A fixação de um teto de 30% ao ano para os juros cobrados em operações com cheque especial e cartão de crédito pode levar à desorganização e à contração do mercado de crédito, segundo o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Isaac Sidney.

Ao Estadão, ele diz que não há dúvidas de que o estabelecimento de um teto será prejudicial ao consumidor de serviços bancários e à própria recuperação da economia.

A medida, aprovada pelo Senado, ainda precisa da aprovação da Câmara e da sanção do presidente Jair Bolsonaro, valeria para operações contratadas durante o período de calamidade da pandemia do novo coronavírus, que a princípio vai até 31 de dezembro.

O governo é contrário, mas a limitação encontra forte apelo popular e aceitação entre os parlamentares. Isso porque a taxa média de juros do cheque está hoje em 110,2% ao ano e a do cartão, em 300,2% ao ano.

“A fixação de um limite para a cobrança de juros se equipara a um congelamento de preços”, diz Sidney, para quem a medida é “inviável”. “A experiência tem nos ensinado que, cedo ou tarde, a imposição de limites de preços tem como consequência a interrupção da oferta do produto.”

O presidente da Febraban afirma que, no caso do cheque especial, a limitação dos juros pode tornar o produto acessível apenas para “os ricos, deixando milhares de pessoas à margem do sistema financeiro”. “A fixação de taxas de juros em níveis irreais, que nem sequer cobrem os custos associados à inadimplência (calotes), leva progressivamente a que o produto deixe de ser ofertado.”

No projeto aprovado pelo Senado, porém, há um mecanismo que impede que as instituições financeiras reduzam durante a pandemia os limites do cheque e do cartão a patamares inferiores aos vistos no início de março. Na visão dos parlamentares, isso evitaria que os bancos, pressionados pelo tabelamento, reduzissem a oferta de crédito.

Nesse sentido, Sidney vê riscos para a oferta global de crédito. “Quando há uma combinação entre, de um lado, teto de juros e, de outro lado, congelamento de limite de crédito, isso gera potencial grande de prejuízos e de perda de capital”, avalia. “E perda de capital reduz a capacidade de emprestar. Em síntese, uma medida para atender um segmento específico pode levar a uma redução da oferta de crédito, justamente quando o crédito é mais necessário para ajudar na recuperação da economia.”

A limitação de juros cria ainda um problema regulatório para as instituições financeiras, segundo o presidente da Febraban. O limite de crédito concedido pelos bancos depende da avaliação de risco do cliente pessoa física ou empresa.

“O risco é um conceito dinâmico, que se altera com frequência. E os bancos têm por obrigação regulatória ajustar o limite para atender a regras prudenciais”, alerta o presidente da Febraban. “Quando o risco de um cliente se eleva, é obrigação do banco reduzir o limite de crédito para evitar perdas, para proteger o capital e os recursos dos depositantes.”

Para o presidente da Febraban, a saúde financeira dos bancos também é um “patrimônio” da sociedade. “Não dá para resolver uma crise criando outra crise.”

A limitação de juros no cartão de crédito, na visão do presidente da Febraban, tem ainda potencial de afetar os negócios no varejo brasileiro.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.