O presidente Jair Bolsonaro avalia editar um novo decreto de calamidade pública e abrir créditos extraordinários para subsidiar os preços dos combustíveis. Na verdade, seria matar uma formiga usando uma bala de canhão. Vale lembrar que o estado de calamidade de saúde pública foi decretado no governo Bolsonaro para ajudar no combate á pandemia de Covid-19 e terminou apenas em abril deste ano.

Caso a medida seja realmente tomada, o presidente pode, por exemplo, criar um bolsa caminhoneiro, ou criar auxílios para entregadores e motoristas de aplicativo diretamente impactados pela alta nos valores dos postos. Com exceção do último grupo, os caminhoneiros são grupo de pressão importante para a engenharia política do Palácio do Planalto, tendo em vista que boa parte do movimento grevista de 2018 apoiou a candidatura de Bolsonaro à presidência.

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Com o decreto, Bolsonaro estaria livre para furar o Teto de Gastos (dispositivo que impede o crescimento das despesas além do índice inflacionário) e conseguiria jogar o problema da defasagem dos preços do diesel e da gasolina para o governo seguinte.

Neste momento, um dos pontos que pesam para a inflação dos combustíveis é a guerra da Ucrânia, responsável por gerar um descompasse nos óleos combustíveis no mundo inteiro, além do desabastecimento do diesel no Brasil. A leitura no Ministério da Economia, entretanto, é a de que o governo não deve interferir na política de preços, posição contrária à ala política, que teme pela reeleição de Bolsonaro.

O que é o decreto de calamidade pública?

Previsto na Constituição, o estado de calamidade pública é caracterizado por uma situação anormal, em que a capacidade de ação do poder público está comprometida por algum evento incontrolável. Esses eventos podem ser causados pela natureza, como as fortes chuvas que destroem cidades, ou pelo descompasso econômico local.

Nesses casos, o governo federal intervém no estado ou município que está em calamidade e gere a situação conforme a necessidade, até que a normalidade seja reestabelecida – neste caso, a própria União teria uma parte do Orçamento redirecionado para tratar a questão. Pelo indicado no artigo 136, da Constituição Federal, esse decreto deve indicar o tempo de duração (não podendo ser superior a 30 dias, porém é prorrogável pelo mesmo período), quanto vai gastar e onde os recursos serão aplicados.

Todo decreto deste tipo necessita de uma autorização do Congresso Nacional, tal qual aconteceu no início da pandemia da Covid-19, quando estados e municípios receberam ajuda financeira para tratar dos problemas sanitários desencadeados com o aumento de casos e mortes pelo coronavírus.

Bolsonaro pode decretar estado de calamidade em ano de eleição?

De acordo com a Lei Eleitoral, no artigo 73, parágrafo quinto, o presidente não pode tomar algumas medidas administrativas nos três meses que antecedem uma eleição. Entre elas, a “distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios”, exceto em situações extremas, como as de calamidade ou emergências – ou para a manutenção de programas sociais que já estavam em andamento.

Quais os problemas que um decreto de calamidade pode gerar?

Decretos deste tipo congelam algumas disposições do poder público, como o de reajustar o salário de funcionários públicos, por exemplo. Neste caso específico, Bolsonaro ainda corre o risco de ver todo o funcionalismo exercendo pressão para contar com aumento nos salários e ameaçando, inclusive, entrar em greve.

Além disso, existe uma leitura, agravada com a pandemia, de que o governo precisa controlar os gastos públicos e não aumentar o estoque da dívida. A ala técnica do Ministério da Economia é contra movimentos do tipo, porém a ala política do governo e os aliados do Congresso estão pressionando por uma atitude mais enérgica da gestão contra os aumentos nos preços dos combustíveis.