Eric Siegel, autoridade mundial em análise preditiva, fala nesta terça-feira (14) no Latam Retail Show sobre o “jogo de números” que promete mais eficácia aos negócios. Autor do livro Predictive Analytics: The Power to Predict Who Will Click, Buy, Lie, or Die, publicado pela editora Wiley, ele concedeu entrevista à DINHEIRO sobre os desafios explícitos no título da obra (em tradução livre, “Análise preditiva: o poder de prever quem vai clicar, comprar, mentir ou morrer”. Para ele, a pandemia elevou o grau de incerteza sobre o amanhã e acentuou os riscos do mundo dos negócios. Não por acaso, as empresas que conseguiram crescer foram as que olharam para o futuro em busca de oportunidades não descortinadas pela concorrência. “As grandes corporações estão cada vez mais no mesmo patamar porque otimizaram seus processos, o que fez com que os produtos e serviços ficassem similares. Os negócios estão se tornando uma commodity”, afirmou Eric Siegel. “A análise preditiva é a última fronteira para se diferenciar no mercado. O modelo permite aumentar a eficiência e a lucratividade da operação em larga escala”.

Siegel fala nesta terça-feira (14), às 17h45, durante o Latam Retail Show, evento on-line que vai até o dia 16 e reúne grandes varejistas e pensadores para discutir os rumos do mercado na região. Mas não espere da análise preditiva uma solução para todos os problemas. O autor refuta qualquer possibilidade de antecipação de um cenário como o  provocado pela Covid-19. O valor da análise preditiva, segundo Siegel, é avaliar as probabilidades estatísticas de um determinado comportamento individual para aumentar a assertividade das decisões. “Não é necessário que a análise seja precisa, apenas que ela seja melhor do que uma suposição”, disse.

Na campanha presidencial dos EUA em 2012, por exemplo, a equipe do então candidato Barack Obama usou a análise preditiva para identificar os eleitores indecisos que tinham mais chances de responder positivamente à persuasão dos Democratas. Assim, o partido definiu uma estratégia detalhada de como, quando e onde agir para virar o cenário a favor de Obama. Essa eficiência é o valor que a análise preditiva traz para operações nos negócios. Durante a pandemia, a ferramenta foi capaz de detectar quais consumidores tinham mais chances de migrar para plataformas digitais, aqueles que precisariam de mais suporte para uma transação online, quem poderia entrar para o grupo de inadimplentes e até os que reduziriam (ou aumentariam) o tíquete das compras.

Não se trata de vidência, e sim de tendência. Como para fazer uma previsão do tempo, quanto mais dados e mais próximo o horizonte de análise, mais assertiva a previsão. Como esse sistema se alimenta da base de dados para melhorar seu modelo, a análise preditiva está amplificando as discussões sobre regulamentação do uso de dados pessoais. Para Siegel, a solução para esse dilema está ancorada em três pontos: transparência, gerenciamento de expectativas e atualização da operação. “É possível obter benefícios com a análise preditiva mesmo com poucas informações, já que, ainda assim, estamos jogando com as chances a favor da empresa”. O problema é o aumento dessa margem de erro.

Pelo lado dos consumidores, o sistema pode funcionar como um “filtro de spam da vida real”, trabalhando para eliminar a sobrecarga de informação. Em vez de traçar a mesma estratégia para toda a base, com a análise preditiva, as organizações conseguem ranquear clientes pela probabilidade de responder a uma determinada abordagem ou pelo interesse em um produto e, assim, traçar estratégias focando apenas no topo da pirâmide. “As empresas de tecnologia e as nativas digitais têm sido mais consistentes na adoção desse modelo, por já serem orientadas à inovação. Mas a cadeia de manufatura, por exemplo, pode criar um modelo de triagem mais assertivo na detecção das peças que devem passar pela inspeção de qualidade”, disse o especialista.

Eric Siegel
Eric Siegel: “Não é necessário que a análise seja precisa, apenas que ela seja melhor do que uma suposição” (Crédito: divulgação)

Já a concessão de crédito, frente que ganha cada vez mais força entre as grandes varejistas, a operação se expande graças ao aprendizado de máquina e à análise preditiva. A ferramenta é essencial para atender a demanda de forma ágil. Dados do Índice Neurotech de Demanda por Crédito (INDC) apontam que a demanda por crédito no varejo brasileiro em julho teve alta de 34% na comparação com dezembro do ano passado. Pelo perfil dos clientes de crediário no setor varejista – em sua maioria, das classes C e D – o problema do modelo é enviesar a avaliação dos pedidos. Um dos trunfos da análise preditiva é a capacidade de cruzar variáveis que se comportam da mesma forma na base de dados e estão indiretamente relacionadas. Assim, a região em que uma pessoa mora, por exemplo, poderia pesar sobre a indicação do sistema para concessão de crédito. Isso significa que os cálculos tendem a apresentar taxas mais elevadas de “falso positivo” para risco de inadimplência entre grupos menos privilegiados na sociedade.

De acordo com pesquisa do Serasa, apenas 7% dos brasileiros das classes C, D e E usaram crédito durante a pandemia, sendo que 41% das pessoas dessa faixa tiveram o acesso ao crédito negado. Na prática, o modelo acentuaria as desigualdades. Para Siegel, este cenário traz uma boa notícia: ao revelar essa tendência, a análise preditiva faz com que as companhias, especialmente as do varejo, coloquem todas as cartas na mesa. “Assim, as empresas são obrigadas a adotar políticas e implementar mecanicamente medidas para superar esse cenário e alcançar seu consumidor”.