Sergio Lulia, vice-presidente do banco ABC Brasil, trabalha para uma das instituições financeiras médias mais conceituadas do mercado. Seu banco tem R$ 27,1 bilhões em ativos e concentra suas atividades em clientes de grande porte. No entanto, Lulia quer diversificar essas atividades. Sua meta é que a organização concorra com plataformas digitais de distribuição de investimentos. O paralelo com a XP é evidente. “Queremos atuar como curadores de produtos financeiros”, diz ele. Assim como o ABC, vários bancos de médio porte estão mergulhando, com maior ou menor intensidade, no mercado de captação de investimentos e distribuição de produtos financeiros para clientes pessoa física de renda mais alta. Por trás dessas iniciativas digitais está uma precaução típica dos banqueiros. Temendo solavancos no mercado a médio ou longo prazo, eles estão tentando diversificar as fontes de combustível para abastecer os motores do crédito. “Estamos nos qualificando para atender a esse público e daqui a dez anos, o funding de varejo deve ganhar relevância como fonte dos nossos recursos”, diz Lulia.

Hoje, a captação total do ABC é de R$ 21,4 bilhões. A maior parte desse dinheiro vem da venda de Certificados de Depósito Bancário (CDB) e outros títulos garantidos, como as Letras de Crédito Imobiliário (LCI) e as Letras de Crédito Agrícola (LCA). Todos esses produtos estão disponíveis na plataforma lançada em julho. “Até o fim do ano, devemos oferecer debêntures”, diz Lulia. No começo do ano que vem, produtos de terceiros estarão disponíveis.

Rafael Alves Rodrigues, diretor de investimentos do Banco Inter: “O investidor tende a buscar produtos diferenciados no mercado” (Crédito:Divulgação)

Diversificar as alternativas à disposição da freguesia atrai novos clientes, que passam a comprar também ativos do próprio banco. Esse modelo vem funcionando para o Daycoval, banco especializado no crédito a empresas de middle market, nos empréstimos consignados e no financiamento a veículos. Marcos Alexandre Lyra, gerente de investimentos da instituição, destaca o aumento da procura por fundos multimercados diante da queda na Selic, que hoje está em 6,5% ao mês. “Os nomes mais conhecidos atraem novos clientes, que acabam comprando também os nossos produtos”, diz Lyra. Ele oferece o fundo Adam Multimercado, da conhecida empresa de gestão carioca Adam Capital, de Marcio Appel, e todos os meses coloca novos nomes em suas prateleiras. “Esperamos que os recursos obtidos por meio dessa ferramenta sejam cada vez mais importantes na captação do banco”, afirma Lyra.

Na avaliação de Pedro Antonio, diretor de vendas da consultoria Morningstar no Brasil, que acompanha de perto as mudanças do mercado, a busca por fundos no País é crescente e esse movimento ainda vai durar bastante tempo. “Estamos falando de um mercado de R$ 3,6 trilhões, com um potencial enorme de crescimento”, diz. Como comparação, ele destaca o tamanho do mercado de fundos americano, de US$ 14 trilhões. “Esse deve ser o foco de expansão dessas plataformas”, afirma.

Pedro Antonio, diretor de vendas da Morningstar: “os fundos devem ser o foco de expansão dessas novas plataformas” (Crédito:Divulgação)

O banco Inter foi um dos precursores da incursão digital dos bancos médios. Agora busca diversificar a sua plataforma, criada em 2015 com ativos de renda fixa, com a abertura de fundos de terceiros, iniciativa que acontece desde o começo do ano. Os números mostram o sucesso da estratégia: dentre o total de 60 mil investidores, 10 mil são clientes da DTVM, distribuidora digital do banco mineiro, número que aumentou 319% nos últimos doze meses. Esse foi um indício para a diretoria dar ainda mais importância ao assunto e contratar, no mês passado,o executivo Rafael Alves Rodrigues para liderar a área de investimentos. Rodrigues trabalhou por 12 anos na gestora Rio Bravo, fundada pelo ex-presidente do Banco Central (BC), Gustavo Franco, e está otimista. “O investidor tende a buscar produtos diferenciados no mercado, por isso a nossa primeira meta é aumentar a grade”, diz ele. Hoje o Inter oferece 15 opções, e a meta é ofertar até cinco opções de cada classe de ativos.

Ao contrário das grandes plataformas independentes, a estratégia dessas instituições é colocar na prateleira uma quantidade limitada de opções para conseguir atender os clientes de maneira personalizada, sem contar com agentes autônomos. Diferente do ABC Brasil, que foca em clientes que tenham no mínimo R$ 35 mil para investir, Daycoval e o banco Inter aceitam aportes iniciais de R$ 500. Os clientes deles são, no geral, pessoas que não têm o hábito de investir, e por isso agem com cautela e demandam atenção especial para entender onde estão colocando as suas economias.

“A maioria dos nossos clientes aloca até R$ 250 mil”, diz Rodrigues. Esse é o limite que Fundo Garantidor de Crédito (FGC) cobre por instituição em caso de falência do banco. Especialistas apontam a mudança como um importante ponto de incentivo para atrair mais investidores aos bancos médios. “O investidor tende a buscar cada vez mais alternativas aos grandes bancos, que historicamente oferecem taxas de retorno pouco atrativas”, diz Cláudio Ferro, idealizador da plataforma de distribuição de produtos de renda fixa PoupaBrasil.