A DISPARADA DO DÓLAR PROVOCOU UMA REVIRAVOLTA no setor do turismo. Segundo dados divulgados na semana passada pelo Banco Central, um grande número de brasileiros desistiu de viajar ao Exterior. Em outubro, a queda nas despesas internacionais foi de 31% em relação ao mês de setembro. Trata-se da freada mais brusca em duas décadas. Numa primeira análise, o número parece revelar uma tragédia. Afinal, significa que, amedrontadas pela crise financeira global, as pessoas deixaram de gastar com viagens e de desfrutar de merecidas férias. Não é bem assim.

Boa parte do dinheiro que seria gasto lá fora vai ficar por aqui ? não necessariamente guardado no bolso. De acordo com a Associação Brasileira de Agências de Viagem (Abav), muitos clientes trocaram viagens ao Exterior por um destino no Brasil. Dados preliminares indicam que a venda de pacotes nacionais cresceu 20% em outubro de 2008 ante o mesmo período do ano passado. ?A instabilidade do dólar faz com que as pessoas fiquem inseguras para fechar uma viagem internacional?, afirma Leonel Rossi Júnior, diretor de assuntos internacionais da Abav. É justamente nesse espaço que entra o turismo doméstico.

Os executivos do resort baiano Costa do Sauípe, um dos hotéis mais badalados do Brasil, aguardam a alta estação com ansiedade idêntica à de um turista em véspera de viagem. ?Deveremos ter o melhor verão desde que o Sauípe foi inaugurado, em 2001?, afirma Alexandre Zubaran, presidente da Resorts Brasil e do Costa do Sauípe Resort. ?Projeções indicam que o faturamento da alta estação será 25% superior ao registrado no mesmo período do ano passado.? É um resultado excepcional, considerando as dificuldades financeiras enfrentadas pelo resort desde 2006. Zubaran esclarece a questão. A partir de 2005, o dólar entrou numa curva descendente. Como resultado, o número de brasileiros que viajam ao Exterior praticamente dobrou. Na hotelaria nacional, o efeito foi perverso. Para muitos brasileiros, era preferível gastar dinheiro, digamos, com uma viagem para Nova York do que desfrutar das paisagens nacionais. Com isso, os hotéis instalados no Brasil esvaziaram, pois a demanda internacional não é suficiente para supri-los. Na seqüência, vieram as perdas financeiras. A partir de outubro de 2008, mês em que a crise financeira mundial eclodiu, houve uma inversão desse processo. O dólar caro deu fôlego extra ao turismo doméstico.

Ao contrário dos grupos hoteleiros, as agências de viagens não sentem tanto as oscilações cambiais. Se o dólar está barato, elas inflam seus pacotes estrangeiros. Quando a moeda americana dispara, é a vez das rotas internas. A CVC, maior agência de viagens do Brasil, começou a operar neste mês 140 vôos semanais fretados para destinos nacionais. No mesmo período do ano passado, com o dólar mais barato, foram 120. ?Nossa expectativa é aumentar em 30% a venda de pacotes nacionais?, diz Valter Patriani, presidente da CVC.

Segundo ele, os roteiros nordestinos ocupam o topo da preferência dos clientes. Entre os destinos mais procurados estão Porto Seguro, Natal, Maceió, Fortaleza e Porto de Galinhas. A Infraero confirma as indicações da CVC. Nos dez primeiros meses do ano, o movimento nos aeroportos do Nordeste chegou a 15,8 milhões de pessoas. O volume é 3% maior que o do mesmo período de 2007 e representa um acréscimo de 500 mil passageiros. Fora do Nordeste, a cidade preferida dos viajantes brasileiros é o Rio de Janeiro. Curiosamente, a CVC espera obter, com os pacotes internacionais, o mesmo crescimento registrado pelos roteiros internos. A mágica? ?Em razão da queda do petróleo, os clientes encontram na CVC alguns produtos internacionais com descontos, na forma de um câmbio mais atrativo que o operado no mercado?, diz Patriani. ?Para produtos como o Caribe, trabalhamos com um câmbio de R$ 1,99.? A estratégia, assegura o executivo, tem sido bem-sucedida. O real desvalorizado também torna mais favorável a vinda de estrangeiros ao Brasil. Segundo projeções, até o final de 2008 mais de cinco milhões de estrangeiros terão visitado o País, gerando receitas de US$ 5,7 bilhões. É o maior valor da história.

O número de estrangeiros que visitam o Brasil poderia ser muito maior. O País recebe um quarto dos turistas que vão ao México, nação que tem características semelhantes, e muito menos que os que visitam a África do Sul cujo forte também é a vida selvagem. Sempre que se discute o tímido desempenho do turismo no Brasil, surge a pergunta inevitável: se o País tem um imenso potencial, por que razão recebe um número tão pequeno de visitantes estrangeiros? Afinal de contas, belezas naturais não faltam por aqui. O Brasil abriga 22% da flora, 10% dos anfíbios e mamíferos e 17% das aves do mundo. Cerca de 40% do território nacional é ocupado por uma floresta praticamente intocada e, se o turista está em busca de sol, a costa brasileira é generosa com seus oito mil quilômetros e 2.045 praias. De acordo com a Embratur, existem mais de 300 roteiros com potencial para exploração turística. É hora, portanto, de conhecê- los.