O ano de 2017 foi brilhante para os fundos multimercados. Segundo a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), no ano passado, as aplicações dessa categoria superaram os resgates em R$ 101 bilhões. A entrada de dinheiro novo cresceu 414% em relação a 2016. Esse movimento é fácil de explicar. Os juros de mercado caíram de 14% para 6,75% ao ano, o que reduziu o ganho dos fundos de renda fixa. Muitos investidores optaram por diversificar, de modo a manter a rentabilidade de 2016. A estratégia compensou: no ano passado, os fundos multimercados renderam, em média, 12,04%, ante 9,55% de ganho das carteiras de renda fixa. “O investidor de renda fixa estava acostumado a receber 1% de rendimento ao mês.

Com o recuo dos juros, esse percentual caiu, e é natural buscar melhores desempenhos”, diz Julio Fernandes, gestor do fundo multimercado XP Gestão Macro FIM. A promessa dessas carteiras é tentadora. Podendo correr mais riscos com o uso de derivativos financeiros, e também sendo autorizados a distribuir os recursos em várias classes de ativos, os gestores têm mais campo de ação, e os resultados podem superar os da renda fixa. Essa promessa, porém, não é gratuita. As taxas de administração são, em média, de 2% ao ano, o dobro do percentual cobrado de quem aplica em fundos mais conservadores. A questão de vários bilhões de reais, porém, é: nos últimos tempos, tem compensado correr mais riscos e pagar mais caro?

Por enquanto, a resposta tem sido sim. Nos 12 meses findos em janeiro deste ano, a diferença de rentabilidades se acentuou. Os multimercados renderam 12,01%, ante 9,14% dos fundos de renda fixa, segundo dados do sistema de informações financeiras Economatica. A diferença tende a continuar se ampliando pela manutenção dos juros baixos. Porém, é preciso tomar cuidado para escapar das armadilhas. Além da taxa de administração mais elevada, os gestores costumam ficar com uma fatia do ganho. Esse percentual cobrado a mais, denominado taxa de performance, em geral é de 20% do que superar a variação dos juros de mercado medidos pelo CDI.

Luis Stuhlberger, gestor do fundo Verde: desempenho abaixo da média do mercado em 2017 e expectativas ruins para a economia após a eleição (Crédito:Silvia Costanti/Valor/Folhapress)

Outra armadilha é que esses fundos tornam o investidor mais dependente da capacidade de quem administra o dinheiro. Ao contrário dos fundos de renda fixa, bastante uniformes, os multimercados são uma turma variada. Assim, é preciso saber diferenciar quem apresenta um bom desempenho e quem fica pelo caminho. Os gestores correm mais riscos, e eventos extraordinários podem fazer evaporar meses de ganhos em apenas um pregão. Basta comparar o impacto de duas notícias políticas. Em 18 de maio do ano passado, a Bolsa caiu mais de 10% e teve as operações suspensas, procedimento chamado de circuit breaker.

A causa do susto foi a divulgação da gravação de uma conversa entre o empresário Joesley Batista e o presidente Michel Temer, na qual Batista falou sobre o pagamento de propinas. O fato gerou dúvidas no mercado quanto à capacidade de Temer aprovar as reformas econômicas, ou mesmo se manter no cargo. Pouco mais de nove meses depois, a condenação, em segunda instância, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por corrupção, levou o Ibovespa ao maior patamar da história. Confiantes de que o afastamento de Lula da urna abre caminho para a vitória de um candidato mais afinado com as reformas, os investidores foram às compras, o que contribuiu para a alta de 11,1% do principal índice da Bolsa em janeiro. Os multimercados cravaram uma rentabilidade média de 1,63% em janeiro, o que os gestores apontam como um movimento atípico.

Nesse universo mais volátil, a estratégia mais ou menos arriscada do gestor faz toda a diferença. Nos últimos tempos, a melhora da economia fez os gestores elevarem a aposta nas ações. “Quando começamos a vislumbrar a recuperação da economia, em meados de 2016, aumentamos as posições no Ibovespa”, diz Fernandes, da XP. O fundo que administra, o XP Gestão Macro FIM, rendeu 1,71% em janeiro e 13,21% em 12 meses, acima da média do período. Já Luis Stuhlberger, gestor de um dos mais tradicionais multimercados do País, o Verde CSHG FIC FIM, tem uma história diferente para contar. Nos últimos 12 meses, o fundo rendeu 7,49%, pouco mais da metade da média obtida por seus pares. Na direção contrária do mercado, Stuhlberger diz prever tropeços na economia, independente do resultado da eleição. “Será impossível cumprir a meta para o teto de gastos já a partir de 2020”, disse ele durante um evento na terça-feira 30, em São Paulo.

Tanto o Verde quanto o XP Gestão são fundos multimercados da categoria Macro. Suas estratégias se baseiam nos fundamentos da economia, que norteiam os gestores na definição do percentual de alocação de cada tipo de investimento. “Geralmente, os recursos dos fundos (macroeconômicos) são divididos em entre juros, câmbio e bolsa. Sem a necessidade de concentração”, diz Gabriel Lopes, responsável da área de fundos da distribuidora independente Andbank. “A diferença de rentabilidade é reflexo dos posicionamentos do gestor. Se o rendimento está abaixo da média, mostra que ele não está acertando a posição”, diz ele. Lopes recomenda que o investidor compare o desempenho de um fundo por pelo menos 48 meses com os seus concorrentes diretos para avaliar o trabalho do gestor. No entanto, vale destacar um dos conselhos mais recorrentes dos especialistas. “A rentabilidade antiga não é, sob nenhum hipótese, garantia de ganhos futuros”, diz Sandra Blanco, consultora de investimentos da Órama.