Crônica de uma morte anunciada, o desaparecimento dos cookies está previsto para o fim do ano que vem. Como ninguém morre de véspera, a história pode ter outro desfecho. Quando o Google decretou que eles deixariam de existir, em janeiro de 2020, a gigante de buscas se referia aos de terceiros. Até porque essas linhas de programação colocadas no código-fonte de um website para armazenar dados de cada usuário são decisivas para a publicidade digital, que movimentará US$ 565 bilhões este ano, de acordo com o Statista.

Jamie Seltzer é diretora Global de MarTech e Estratégia de Dados da Havas, um dos maiores grupos de mídia e publicidade do mundo. Ela afirmou à DINHEIRO que os cookies se tornaram a base do marketing digital há muito tempo e são utilizados em todo tipo de ação, de mensuramento a retargeting — quando aquele produto que você acabou de ver em um site aparece como publicidade em outro. “É algo que se tornou confortável para nós profissionais de marketing”, disse. “Passamos pouco tempo pensando em como continuar ‘conversando’ com nossos consumidores.” Em outras palavras, a primeira transformação será no escopo do profissional do segmento, que será forçado a ser mais criativo.

As discussões no mundo do marketing hoje giram em torno das próximas tecnologias para fazer o que eles fazem. O substituto não deve ser uma coisa só. “Devem aparecer novas formas de fazer o que eles fazem, com outras variáveis”, afirmou. “Estamos em um momento de reflexão sobre que tipo de relacionamentos queremos ter com nossos clientes e como queremos interagir com eles.”

JAMIE SELTZER Diretora global da Havas diz que mudanças vão transformar também o perfil
do profissional de marketing. (Crédito:Derrick Troyer )

Mas se o cookie é tão decisivo, a pergunta é por que os grandes navegadores estão eliminando essa ferramenta. E a resposta é a privacidade. Com os cookies, players de todos os segmentos e tamanhos armazenam seus dados numa quantidade brutal — e ‘descobrem’ suas necessidades e desejos em termos de produtos e serviços para oferecer anúncios de hotéis depois de você fazer busca por voos. Com leis de proteção de dados se espalhando pelo mundo, como a brasileira LGPD, e suas pesadas multas, armazenar esses dados se tornou uma exposição significativa para as empresas.

“Na época em que os cookies surgiram, a discussão sobre privacidade era pequena ou inexistente”, disse Jamie. Hoje, vazamentos de dados preocupam o usuário final. Pesquisa do aplicativo DFNDR Security com 8,6 mil brasileiros, de novembro passado, mostra que três pessoas a cada cinco têm medo de que seus dados sejam vazados ao fazer transações no universo digital.

US$ 565 bi tamanho do mercado de publicidade digital em 2022

Sem os cookies, crescem soluções como as de contextual advertising (utilização do conteúdo de um website para veicular uma propaganda correspondente), que estão ficando cada vez melhores com o uso de inteligência artificial e machine learning. Jamie diz que os clientes da Havas estão em uma fase de teste de diferentes táticas, para ver o que funciona e o que não. Na essência, o que o novo consumidor deseja é um papel mais destacado das marcas. Relatório de 2021 da Havas diz 75% das marcas poderiam desaparecer que ninguém iria dar a mínima — 71% acreditam que as empresas não cumprirão suas promessas e apenas 34% dizem que elas são transparentes e comprometidas com o que dizem. Perto desse desafio, o fim dos cookies não é nada.