Os ?robôs? da linha de montagem do Citroën Xsara Picasso 2.0, em Porto Real, no Rio de Janeiro, têm nome, endereço e time de futebol. Robson Maurício Carvalho do Rosário, por exemplo, é vizinho da fábrica e torce pelo Flamengo. Desde o mês passado, ele e mais 45 homens montam artesanalmente os primeiros carros da fábrica brasileira da PSA Peugeot Citroën, um investimento de US$ 600 milhões, metade bancado pelo BNDES e o restante pago pelo governo do Estado e o grupo francês. Ao lado da linha de produção do Picasso está sendo montado o Peugeot 206 1.0, este sim, com a presença de 10 robôs. A opção dos franceses de andar na contramão do setor e não investir pesado na baixa automação tem explicações operacionais e financeiras. Um robô da unidade de Porto Real custa em torno de US$ 150 mil. O salário médio de um operário é de R$ 770. ?O preço do equipamento e mais a manutenção elevariam o custo?, afirma François Sigot, diretor de produção da fábrica. Outra vantagem de utilizar Robson e não uma máquina é a possibilidade de aumentar ou reduzir a produção sem grandes investimentos. Se a demanda for alta, contrata-se mais operários. ?É uma estrutura mais flexível?, contabiliza Lúcio Shimoyama, gerente da área de solda.

O sistema da qual Shimoyama faz parte é uma mistura do jeito japonês de produção enxuta com o molho latino. A parte oriental da unidade está na organização hierárquica. A fábrica tem três níveis de chefia: direção, gerência e as Unidades Estratégicas de Produção (UEP). Para definir uma UEP, o diretor de produção apela para uma paixão nacional, o futebol. As unidades são formadas por um grupo de jogadores (operários), um capitão (assistente de produção) e um treinador (chefe). O objetivo, como no futebol, é fazer gol, ou melhor, Peugeot e Citröen. A meta da montadora é produzir, por hora, cinco unidades do Picasso e 13 do 206, chegando a 25 mil carros até o final do ano. Em 2001, a programação é de 45 mil unidades, chegando a 70 mil em 2002.

O tal molho latino é um conceito menos palpável. ?É a confiança que damos aos homens de gerenciamento para assegurar a qualidade?, disse. Traduzindo: a direção da montadora espera opinião de todos para melhorar qualidade. O engenheiro paulista Almir Freri, que controla as UEPs do setor de solda, é parte desse molho. Há pouco tempo conseguiu mudar um item na produção do Picasso. ?Mostrei o problema, apresentei a solução e a aceitação foi imediata?, elogia o palmeirense. Freire foi um dos primeiros a ser contratado pela Peugeot Citroën. Em 98, deixou mulher e três filhos em São José dos Campos (SP) para cuidar de operários em Porto Real. Trouxe apenas o Gol da rival Volkswagen, roupas e uma experiência de 19 anos em produção industrial. A mudança tem ares definitivos. O engenheiro já comprou um terreno em Porto Real para construir sua casa.

Assim como Freri, o soldador flamenguista Robson antes de ser contratado pelos franceses também trabalhava no setor automotivo. Ele era mecânico em uma concessionária. Como a maioria dos operários, ele foi aluno do Centro Automotivo Senai – Peugeot Citroën. Hoje, como operário especializado, sonha em ter um carro. A escolha está feita e para admirar seu objeto de desejo ele precisa apenas virar o pescoço em direção à linha de montagem do 206. Perto do sonho, mas bem longe do seu bolso, a compra do 206 vai exigir de Robson uma boa poupança. O preço ainda é segredo mas já se comenta que a versão mais barata do carro deverá custar uns R$ 17 mil. ?Ainda terei um Peugeot?, suspira o rubro-negro.