Ainda há lugar para loucuras de amor? A psicóloga Camila Luz, de 34 anos, provavelmente diria que não se tivesse de responder a essa pergunta antes de 2014. Foi nesse ano que decidiu trocar de cidade, trabalho e estilo de vida para se casar com o grafiteiro André Mogle, de 32 anos. Tudo isso após exatos quatro dias de namoro – e alguns mais de conversas à distância.

Camila contou a sua história durante um evento conjunto de dois projetos de São Paulo que promovem a conversa no espaço público: o Senta Aqui. Conversa Comigo, coordenado pelas psicólogas Patricia Martins, de 46 anos, e Carla Pilon, de 58 anos, e o Tinder no Divã, da também psicóloga Ana Clara Cartagena Reis, de 34 anos. Entre a manhã e a tarde de ontem, as iniciativas realizaram a intervenção Senta Aqui, Vamos Falar de Amor!, na Vila Madalena, zona oeste de São Paulo.

A princípio, Camila foi ao evento para ser uma colaboradora, voltando-se mais a mediar as conversas. Mas, ao ouvir outras histórias, percebeu que também deveria compartilhar a sua. “Eu nunca teria saído de Penápolis (no interior de São Paulo). Fiz faculdade em Dourados, em Mato Grosso do Sul, porque tinha medo de ir para a cidade grande, não sabia nem o que era grafite, mas eu precisava encontrar o André de novo”, diz ao se referir ao marido, a quem conheceu durante o réveillon de 2014 no litoral paulista.

O relato que motivou a psicóloga foi de Lindsey Padilha, de 30 anos, que conheceu pelo telefone Jason Rodrigues, de 29 anos. Então funcionária de uma agência de viagens de Porto Alegre, ela atendeu o futuro marido sobre um pacote para a Alemanha. As conversas levaram a uma “empatia natural”, quase um “amor à primeira escuta”, que vai virar casamento em 9 de dezembro. Eles já moram juntos há um ano e meio, mesma época em que abriram uma agência de viagens em São Paulo. Ao saberem do Senta Aqui, Vamos Falar de Amor!, resolveram visitar. “Me chamou a atenção o nome. Sinto falta de eventos com olho no olho”, diz.

Com o Dia dos Namorados e a proximidade do casamento, Lindsey achava estar na hora de passar a relação “a limpo” – e o evento era a oportunidade ideal para isso. “Cada vez que a gente conta é diferente, porque repensamos o que aconteceu. Fazer isso na frente de desconhecidos e a forma com que nos receberam me fez perceber que mais pessoas estão em busca de amor”, comenta.

Em agosto de 2015, Ana Clara Cartagena Reis criou perfis nos aplicativos Tinder e Happn com a foto de um coração partido. No campo da descrição, convidava usuários a falarem sobre relacionamentos. Por um ano, reuniu centenas de relatos sobre o tema, os quais pretendia reunir em um blog e estudar em seu mestrado. “O número de homens héteros que me procuravam era muito menor e envolvia questões mais pontuais, como uma separação recente. Já os homens gays e as mulheres queriam discutir relações como um todo, de forma mais profunda”, compara.

Ela relata que apenas uma vez foi perguntada sobre como reuniria os relatos. “Até estranhava, mas a vontade de falar era tanta que essas pessoas não se preocupavam: sempre deixei claro que não citaria nomes. O aplicativo também dá uma sensação de segurança por conversar com alguém que não está na sua frente”, diz.

No lugar do blog, a psicóloga resolveu levar o projeto para a rua em abril, colocando cadeiras e almofadas em locais de São Paulo, como o Minhocão e a Praça Dom José Gaspar, ambos no centro. Em um quadro, provocava os passantes com a pergunta “Vamos falar de amor?”.

“Acho que só de ler a frase, ela já suscita uma reflexão, mesmo que a pessoa não se aproxime. Todo mundo está precisando parar para pensar sobre amor, mas ninguém faz isso”, argumenta. “Os padrões podem ser cruéis para quem não se encaixa, o que vai do amor romântico até o poliamor. Até brinco que o projeto deveria se chamar Tinder no divã: a busca de um encontro realmente amoroso.”

Senta Aqui

Lançado em novembro, o projeto também ocupa locais públicos, como o Copan e a Avenida Paulista. “Não é terapia. É quase uma conversa de praia. Queremos humanizar a calçada. Crescemos rápido, parece que a cidade demandava isso”, diz a coordenadora Patricia Martins. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.