O escritório de advocacia da ex-primeira-dama do Rio Adriana Ancelmo, acusado de ser usado para lavar dinheiro do esquema de corrupção chefiado pelo ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), participa de uma disputa judicial bilionária, travada no Superior Tribunal de Justiça (STJ). De um lado, o município do Rio, de outro, a construtora Carvalho Hosken, uma das maiores da cidade, cuja defesa é integrada pela firma de Adriana, entre outros escritórios de advocacia.

O valor pleiteado no processo, que se arrasta há mais de 20 anos, é de R$ 1,5 bilhão, o equivalente a 5% do orçamento total da prefeitura para o ano passado. Em caso de vitória, os honorários advocatícios podem chegar a R$ 150 milhões.

A Carvalho Hosken pede a indenização pelo fato de um terreno seu, desapropriado pelo município nos anos 1960 e pelo qual já foram pagos aproximadamente US$ 70 mil (R$ 224 mil, em valores de hoje), ter recebido uma destinação diferente daquela anunciada quando da cessão. A gleba, de 600 mil m² e localizada na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio, e às margens da Lagoa de Jacarepaguá, iria virar uma reserva biológica. Nos anos 1980, foi inaugurado ali o Polo de Cine e Vídeo, que reúne estúdios locados para gravações.

A construtora sofreu derrotas na Justiça do Rio – o entendimento foi que não cabia nova indenização, uma vez que houve destinação lícita, ou seja, manteve-se o interesse público no uso do terreno. O caso foi então para o STJ.

Relator

Em maio de 2013, o relator, ministro Benedito Gonçalves, deu parecer favorável ao município. Seis meses depois, reconsiderou, alegando que o caso merecia “melhor análise”. O ministro repetiu a posição na semana passada. A votação, suspensa porque o ministro Sérgio Kukina pediu vistas do processo, deve ser retomada nos próximos dias.

“Foi uma mudança inusitada. O ministro reconsiderou em duas linhas, e, na semana passada, fez um resumo extremamente sucinto de sua posição, além de não disponibilizar o voto por escrito. Esse valor é um escândalo, e se baseia no cálculo do metro quadrado construído na Barra, com juros retroativos aos anos 1990”, disse o procurador do município Alexandre Nery Brandão.

Segundo o STJ, os ministros não necessariamente têm de ler o conteúdo de seus votos nas sessões de julgamento.

A Procuradoria avalia que a construtora busca ser beneficiada pela valorização da região, que se deve a investimentos públicos de infraestrutura. “Seria desastroso para o município (pagar R$ 1,5 bilhão)”, disse o procurador-geral do município, Antônio Carlos de Sá.

A construtora, que se tornou dona do terreno ao incorporar a Barra da Tijuca Imobiliária, enviou nota à reportagem afirmando que a indenização paga no passado foi uma “quantia irrisória”, “calculada levando-se em consideração que no imóvel não seria possível edificar”. Sustenta que apenas parte do terreno funciona como Polo de Cine e Vídeo e o restante é usado para outros fins. “O desvio de finalidade, portanto, é incontestável.”

A defesa de Adriana Anselmo disse que os honorários pelo serviço prestado pelo escritório são devidos e que os processos em que ela atuou e aquele a que ela responde na Justiça são distintos, sem que haja implicações entre eles. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.