Em entrevista coletiva na manhã desta terça-feira, 26, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Roberto Barroso, falou pela primeira vez à imprensa após assumir o cargo de presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O ministro tomou posse nesta segunda, 25, em cerimônia virtual, e cumprirá mandato até fevereiro de 2022.

Apesar da animosidade do governo em relação ao Supremo Tribunal Federal, escancarada após a divulgação do vídeo na reunião ministerial de 22 de abril, o ministro disse não acreditar que estejamos diante de um momento de instabilidade institucional.

Barroso, no entanto, defendeu atenção em relação às manifestações anti-democráticas em escalada no país e lembrou o ato contra o Congresso e o STF em frente ao Quartel General do Exército, em Brasília, no dia 19 de abril. Para o ministro, a manifestação, que contou com presença do presidente Jair Bolsonaro, acendeu ‘sinal de alerta’.

“Evitar a contaminação das Forças Armadas no varejo da política é uma missão de todos os democratas. O fato de haver militares no governo não faz do governo um governo das Forças Armadas, porque as Forças Amadas não pertencem a governo. E quem quer que seja das Forças Armadas e esteja no governo desempenha uma função civil”, disse o ministro em recado à parcela de apoiadores bolsonaristas que defende a volta do AI-5, medida do governo militar durante a ditadura responsável pelo fechamento do Congresso e por limitações aos direitos individuais.

Os ataques ao Supremo partiram também da cúpula governista. Na reunião ministerial de 22 de abril, cuja gravação foi tornada pública no âmbito do inquérito que corre no Supremo para apurar se houve tentativa de interferência política de Bolsonaro na Polícia Federal, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, chama os integrantes da Corte de ‘vagabundos’ e pede sua prisão.

Na segunda, 23, o ministro Celso de Mello, encaminhou para os colegas da Corte a cópia do inquérito e deixou a cargo dos ministros as medidas que ‘que julgarem pertinentes’ em relação à declaração. O decano do STF já havia apontado ‘aparente prática criminosa’ na conduta de Weintraub durante a reunião. O ex-advogado geral da União, André Mendonça, busca uma interlocução com os ministros do Supremo para evitar uma judicialização das declarações do ministro.

“Do ponto de vista institucional, eu considero mais grave que o ataque ao Supremo, o país que não tem projeto para a educação”, disparou o ministro em retribuição aos ataques do ministro Abraham Weintraub.

Perguntado sobre ações que pedem a cassação dos mandatos do presidente Jair Bolsonaro e do vice, Hamilton Mourão, Barroso afirmou que deve pautar os pedidos nas próximas semanas. “Hoje terei uma reunião com os ministros, uma reunião preparatória, mas a regra geral é seguirmos a ordem cronológica dos pedidos de liberação pelos relatores. Uma que já teve início, por um pedido de vista do ministro Luiz Edson Fachin, provavelmente nas próximas semanas, uma, duas, três, essa ação deve estar voltando”, informou.

Apresentadas por Marina Silva (Rede) e Guilherme Boulos (PSOL) após o episódio de invasão de um grupo de mulheres no Facebook que eram contrárias à candidatura bolsonarista ao Planalto, as ações pedem a cassação dos registros de candidatura, dos diplomas ou dos mandatos da chapa vitoriosa nas eleições de 2018, além da declaração de inelegibilidade.

Eleições 2020

Barroso voltou a defender, como no discurso de posse, o mínimo adiamento das eleições diante da epidemia de Covi-19 no país. “Eu acho que o limite será as autoridades sanitárias relevantes, nos dizerem, ao TSE e ao Congresso, que há um risco grave à saúde da população. Se for inevitável a prorrogação, que ela se dê também pelo prazo mínimo”.

Para o ministro, prorrogar os mandatos vigentes esbarra em um impasse constitucional e democrático. “O mandato desses vereadores e prefeitos é um mandato de quatro anos. Não há como, legitimamente, você prorrogar eleições sem um motivo de força maior. A periodicidade das eleições e a possibilidade de alternância do poder são fundamentais para a democracia”, declarou.

A posição de Barroso endossa o projeto estudado no Congresso Nacional, que prevê adiar o primeiro turno deste ano para 15 de novembro ou 6 de dezembro, de modo a permitir que o pleito ocorra com segurança, sem riscos relacionados à pandemia, mas evitar que os atuais mandatos de prefeitos e vereadores sejam prorrogados.

O ministro também afirmou que não cabe ao TSE o protagonismo no combate à disseminação de notícias falsas nas eleições. “O protagonista do combate às fake news precisará ser as plataformas tecnológicas, com participação da imprensa, das empresas de checagem de fatos, e da própria população. O papel do TSE é meramente subsidiário”, disse.

Ele admitiu, no entanto, que o Tribunal Superior Eleitoral poderá solicitar o compartilhamento de informações do chamado ‘inquérito das fake news’, que corre em sigilo no STF para apurar ofensas, ameaças e notícias falsas contra os ministros da Corte e seus familiares.

Barroso também adiantou que sua gestão à frente do Tribunal Superior Eleitoral, em sucessão à ministra Rosa Weber, buscará aprimorar o sistema de prestação de contas eleitorais. O ministro afirmou que a equipe já está discutindo propostas para levar ao Congresso. Entre elas, um modelo semelhante ao imposto de renda, cuja avaliação das contas é feita por programas de inteligência artificial. Independente do mecanismo escolhido, a mudança abrangerá a prestação de contas de partidos, candidatos e dos fundos partidário e eleitoral, segundo o ministro.