A partir dos primeiros minutos do dia 1º de janeiro, os californianos puderam fazer, legalmente, o que vinham fazendo escondido: acender seus cigarros de maconha. No início do ano, a Califórnia tornou-se, ao lado de Alasca, Colorado, Maine, Nevada e Massachusetts, o sexto Estado americano a descriminalizar o uso recreativo da maconha. Pela nova lei, cada californiano pode transportar até 28 gramas, cultivar até seis pés de Cannabis Sativa e fumar seu baseado na rua sem medo. E mais Estados devem fazer isso nos próximos anos.

Enquanto o uso recreativo avança, o uso medicinal, com mais ou menos liberdade, já é permitido em 43 dos 50 Estados. O potencial é gigantesco. O analista americano Anthony Cataldo calcula que existem 259 empresas abertas dedicadas à maconha nos Estados Unidos e no Canadá. Suas ações são negociadas em bolsa, ou em mercados de balcão, que são menos líquidos e menos transparentes. “Em 2017, a maconha medicinal movimentou US$ 6,7 bilhões”, avalia. Já o mercado recreativo legal, hoje estimado em US$ 1 bilhão, pode movimentar US$ 20 bilhões por ano por volta de 2022. Vale a pena investir?

Pode plantar: cultivo legal no Colorado, que autoriza o uso recreativo (Crédito:Divulgação)

Na prática, quem colocou alguns dólares na maconha não viu seu investimento – com o perdão do trocadilho – virar fumaça. A aprovação do uso recreativo pela Califórnia, o Estado mais populoso, com 39,5 milhões de habitantes, animou o mercado. O índice de ações de empresas de maconha mais que dobrou de valor no último trimestre de 2017, subindo 106% (veja o gráfico ao final da reportagem). As empresas cujas ações compõem esse índice são variadas.

Incluem dispensários que distribuem a erva e seus derivados para uso medicinal, produtores de equipamentos para cultivo das plantas e preparação de cigarros, e empresas farmacêuticas. Dessas, uma das mais conhecidas é a AbbVie. Ela produz o Marinol, cujos comprimidos destinam-se a tratar a perda de apetite dos pacientes submetidos à quimioterapia, ou portadores do vírus HIV. Suas ações, negociadas na Bolsa de Nova York, subiram 60,1% em 2017 e, neste ano, avançaram 8,7% até a quarta-feira 17. “A legalização do uso deverá trazer um mercado subterrâneo para a superfície, e isso reduz preços e cria valor”, avalia Cataldo.

Pode vender: loja na Califórnia, Estado que inseriu 39 milhões de pessoas no mercado legal (Crédito:AFP Photo / Robyn Beck)

O mercado, porém, ainda deverá ser bastante sujeito a solavancos. As ações desabaram no início do ano. No dia 4 de janeiro, o índice caiu 21,3% com a decisão de Jeff Sessions, procurador-geral americano, de revogar uma diretriz definida por Barack Obama em 2013. Redigida por James Cole, antecessor de Sessions, e conhecida como “Memorando Cole”, a diretriz instruía as autoridades federais a não perseguir empresas ligadas à maconha em Estados que autorizassem seu uso. O fim dessa aliviada oficial criou um vácuo legal. “O mais provável é que haja uma longa batalha jurídica”, diz o analista americano Roman Chuyan. “Porém, essa decisão estimula uma indústria madura e regulada de maconha.”

Um brasileiro pode, legalmente, investir nisso? Maconha, no Brasil, é algo ilegal. Na Portaria 344, de 1998, o Ministério da Saúde lista como entorpecente o THC, abreviação para tetraidrocanabinol, a molécula psicoativa encontrada na planta. Pela lei, o uso é uma contravenção. A distribuição é crime, em qualquer escala, e mesmo que não traga lucros. No limite, quem dividir um cigarro com um amigo pode ser condenado até a 15 anos de prisão por tráfico.

Isso não afeta o investidor. Segundo Joaquim Rolim Ferraz, sócio do escritório Juveniz Jr. Rolim Ferraz Advogados, o brasileiro que investir em empresas de maconha nos Estados Unidos não comete crime. “Desde que o dinheiro tenha origem lícita e comprovada, tenha sido legalmente enviado ao Exterior e esteja declarado na Receita, não há nenhum problema”, diz ele. A lógica, explica o advogado, é que o investidor estará aplicando seu dinheiro em uma atividade que é legal no local de origem, o que não contraria a lei.