“Enfadonho”, mas “importante”. Esta frase, retirada de um de seus discursos, resume a forma como Joe Biden encarou seu trabalho ao chegar à Casa Branca, há seis meses: privilegiar o conteúdo à forma para voltar a colocar os Estados Unidos no centro do tabuleiro global.

Ao reunir seus ministros na Casa Branca nesta terça-feira (20) para comemorar seu primeiro semestre no poder, o presidente voltou a lembrar a análise que repete mais de uma vez desde janeiro passado.

Segundo ele, os Estados Unidos estão em uma “concorrência” existencial com países como a China, “que acreditam que o futuro pertence ao autoritarismo”.

Biden quer demonstrar, ao contrário, que “a democracia pode fazer mais”, tanto para inovar quanto para lutar contra o aquecimento global e garantir prosperidade.

Isso implica em gastos faraônicos em estradas, pontes, internet de alta velocidade, mas também em saúde, educação e apoio às famílias, destaca.

No campo da política externa, essa ótica significa reativar as alianças tradicionais do país, deixadas de lado nos quatro anos de gestão de seu antecessor, Donald Trump.

São temas importantes, mas que não necessariamente fascinam a opinião pública, admite o próprio líder democrata.

“Sei que é um discurso enfadonho, mas é importante”, disse em 7 de julho em um ato nos subúrbios de Chicago no qual o público, entusiasmado no começo, foi demonstrando cansaço à medida que o presidente ia detalhando os gigantescos projetos econômicos e sociais que pensa empreender.

“Realmente deve ser enfadonho, enfadonho, enfadonho para vocês, especialmente os menores de 13 anos”, brincou uma vez mais em 15 de julho, diante de pais e filhos aos quais expôs uma medida de apoio econômico para as famílias.

– Anti-Trump –

Diferentemente de Trump, que gostava das diatribes e das saídas de tom, o presidente democrata e sua equipe se apegam a uma comunicação extremamente controlada.

“Biden está tentando reverter a seu favor algo que foi problemático durante muito tempo: sua forma muito erudita de se expressar”, disse Robert Rowland, professor da Universidade do Kansas e especialista em comunicações presidenciais. “Tenta projetar a imagem de alguém enfadonho, mas competente e que produz resultados reais”.

Diante da imprensa, com raras exceções, o presidente de 78 anos confia no teleprompter e em suas anotações, e sua equipe de comunicadores se apressa para tirar da sala os jornalistas que tentam lhe fazer perguntas ao final de cada discurso.

Ao contrário de Donald Trump, que adorava fazer monólogos improvisados e enviar tuítes furiosos, enquanto o governo Biden faz um uso muito institucional das redes sociais.

Às vezes o presidente não passa do sussurro. “Ouvi-lo pode ser doloroso. Tropeça nas palavras, perde o fio (…)”, observa Lawrence Jacobs, professor de ciência política na Universidade de Minnesota.

No entanto, dá “maior segurança quando fala de assuntos externos ou de segurança nacional”, aos quais se dedicou durante sua longa carreira no Senado.

O presidente “não subestima o poder retórico do seu cargo”, observa Jacobs. “Seria um erro acreditar que não pode marcar a agenda”.

Na sexta-feira passada, antes de deixar a Casa Branca para tirar uma folga no fim de semana, Biden acusou o Facebook e outras redes sociais de “matar gente” ao deixar circular informação falsa. Suas declarações não pararam de aparecer nos canais de notícias durante todo o fim de semana.

Mas o presidente é especialmente espontâneo quando dá vazão à sua empatia.

Marcado por tragédias familiares – sua primeira esposa e sua filha morreram em um acidente automobilístico e seu amado filho, Beau, sucumbiu a um câncer -, ele não hesita em consolar o público.

Recentemente, falou durante longas horas com as famílias das numerosas vítimas do desabamento de um prédio na Flórida.

“Tem um dom para consolar as pessoas”, disse Robert Rowland.

O índice de popularidade de Joe Biden permanece por enquanto firme acima dos 50%, um nível que Donald Trump nunca alcançou.