O Ministério Público (MP), a Defensoria Pública e o Tribunal de Contas do Estado (TCE) do Amazonas questionaram o governo do Estado sobre o número de doses da Coronavac recebidas, o rateio entre as cidades e a lista de profissionais de saúde imunizados. A vacinação do filho de um deputado estadual e de duas irmãs filhas de um empresário local, todos médicos recém-formados, motivou críticas nesta quarta-feira, 20.

Na noite desta terça, 19, David Dallas e as gêmeas Gabrielle e Isabelle Kirk Lins publicaram fotos nas redes sociais do momento em que recebiam as doses da vacina. O jovem é filho do deputado estadual Wanderley Dallas (Solidariedade). Elas, de 24 anos, são filhas dos donos da universidade e hospital Nilton Lins, alugado pelo governo para funcionar como hospital de campanha. Os três não vinham atuando na linha de frente de combate à covid-19.

+ Vacinas para grupo prioritário chegam a aldeia indígena em Maricá

Só Isabelle teve sua nomeação publicada no Diário Oficial do Município um dia antes da vacinação. Os outros dois tiveram a nomeação publicada no dia seguinte. Eles não ocupam cargos de médicos, mas de gerentes de projetos – com salários de cerca de R$ 15 mil. O Estadão procurou os três, mas não conseguiu contato.

A prefeitura respondeu apenas que as duas jovens foram vacinadas por serem funcionárias, mas não respondeu por que uma delas só foi nomeada depois. Também não explicou o caso de Dallas. O prefeito de Manaus, David Almeida (Avante), publicou ontem em suas redes sociais que baixaria uma portaria proibindo as pessoas de postarem fotos nas redes sociais após serem vacinadas.

Questionamentos

Defensoria, MP e TCE cobram o Estado sobre o total de doses distribuídas entre os municípios. Consta no site do Ministério da Saúde que chegariam para Manaus 101 mil doses de vacina e só chegaram 40 mil. Segundo o ofício enviado ao governo pelos órgãos de controle, outros municípios também receberam menos, como Parintins, que iria receber 4.974 doses, mas recebeu pouco mais de mil esta semana.

“Não há transparência alguma nos dados, estamos enviando ofícios sobre essa falta de informações ao governo do Estado desde a primeira fase da pandemia”, afirmou defensor público do Estado, Rafael Barbosa.

A Defensoria pediu ajuda aos coordenadores do Atlas Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), da Universidade Federal do Amazonas. O grupo cruzou dados de vacinas recebidas com o previsto pelo plano estadual de imunização. “Alguns municípios, como Amaturá, receberam 173% da quantidade de vacinas para a 1ª fase. O governo diz que é para vacinar as duas fases, para facilitar a logística com municípios muito longínquos, mas se fosse assim, seria 200% do total. Os números não batem”, diz Danilo Egle, coordenador técnico do ODS.

Membro do Conselho Regional de Enfermagem, Cleide Martins disse que houve hospitais onde, além dos profissionais de saúde, foram vacinados outros setores, como a direção dos hospitais e outros funcionários. Já o presidente do Sindicato dos Médicos, Mário Vianna, cobrou a vacinação de todos os profissionais de saúde. “Se continuarem a adoecer no nível que estão adoecendo, vai faltar oxigênio e profissionais de saúde.”

Sobre os questionamentos feitos pelo TCE, o governo amazonense informou que vai prestar todas as informações requisitadas pelo tribunal.

Omissão do AM em crise do oxigênio

O Ministério Público Federal instaurou inquérito civil para investigar possível ato de improbidade administrativa do governo do Amazonas diante da falta de oxigênio na capital e no interior. A apuração busca entender se a administração estadual foi avisada do iminente colapso com uma semana de antecedência. “Autoridades locais sabiam da possibilidade da falta de oxigênio”, disse o procurador Igor Spindola, que está a frente das ações do Ministério Público Federal (MPF) no combate à pandemia no Amazonas.

A investigação solicitou informações ao Ministério da Saúde e ao Ministério da Defesa sobre as medidas adotadas diante de informações prévias sobre a provável crise de desabastecimento de oxigênio no Amazonas e também pediu informações e documentos do governo do Amazonas e da empresa White Martins sobre os alertas oficialmente feitos às autoridades competentes da perspectiva de falta de oxigênio.

Foi constatado que dois aviões da FAB que traziam cilindros de oxigênio de fora do Estado já há uma semana, por conta do aumento da demanda, não fizeram a rota nos dias 13 e 14 de janeiro. Na noite do dia 14, começaram as denúncias de mortes por falta de oxigênio nos hospitais da capital.

Em nota, a Secretaria de Estado da Saúde (Susam) disse que o governo está “empreendendo todos os esforços, com auxílio do governo federal, para equacionar as dificuldades encontradas na logística de abastecimento de oxigênio nas unidades de saúde da rede pública de saúde da capital e interior”. A nota destaca que os sistemas de saúde dos municípios de Coari, Parintins e Tefé são independentes, sendo gestão plena das prefeituras municipais, mas o Estado auxilia a administração local.

O Estadão mostrou semana passada que, ao menos desde o dia 23 de novembro, o governo do Amazonas sabia que a quantidade de oxigênio hospitalar disponível seria insuficiente para atender a alta demanda. A informação consta de projeto básico, que foi elaborado pela própria pasta, para a última compra extra do insumo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.