O Centro de Contingência para o Coronavírus do governo do Estado de São Paulo informou nesta quinta-feira, 12, que já há transmissão comunitária da doença em território paulista e afirmou que projeta para os próximos meses pelo menos 460 mil infectados pela covid-19 no Estado, contando os casos assintomáticos. Até quinta, São Paulo contabilizava 42 dos 77 registros confirmados da doença no País, segundo dados do Ministério da Saúde.

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O Estado de São Paulo definiu três cenários de números de infecções para que a rede pública se prepare para um aumento de demanda no sistema de saúde. O cenário menos grave estima que 1% dos 46 milhões de habitantes do Estado será contaminado, resultando nas 460 mil pessoas mencionadas acima. Já o cenário mais pessimista projeta 10% dos paulistas infectados, o equivalente a 4,6 milhões de indivíduos.

“No enfrentamento (do surto), o que se objetiva é o tratamento dos doentes graves e trabalhamos com cenários. Eles vão desde 1% da contaminação da população até 5% e 10%. Esses cenários são repassados ao secretário (estadual da Saúde), que demanda aquilo que é preciso: número de leitos, investimento, custeio e recursos humanos. São Paulo tem 46 milhões de habitantes, 60% disso tem atendimento exclusivamente do SUS e, em cima disso, tem todo o planejamento”, disse o infectologista David Uip, coordenador do centro de contingência, responsável por apresentar as estimativas em entrevista coletiva ontem.

Ao explicar as projeções, o infectologista destacou que se trata de cenários desenhados para diferentes situações que podem ocorrer no Estado com a disseminação do vírus. Mas, para o que chamou de “primeira onda” da infecção, a proposta é ter 1,4 mil leitos de UTI extras para receber os pacientes.

Sobre os altos números da projeção, Uip diz que fala de estimativas para todo o período da epidemia. “Não é para hoje nem amanhã, é para os próximos meses. O mundo vai ter novos países e números novos de casos”, disse. Ele destacou que a maioria desses infectados, cerca de 80%, não precisará de atendimento hospitalar pois terá apenas sintomas leves. Os outros 20% precisarão de internação, segundo as estimativas.

Tal proporção de casos (1% a 10%) ainda não foi observada em países que já vivem um surto mais severo, como China e Itália. Mas as estatísticas oficiais geralmente não incluem os casos assintomáticos, cujo diagnóstico é mais raro.

O infectologista disse que as projeções foram feitas por epidemiologistas, considerando tanto dados de pandemias passadas, como a de gripe H1N1, entre 2009 e 2010, quanto a evolução do surto de coronavírus em outros países, além de estudos científicos publicados. Ele não detalhou como os cálculos foram feitos.

O coordenador do centro de contingência destacou que não é possível estimar qual dos três cenários estimados é mais provável porque ainda não se sabe o comportamento do vírus no Brasil. “Cenários são estimativas. Pode acontecer 1%, 2%, 5%, 10%. Tem um fato novo que nós precisamos aprender: como é que esse vírus vai se comportar em um país tropical no verão e entendendo que, daqui a pouco, estaremos no outono. Eu não consigo dizer hoje se vai ser 1% ou 10%”, explicou.

Ele disse que a projeção pode mudar caso nos próximos meses seja descoberto um tratamento para a doença. “No final de abril deveremos ter os primeiros resultados dos medicamentos que estão sendo testados. Se tivermos um bom resultado, esses cenários mudam completamente.”

Transmissão comunitária

Sobre a circulação do vírus no Estado, Uip diz que já é possível afirmar que há transmissão comunitária pelo histórico das pessoas que vêm sendo diagnosticadas. “Já está havendo transmissão comunitária porque pessoas que não viajaram e não tiveram contato com indivíduos sabidamente com coronavírus positivo estão com resultados positivos.” Apesar do cenário preocupante, o governador João Doria (PSDB) afirmou que ainda não há recomendação para cancelamento de eventos públicos.

Limitações

Especialistas ponderam que projeções de cenários sobre o coronavírus têm limitações. “Projeções de médio e longo prazo podem servir como análise de cenário, caso nada seja feito tanto no País quanto fora. Mas tem por base a premissa de que o Brasil seguirá padrão similar ao de outros países, o que não necessariamente é verdade. Fatores sociodemográficos podem afetar a dinâmica de propagação”, diz Marcelo Gomes, pesquisador em saúde pública do Programa de Computação Científica da Fiocruz. Ele e outros especialistas participaram na semana passada de evento na Universidade Estadual Paulista (Unesp) para analisar como esses estudos ajudam a entender a doença.

Os pesquisadores afirmaram na ocasião, e reafirmaram agora, que não é possível ainda fazer projeções específicas da população a ser afetada. Para Gomes, o risco de projeções é tirar o foco de decisões a tomar e há “enorme incerteza associada”. “Projeções de nossos modelos são de que casos continuarão aumentando, principalmente fora da China”, disse a matemática Sara Del Valle, do Laboratório Nacional Los Alamos (EUA). Mudanças no comportamento, diz, “são cruciais para reduzir a carga no sistema de saúde”. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.