Do espetáculo a prática, o governo Bolsonaro precisa o quanto antes, nessas semanas que antecedem a posse, sair da tática de abertura de várias frentes de combate sem soluções pragmáticas para cada uma delas. Desde que despontou vitorioso nas urnas, o futuro mandatário e seu séquito enfronharam-se em discussões variadas, da ideologia nas escolas às restrições externas na área do clima, provocações a países-parceiros, revisão da política indígena e até mesmo no plano da reforma da Previdência, que agora será fatiada, não se sabe ainda bem como. As apostas favoráveis ao capitão reformado tem prazo de validade. Logo nos primeiros meses ele necessita dizer a que veio e construir resultados. O otimismo paira no ar. Mas por enquanto. Analistas falam em crescimento que pode chegar à casa dos 2,5% a 3% do PIB. Seria uma reação classificada como vigorosa, embora dependa, decisivamente, do rumo a tomar. Estados e municípios estão a contabilizar dívidas que precisam de negociação e temas como esse parecem realocados em segundo plano, enquanto declarações mais midiáticas tomam fôlego. Os problemas que exigem saídas imediatas, como a própria onda de desemprego que levou o Brasil a empurrar mais de dois milhões de pessoas para a condição de extrema pobreza, não parecem ainda terem entrado no radar de prioridades.

O czar da Economia, Paulo Guedes, trabalha à toque de caixa para dar forma a um plano de ajuste que incorpore todas essas questões. Ocorre que de cada dez medidas pensadas, nove irão depender diretamente do Congresso. E aí entra o poder de negociação do presidente Bolsonaro & Cia., que será testado ao limite. Não há espaço para improvisos. O crescimento e a distribuição de renda não podem demorar um mandato inteiro para ocorrer.

O ministro chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que nega qualquer possibilidade do toma lá,da cá com os partidos, deu uma declaração equivocada na semana passada falando que Bolsonaro teria quatro anos para implementar o seu modelo de Previdência, em etapas – fatiada, como virou a expressão corrente. Da retórica à realidade, na verdade não se pode esperar nem metade desse tempo para executar a mudança. A bomba fiscal está cobrando seu preço. Os investidores estrangeiros mostram-se diretamente preocupados com esse item e o impacto dele no orçamento público. O maior equívoco na largada é o de desviar a atenção para questões paralelas que, embora gerem repercussão, não trazem benefícios imediatos. O tripé emprego, renda e desenvolvimento está na cabeça dos golden boys de Chicago, mas precisa ser incorporado como alvo prioritário por todo o time, o quanto antes.

(Nota publicada na Edição 1099 da Revista Dinheiro)