Quando a pandemia paralisou a economia brasileira, em 2020, muita gente ficou em casa. O executivo Pedro Moro, não. Ele fez questão de pegar o trem. Presidente da Companhia Paulista de Transportes Metropolitanos (CPTM), fez questão de mensurar pessoalmente o impacto do isolamento social nas operações da empresa. Da noite para o dia, a maioria dos mais de 3 milhões de passageiros que eram transportados diariamente (o equivalente à população do Uruguai) sumiu das estações. No primeiro mês de restrições à circulação, em abril daquele ano, o número de passageiros desabou para menos 700 mil por dia, 25% do fluxo normal. Naquele ritmo, as receitas com as vendas de bilhetes, que geravam R$ 1,3 bilhão por ano antes da Covid, não garantiriam nem mesmo R$ 320 milhões aos caixas da empresa. “Fomos tão impactados quanto o setor do turismo e o de entretenimento, enquanto as despesas de operação se mantiveram no patamar de R$ 2,2 bilhões anuais”, disse Moro. “A subvenção do Estado, que historicamente cobre 40% dos custos, sustentou a manutenção dos negócios e dos investimentos.”

Embora hoje a CPTM tenha retomado o patamar de 85% do número de passageiros do período pré-pandemia, o plano é reduzir ao máximo a dependência das receitas tarifárias, segundo Moro. Isso porque com os novos formatos de trabalho (híbrido e home office), a telemedicina, as aulas virtuais, o e-commerce e a digitalização de diversos serviços públicos, espera-se que o patamar pré-pandemia de 3 milhões de pessoas diariamente não retorne tão cedo. “As pessoas, naturalmente, estão se deslocando menos e utilizando todos os serviços digitais a seu favor”, afirmou Moro.

O novo cenário da mobilidade urbana tem moldado também a cartilha de negócios da empresa. Dentro de um plano de investimentos de R$ 5 bilhões até 2027 – cifra equivalente ao valor investido nos últimos cinco anos –, a estatal pretende modernizar suas linhas, reduzir o intervalo entre os trens (dos atuais 4 a 6 minutos para menos de 3 minutos) e diversificar as fontes de faturamento, com foco em publicidade e turismo.

O primeiro passo da estratégia foi dado logo depois do início da pandemia, em 2020. A CPTM assinou um contrato de concessão de exploração de espaços publicitários com a Eletromídia, empresa de propaganda outdoor que pagou R$ 110 milhões para ter exclusividade na comercialização de publicidade em trens e estações, ágio de 630% em relação ao valor previsto no edital, de R$ 15 milhões. A Eletromídia terá exclusividade sobre uso de espaços de mídia nos bloqueios, painéis estáticos, escadas rolantes, passarelas, adesivação dentro e fora dos trens, monitores e painéis digitais, além de novos formatos que poderão ser propostos pela empresa que investirá cerca de R$ 25 milhões na modernização da infraestrutura de mídia.

Durante dez anos, estão previstos R$ 450 milhões a mais para a CPTM. A iniciativa multiplicou por mais de 50 o faturamento com publicidade pela própria empresa, que obteve cerca de R$ 14 milhões por ano entre 2018 e 2019. O espaço para exploração é imenso: a companhia possui 94 estações, 271 km de trilhos (incluindo as duas linhas concedidas neste ano à iniciativa privada) e atende a 22 municípios.

O modelo de terceirização dos espaços publicitários da CPTM replica o modelo adotado pelo Metrô desde 2017. Na época, a companhia também concedeu esse serviço por meio de um pregão eletrônico, vencido pela multinacional francesa JCDecaux. Assim como a Eletromídia, a empresa obteve a concessão para explorar espaços em três linhas do Metrô por dez anos, com uma remuneração mínima de R$ 375 milhões durante a vigência do contrato.

TRENS TURÍSTICOS Outra aposta da CPTM para recuperar as receitas e reduzir a dependência do transporte de massa é o Expresso Turístico, locomotiva retrô que oferece passeios para Mogi da Cruzes, Jundiaí e Paranapiacaba, a pitoresca vila ferroviária inglesa em Santo André. A empresa criou uma divisão de negócios específica para definir o modelo de expansão para o lazer. Hoje, operam duas composições. Até o final do ano, segundo Moro, serão quatro trens restaurados para realizar os passeios. Um vagão restaurante, atualmente desativado em Rio Claro, no interior paulista, será reformado para também oferecer alternativas de refeição e bebidas aos passageiros. Para Moro, a receita que hoje responde por 10% a 12% do faturamento total da companhia deve chegar a 25% dentro de três anos.

Segundo o professor Marcelo Kyoto, especialista em planejamento urbano na Fundação Getulio Vargas (FGV), a CPTM exerce papel fundamental da organização do fluxo de passageiros e de pessoas na Grande São Paulo, já que não existem mais espaços para ampliar o uso de carros nas cidades. “Basta olhar nas ruas para perceber que, quanto mais saudável for o modelo de operação das empresas de transporte público, melhor será o dia a dia da metrópole e da qualidade de vida”, disse.

Para Kyoto, a busca por fontes alternativas de receita da CPTM é essencial para que os investimentos continuem chegando. “Depender menos das subvenções do Estado e expandir suas fontes próprias de receita são o caminho para a empresa se consolidar como um modelo bem-sucedido de gestão estatal”, afirmou o professor. A julgar pelos planos de Pedro Moro na CPTM, é nesse trilho que a empresa seguirá.