No dia 25 de fevereiro de 2021, entrou em vigor a lei da chamada autonomia do Banco Central. O texto vinha com a da adoção de mandatos de quatro anos para presidente e diretores da autarquia federal. Antes disso, Roberto Campos Neto já comandava a autarquia federal, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). 

Passados quase 2 anos de gestão do economista carioca, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva já declarou suas críticas ao modelo de gestão. “Nesse país se brigou muito para ter um Banco Central independente, achando que ia melhorar o quê? Eu posso te dizer com a minha experiência, é uma bobagem achar que o presidente do Banco Central independente vai fazer mais do que fez o Banco Central quando o presidente era que indicava”, afirmou o presidente em entrevista.

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Menos de 1 mês depois, Lula disse que pode buscar rever a autonomia do Banco Central quando terminar o mandato do atual presidente da instituição. A declaração ocorreu após a primeira reunião do Copom, quando a taxa básica de juros da economia brasileira – a Selic – foi mantida em 13,75% ao ano.  

O presidente classificou como “vergonha” a explicação do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central para o atual patamar da taxa de juros e pediu que a classe empresarial e a sociedade reclamem do nível da taxa Selic.

Na cerimônia de posse de Aloizio Mercadante como presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no Rio de Janeiro, Lula disse ainda que não existe justificativa para o atual patamar dos juros e voltou a afirmar que não existe necessidade de um Banco Central formalmente independente do governo, como ocorre atualmente.

O governo e seus aliados, segundo mostrou a colunista Mônica Bergamo, estariam temendo uma recessão, a partir da última decisão do BC sobre a taxa de juros e sobre manter taxas altas por mais tempo.  

“O que está na pauta é a questão da taxa de juros”

Em entrevista no último dia 2, Lula avaliou a escolha feita pelo Congresso lá em 2021. “Eu acho que eles [os presidentes da Câmara e do Senado] imaginavam que, fazendo o Banco Central autônomo, a economia voltaria a crescer, os juros baixariam e tudo ia ser maravilhoso”, disse.

“O Brasil precisa voltar a crescer. Não existe nenhuma razão para a taxa de juros estar em 13,75%. O que está na pauta é a questão da taxa de juros”, acrescentou. 

Segundo especialistas procurados pela Dinheiro, uma eventual vontade de Lula para ‘controlar’ a taxa de juros poderia ser perigosa. “A inflação, caso se perca o controle por conta de uma má gestão de política monetária, é ruim para o país, que já sofreu muito com inflação alta. O que é esperado do novo governo é que ele traga uma maior clareza da sua política econômica”, defende Joelson Sampaio, professor de economia da FGV EESP.

A inflação no Brasil encerrou 2022 em 5,79%, acima da meta do Banco Central, mas muito abaixo do percentual registrado em 2021. Em dezembro, a inflação foi de 0,62%, informou o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Nos últimos dias, a meta de inflação foi novamente argumento de Lula contra Campos Neto. “Ele [Campos Neto] quer chegar à inflação padrão europeu? Não. Nós temos que chegar à inflação padrão Brasil. Uma inflação de 4,5% no Brasil, de 4%, é de bom tamanho se a economia crescer”, declarou.

“Existe sempre o trade-off entre inflação e crescimento e esse debate é sempre um perigo. O controle da inflação pode gerar desaquecimento da economia, mas por outro lado escolher crescimento sem o comprometimento com um patamar de inflação gera o que nós já vimos no Brasil antes do Plano Real, quando a inflação alta gerou componentes de indexação e um caminho para a hiperinflação”, recorda o economista e gerente do Ibmec BH Márcio Salvato.

Nesta terça-feira (7), a ata da reunião do Copom avaliou que ‘a revisão do arcabouço fiscal do país diminui a visibilidade sobre as contas públicas para os próximos anos, insere prêmios nos preços de ativos e impacta as expectativas de inflação’. Campos Neto estará, ainda hoje, em palestra no evento 2023 Milken South Florida Dialogues, em Miami, Estados Unidos. 

Sobre o medo da recessão, Salvato acrescenta: “O cenário é de países que vivenciaram o crescimento da inflação por conta de aumento de estrutura de custos (elevação dos preços de commodities) e desequilíbrio das estruturas de produção por conta da Covid e guerra da Ucrânia x Rússia. A grande maioria dos países adotaram políticas monetárias apertadas para controle da inflação (elevação das taxas básicas de juros), assim como ocorreu no Brasil. O período atual é de arrefecimento das políticas monetárias em resposta à redução das expectativas de inflação para alguns países. Isso é o que explica a recente queda da taxa de juros americana pelo Federal Reserve . Mas este não é ainda o cenário brasileiro, que mantém a taxa em 13,75%”, conclui.