São Paulo, 24/10/2020 – Marcada por um dos maiores escândalos de corrupção da história da Prefeitura, a fiscalização de rua em São Paulo sofre há anos com o desmonte de estrutura e queda no número de agentes vistores em atividade nas 32 subprefeituras. A capital tem hoje 352 fiscais (eram 543 em 2013) para uma área de 1,5 mil km² e mais de 700 itens de legislação para vistoriar, desde regras do Código de Obras a comércio ambulante, lei do silêncio e até crime ambiental.

Dados obtidos pelo jornal O Estado de S. Paulo via Lei de Acesso à Informação (LAI) entre 2017 e 2020 mostram que a queda de 35% se deu de forma contínua ao longo dos últimos anos.

Em 2016, por exemplo, o total de fiscais era de 467. Como consequência direta, o número de multas também caiu no período, de 26.941 para 20.949, ou seja, um decréscimo de 22%. Este ano, em função da pandemia de covid-19, o balanço deve ser ainda menor, já que 182 agentes estão trabalhando de casa.

Segundo fiscais ouvidos pela reportagem, a precarização da atividade se dá ainda pela ausência de frota própria de veículos(os agentes usam carros de aplicativos) e pela distribuição das equipes pela cidade. Enquanto o centro tem 30 agentes – e bairros nobres, como Vila Mariana, na zona sul, somam 17 -, áreas mais afastadas chegam a ter somente 4. É o caso de Cidade Tiradentes, no extremo leste. Lá, não por acaso, foram lavradas só 16 multas em 2019.

Ali, por exemplo, a cem metros da subprefeitura a reportagem constatou lixo na rua e o muro de terreno caído. “Eles (fiscais) dizem que o problema não é deles”, diz o comerciante Edmilson Geraldo, que trabalha ali. Basta virar a esquina na Estrada de Iguatemi para achar montes de lixo nas calçadas.

“Estou aqui há um ano e dois meses e só me lembro de ter conversado com um fiscal uma vez, no começo do ano. Ele me orientou a colocar o cavalete de promoção na loja e não me multou”, afirma o vendedor Iuri da Silva, de 22 anos, que trabalha na Avenida Doutor Sylvio de Campos, em Perus, na zona norte.

Na quarta-feira, propagandas em desacordo com a Lei Cidade Limpa, como anúncios de promoção nas fachadas dos comércios, eram facilmente observados.

Situação idêntica à da Rua Parapuã, na Brasilândia, também zona norte. Comerciantes disputam a clientela com ambulantes que ocupam as calçadas vendendo de tudo, de tapetes a comida.

Nas Subprefeituras de Perus e de Brasilândia, o número de fiscais caiu de 8 para 5 e de 13 para 10, respectivamente.

Já na Lapa, na zona oeste, são 18 agentes (eram 25 em 2013). Segundo dados da Fundação Seade, a taxa de desocupação cresceu de 13,2% para 15,3% no segundo trimestre deste ano.

O resultado se vê nas ruas próximas ao mercado municipal. Dezenas de novos ambulantes vendendo, em sua maioria, máscaras contra o coronavírus.

Inexperientes, alguns não conseguem correr dos fiscais e têm a mercadoria apreendida. Ali, diferentemente de bairros afastados, a fiscalização segue intensa, segundo relato dos ambulantes. Há fases, afirmam, em que o “rapa” (a ação dos fiscais) ocorre duas a três vezes ao dia.

“Quem não tem permissão soma prejuízo. Mesmo para a gente, que tem o TPU (Termo de Permissão de Uso), e pode trabalhar, o movimento caiu demais”, diz a vendedora de bijuterias Michele dos Santos, de 34 anos.

Para o coordenador do Laboratório Arq.futuro de Cidades do Insper, Tomas Alvim, a queda nos indicadores de fiscalização preocupa, pois essa é a forma mais direta do combate às irregularidades urbanas. “E o que preocupa ainda mais é verificar que a dinâmica recorrente de abandono dos bairros de maior vulnerabilidade social neste caso também se aplica. Repetimos aqui, historicamente, a priorização da fiscalização das áreas mais favorecidas.”

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.