O quadro se agrava a cada dia e o governo faz de conta que não é com ele. Como o Brasil vai ficar diante do iminente colapso do sistema? É a própria ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) quem acaba de prever o esgotamento de praticamente todos os recursos energéticos para novembro próximo. Em outras palavras, tem data estabelecida para um caos paralelo na já combalida economia brasileira. O órgão fala em cenário de degradação dos níveis de armazenamento, especialmente dos subssistemas Sul e Nordeste. O quadro de crise hídrica é gravíssimo, com a rara conjunção de dois fenômenos climáticos de pouca chuva em um mesmo ano. Há a previsão de acontecer uma das maiores interrupções de abastecimento das últimas décadas, sem disponibilidade térmica para atender a demanda atual, conforme aponta a nota técnica da ONS, publicada dias atrás. É rezar para São Pedro, segundo dizem especialistas no assunto. O quadro atual resulta de uma degradação dos níveis de armazenamento combinada a falta de planejamento e investimento federais. O mal está feito e o desastre prenunciado logo ali adiante. No alerta a ONS diz que “o mais realista” é considerar a mínima disponibilidade e preparar o País nesse sentido. Em outras palavras, para não ocorrer desabastecimento, o mais provável será a adoção de algumas medidas de racionamento, algo cada dia mais inevitável. Não há nada oficial, nem previsões, nesse sentido. A habitual demora do governo em tomar providências urgentes — como aconteceu no campo da Saúde — pode ser determinante para o agravamento da situação. Por enquanto, a postura do Ministério das Minas e Energia é a de negar qualquer descontrole e esperar para ver o que pode acontecer. Como fator ainda mais preocupante está o crescente aumento da demanda, por motivos óbvios, como o da gradativa recuperação da economia após um bom tempo de paralisia. Atividades do comércio e serviços, além da manutenção do bom ritmo da produção industrial, estão a exigir consumo de energia justamente no momento da escassez hídrica. De um modo geral, os brasileiros parecem ignorar ou não se dão conta do risco de apagão. Dentro do próprio ministério, técnicos apontam a tendência. O aumento considerável, por exemplo, da compra de carros elétricos é um sinal desse desconhecimento do que pode estar por vir. Nunca se vendeu tantos veículos assim. Apenas em junho último, a Associação Brasileira do Veículo Elétrico contabilizou mais de 3,5 mil veículos eletrificados emplacados, o maior número em um único mês desde o início dos registros em 2012. Para o economista e um dos maiores especialistas em energia do País, Adriano Pires, o Brasil passará por “três meses decisivos, com grandes emoções”. Ex-diretor da Agência Nacional de Petróleo (ANP), Pires diz que os apagões estão precificados para breve. Segundo ele, no período entre agosto e outubro, como sempre ocorre, os reservatórios continuarão secando e mesmo chovendo muito (o que não é usual), os níveis serão críticos. Adriano Pires acha surpreendente que, mesmo diante dessa realidade indiscutível, prevaleça a apatia de ações entre autoridades. A falta de um plano “B”, que não o da torcida por uma intervenção divina, demonstra decerto o improviso com que questões vitais são tratadas hoje nas hostes do Executivo.

Carlos José Marques, diretor editorial