra é uma consequência que esse universo oferece. Então, tenho de manter essa experiência e esse entretenimento, que é o que todo varejo deseja ser e nós conseguimos.”

Se a loja física consegue encantar clientes pela possibilidade do contato sensorial com marcas e produtos, a virtual tem o desafio de reproduzir uma experiência semelhante. Como não dá para tocar ou sentir o cheiro, a Sephora tenta mostrar imagens ampliadas, que permitem visualizar a textura do produto e detalhes característicos. Há, também, um grande investimento em vídeos e tutoriais para a cliente ter a exata noção do que está buscando. Todo esse cuidado é pela importância do comércio eletrônico para as vendas.

Cerca de 60% são realizadas para clientes da classe C nesse canal. De acordo com a consultoria Euromonitor, as receitas da Sephora no Brasil só no comércio eletrônico foram de cerca de R$ 180 milhões, no ano passado (a receita global estimada é de mais de US$ 4 bilhões). “A experiência de compra no ambiente virtual da Sephora é comparável à de outros varejistas online de produtos de beleza e cuidados pessoais, como Beleza na Web e Época Cosméticos”, diz Marília Borges, analista de pesquisa da Euromonitor.

O trabalho de Flavia está longe de ser concluído. Ela mantém uma lista com 10 marcas que precisam fazer parte do extenso portfólio de produtos da loja. A marca Too Faced, por exemplo, estava no topo da lista das mais desejadas pelas clientes. Nos últimos meses, conseguiu ser a primeira operação global a colocar a MAC nas gôndolas. Para 2018, uma das novidades será o envio gratuito de um produto que a cliente não encontrar na loja, mas que estiver disponível no estoque. “Fazemos a curadoria das melhores marcas do mundo”, diz ela. “A beleza aumenta a autoestima e sempre tem uma solução na Sephora.” O importante, para Flavia, é seguir surpreendendo.


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Ilan Goldfajn é o empreendedor do ano 2017

Frederico Trajano é o empreendedor do ano 2017 em e-commerce

Guilherme Paulus é o empreendedor do ano 2017 em serviços

Celso Athayde é o empreendedor do ano 2017 em impacto social

Paulo Cesar de Souza e Silva é o empreendedor do ano 2017 na indústria