No pior estilo de novela mexicana, a reforma da Previdência Social já tem novos capítulos programados para os primeiros meses de 2018. Os protagonistas deste melodrama fiscal são os 513 deputados federais, que ainda não entenderam que as novas regras das aposentadorias tornam o sistema mais justo, não prejudicam os mais pobres e ainda melhoram o clima econômico. Na quinta-feira 14, enquanto se recuperava de um procedimento urológico, no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, o presidente Michel Temer considerou mais prudente adiar para fevereiro a primeira votação na Câmara dos Deputados, descartando uma tentativa que seria feita dias antes do Natal. Responsável por anunciar o novo cronograma, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse estar confiante na aprovação da reforma. “No dia 19 de fevereiro, a matéria estará pronta para ser votada no plenário da Câmara”, afirmou Maia.

Nas últimas semanas, o governo conquistou apoios importantes de partidos que fecharam questão em torno do tema. Isso, na prática, significa que as bancadas do PMDB, PTB, PPS, PP e PSDB – ou a maioria dos integrantes – votarão “sim” ao texto do relator Arthur Maia (PPS-BA). No caso dos tucanos, a decisão tomada na quarta-feira 13, na reunião da executiva nacional do partido, foi uma vitória do governador Geraldo Alckmin, que assumiu recentemente a presidência da legenda e é o nome mais cotado para disputar a eleição de 2018. “Vamos fazer o convencimento para ter o maior número de votos”, disse Alckmin. “Esse não é o momento de discutirmos punição [de deputado que votar contra].”

Preocupação: o ministro da Fazenda, Herinque Meirelles,vai conversar com as agências de classificação de risco para explicar o adiamento da votação (Crédito:Valter Campanato)

A expectativa do Palácio do Planalto é a de que mais partidos sigam o mesmo caminho à medida que a campanha publicitária do governo esclareça aos brasileiros os benefícios da reforma. Nos próximos dias, o presidente Temer irá, inclusive, participar do programa Silvio Santos, no SBT, para tentar angariar apoio popular às novas regras de aposentadoria. Na terça-feira 12, o peemedebista reuniu dezenas de empresários, em Brasília, num ato a favor da reforma. “Vim aqui pedir aos senhores para ligar para o seu deputado, seu senador, dizer que o setor produtivo precisa disso”, disse Temer, que teve o seu pedido atendido por vários sindicatos patronais.

Cronograma: o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, garante votação em 19 de fevereiro (Crédito:Dida Sampaio)

Para os analistas, o adiamento da votação para 2018, um ano eleitoral, diminuiu as chances de aprovação. Ainda assim, as previsões econômicas para o ano que vem são mais positivas do que as registradas neste ano, com alta estimada de 2,6% para o Produto Interno Bruto (PIB) ante 0,9% em 2017, segundo o Boletim Focus do Banco Central. “Se o governo nos surpreender e conseguir aprovar a reforma, os principais indicadores vão melhorar ainda mais”, diz o professor Rodolfo Olivo, coordenador da graduação da Fundação Instituto de Administração (FIA). “A bolsa sobe, o dólar cai e a confiança aumenta.” Há um consenso entre os especialistas de que o cumprimento do “Teto dos Gastos” é impossível sem a reforma da Previdência, cujo rombo vai superar a casa de R$ 200 bilhões em 2018. Portanto, se o governo Temer não conseguir aprová-la, a bomba cairá no colo do novo presidente. “Nesse caso, ou o próximo governo faz a reforma, ou desfaz a regra do teto”, diz o economista Juan Jensen, sócio da 4E Consultoria. “É claro que desfazer a regra do teto seria um enorme retrocesso.”

Apoio Tucano: o novo presidente do PSDB, Geraldo Alckmin, conseguiu fechar questão no partido a favor da reforma da Previdência

Diante de um rombo total das contas públicas estimado em R$ 159 bilhões neste ano e em 2018, o País correrá o risco de ser novamente rebaixado pelas agências de classificação de risco, caso o governo perca essa batalha (leia os impactos econômicos abaixo). Preocupado com esse quadro, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, vai conversar, nos próximos dias, com as principais agências para explicar o adiamento da votação. “Vamos esclarecer que há uma possibilidade concreta de votar a reforma no ano que vem”, disse Meirelles, na quinta-feira 14. Para aprovar a reforma da Previdência Social, é preciso que três quintos dos deputados (308 parlamentares) e dos senadores (49 parlamentares) votem “sim” nos dois turnos. No Senado Federal, o governo tem uma maioria mais sólida. Já na Câmara dos Deputados, o núcleo político do Palácio do Planalto prefere garantir pelo menos 320 votos antes de colocar o texto em pauta.

Durante o recesso parlamentar, os deputados federais poderão constatar, em visita a suas bases, se a população está compreendendo que as novas regras são essenciais para garantir a sustentabilidade do sistema de aposentadorias. Além disso, terão bastante tempo para ler um estudo do consultor do Senado Pedro Fernando Nery, que desmonta a tese de que os deputados que votam a favor de reformas da Previdência não conseguem mais se eleger. Em 1998, no governo Fernando Henrique Cardoso, a Câmara dos Deputados analisou mudanças nas regras do INSS. Dos 466 votantes, 406 disputaram a reeleição. Entre os que votaram a favor da idade mínima, 69% se elegeram, ante 50% dos que foram contra. Conclusão: não passa de um mito a informação de que o apoio à reforma da Previdência significa a perda de votos na eleição seguinte.