O presidente dos EUA, Donald Trump, está sendo duramente criticado por ex-combatentes do Exército americano por ter “abandonado” os curdos, aliados de Washington, ao retirar suas tropas do norte da Síria, perto da fronteira com a Turquia, abrindo caminho para uma ofensiva de Ancara.

Na quarta-feira (9), a Turquia lançou sua ofensiva, apenas algumas horas depois de Trump anunciar que os “50 soldados” americanos afetados “saíram” da região, deixando os curdos expostos. Eles são considerados uma ameaça terrorista por Ancara.

O ex-chefe das forças americanas no Oriente Médio, general Joseph Votel, acusou o presidente americano de abandonar estes aliados, núcleo duro das Forças Democráticas Sírias (FDS). Este movimento foi crucial na luta contra o grupo Estado Islâmico (EI).

“Esta política de abandono ameaça desfazer cinco anos de combate contra o EI e atentará seriamente contra a credibilidade e a confiabilidade dos americanos em todas as batalhas futuras, nas quais precisaremos de aliados fortes”, escreve o general na revista “The Atlantic”.

“As FDS libertaram milhares de quilômetros quadrados e milhões de pessoas das garras do EI. Durante os combates, registraram 11.000 vítimas”, lembrou, na mesma revista.

Em comparação – apontou Votel, reformado este ano -, apenas seis soldados e dois membros do pessoal civil americano perderam a vida.

– Desastre –

Há tempos, Donald Trump afirma que quer pôr fim ao envolvimento dos Estados Unidos na Síria. Ele também defende que seu país não pode fazer nada contra o ódio entre turcos e curdos.

Ontem, o presidente americano sugeriu que já ajudou os curdos o suficiente ao gastar “quantias consideráveis”, sobretudo, no fornecimento de armas. “Dito isso, amamos os curdos”, completou.

A despeito dos argumentos do presidente, o ex-comandante das forças terrestres americanas na Europa Mark Hertling apontou que a decisão de Donald Trump faz “antever um desastre futuro para os Estados Unidos”.

“Os curdos das FDS – nossos ex-aliados de confiança na luta contra o EI – estão sendo atacados por um aliado da Otan, a Turquia”, tuitou, acrescentando que “as repercussões para os Estados Unidos e a Otan serão duradouras e irão em detrimento da segurança da Europa e do mundo”.

Segundo autoridades do Pentágono, os curdos estavam mais bem treinados do que os soldados turcos, ou iraquianos, por exemplo, ao longo das campanhas para recuperar cidades importantes das mãos do EI.

“Quando o Exército iraquiano afundou, foram os curdos que fizeram frente ao ataque do EI contra nossa civilização, não nós, nem os turcos”, lembrou o congressista democrata Ruben Gallego, ex-combatente no Iraque.

“Abandonar os curdos é outra clara lembrança de que ‘América Primeiro’ significa ‘América sozinha'”, tuitou, referindo-se ao principal slogan de campanha de Trump.

“Fora Israel, nosso aliado mais forte e mais importante no Oriente Médio foram os curdos… E escolhemos perder isso”, lamentou, destacando que os Estados Unidos não poderão mais continuar supondo um certo grau de confiança por parte de seus aliados.

– Interesses americanos –

A senadora republicana Martha Mcally, ex-pilota da Força Aérea que foi seis vezes mobilizada no Oriente Médio, considerou que a decisão de deixar a via livre para a Turquia é simplista e bastante “ruim”.

“As FDS, nossos aliados curdos, foram os que pagaram o preço mais alto”, declarou à Fox Radio. “Foram eles que derrubaram o califado (do EI)”, completou.

Alguns membros do Exército americano apoiam, porém, a vontade do presidente de retirar os soldados de conflitos intermináveis.

Segundo Dan Caldwell, do grupo de pressão Concerned Veterans for America, Trump quer apenas defender os interesses dos Estados Unidos.

“Não nos interessa nos vermos em meio a um velho conflito entre a Turquia e os curdos da Síria, que é anterior ao surgimento do EI e à guerra civil na Síria”, declarou à AFP.