Num país com poucas marcas reconhecidas no Exterior, as sandálias Havaianas são uma exceção louvável de grife brasileira que emplacou globalmente. Nos últimos anos, os chinelos de dedo fabricados pela Alpargatas calçaram os pés de celebridades, apareceram em desfiles de moda e se tornaram sinônimo de simplicidade e elegância despretensiosa.
 

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 O resultado dessa imagem positiva se refletiu em vendas sempre crescentes no Brasil e no Exterior. No ano passado, porém, houve um revés. A empresa vendeu 186,9 milhões de pares, quantidade 6% inferior ao número de 2008. O curioso é que a queda veio num momento em que a empresa mais que triplicou o número de lojas próprias e franquias específicas da marca Havaianas, que passaram de 26 em 2008 para 82 em 2009.

O encolhimento de vendas contribuiu para que o balanço apresentasse números apenas razoáveis. No acumulado de 2009, o lucro da Alpargatas somou R$ 134,7 milhões, queda de 25,5% em relação ao ano anterior. ?Nosso desempenho foi impactado por uma demanda retraída, principalmente do mercado internacional?, diz José Roberto Lettieri, diretor de relações com investidores da Alpargatas.
 

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Efeito Gisele :a modelo, garota-propaganda da Ipanema, ajudou a marca a crescer na casa dos dois dígitos em 2009

 

De fato, o segmento calçadista passou por dificuldades em 2009. Segundo dados da associação do setor, o volume de pares exportados caiu 23%, na maior retração em quase uma década. Para a Alpargatas, o problema é que sua principal concorrente apresentou um desempenho muito melhor. A Grendene, dona da marca Ipanema, que concorre diretamente com as Havaianas, viu seu lucro crescer 13,6% no ano passado.

Em termos de volume, a empresa aumentou o número de pares vendidos em 13%. Esse percentual considera o desempenho conjunto de todas as suas marcas, entre elas Melissa e Rider. ?Separadamente, o que podemos afirmar é que as vendas da Ipanema também cresceram na casa dos dois dígitos?, diz Francisco Schmitt, diretor de relações com investidores. Se a Ipanema, uma rival direta das Havaianas, teve uma performance tão positiva, é de se perguntar o que estaria acontecendo com o tradicional chinelo de tiras de borracha fabricado pela Alpargatas.
 

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Para o analista Renato Prado, do Banco Fator, a Grendene equilibrou melhor suas contas por possuir um leque muito maior de marcas. ?Num cenário de crise, isso representa uma vantagem?, diz ele. Se um segmento específico não vai bem, a empresa pode direcionar seus esforços para uma determinada marca. Também é importante levar em conta o efeito Gisele Bündchen, garota-propaganda da Ipanema, e que geralmente alavanca uma marca sempre que empresta seu nome a ela.

No mercado, o que se comenta é que a Alpargatas cometeu um erro estratégico. Assustada com a crise global, a empresa teria diminuído em demasia o seu ritmo de produção. Quando o mercado começou a se recuperar, ela não teve a mesma velocidade de reação dos concorrentes. ?Ajustamos o nível de produção e os custos fabris para adaptar a companhia à nova conjuntura?, diz Lettieri.

Para especialistas, ainda é prematuro afirmar se as Havaianas vivem um problema consistente ou se não é apenas uma questão momentânea. ?Qualquer marca do mundo da moda precisa tomar cuidado para não cair na saturação?, diz Júlio Moreira, consultor da Top Brands. Segundo ele, o jeito de blindar esse efeito é lançar coleções num ritmo veloz e apresentar ao mercado uma grande variedade de modelos da mesma grife. Nesse aspecto, a Alpargatas parece estar vacinada. Nos últimos seis meses, a empresa colocou na praça quase uma centena de novos modelos que trazem a marca Havaianas.