Superado o trauma com o fim da parceria com a americana Boeing, a Embraer busca alternativas para seguir seu plano de voo. O principal pilar dessa reparação é um contrato de financiamento de até US$ 600 milhões (cerca de R$ 3,1 bilhões), anunciado na segunda-feira (15), com prazo de pagamento de até quatro anos, para atender à demanda de jatos executivos e comerciais nos próximos meses. Metade será disponibilizada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a outra parte por um consórcio de bancos privados e públicos. O empréstimo é o primeiro passo para socorrer a Embraer, impactada tanto pela pandemia quanto pelo rompimento da parceria com a Boeing, em abril. A empresa americana alegou falta de cumprimento do acordo para o distrato unilateral com os brasileiros, que, em resposta, apontaram a grave crise financeira da ex-parceira como razão para o desfecho. A companhia brasileira iniciou processo de arbitragem nos Estados Unidos para reaver parte dos quase R$ 500 milhões investidos em 2019 para a separação da área comercial da joint-venture, além dos R$ 97 milhões apenas neste ano na finalização do processo. O processo de reestruturação da Embraer começou com a reintegração da área de aviação comercial, agora sob a presidência do holandês Arjan Meijer. “Arjan tem energia, experiência internacional e competência necessárias para liderar a unidade de negócio neste momento único”, diz o presidente e CEO da Embraer, Francisco Gomes Neto.

A redução de até 90% no tráfego de passageiros não afetou, até aqui, as encomendas de clientes. Segundo a companhia, o que houve foi o adiamento na entrega de aeronaves. O balanço do primeiro trimestre mostra R$ 16 bilhões em pedidos para os próximos meses. Além disso, a empresa precisa lidar com o fato de ter perdido o grau de investimento, de acordo com avaliação da Standard & Poor’s (S&P), que cortou o rating de BBB- para BB+, na segunda-feira (16). Segundo a agência de classificação de risco, a companhia deve registrar queda de cerca de 50% em suas entregas de jatos comerciais neste ano, o que levará a uma lucratividade “significativamente mais fraca” e a uma “queima de caixa” de aproximadamente US$ 800 milhões (R$ 4,1 bilhões), por causa dos efeitos da Covid-19.

Para Thiago Carvalho, advogado especialista em direito aeronáutico e integrante da Comissão de Direito Aeronáutico da OAB no Rio de Janeiro, o financiamento junto ao BNDES e bancos privados e públicos traz fôlego à Embraer para se replanejar, cortar custos fixos e, talvez, buscar outra parceria. Apesar de a empresa nacional não estar em situação financeira delicada como as demais aéreas, ele vê um cenário mundial desafiador. “Projeta-se uma queda de 22% na expectativa de receitas em 2020 e de outros 22% em 2021”, diz Carvalho. “Além disso, a Embraer terá de competir com a Airbus no mercado de jatos comerciais narrow-body (fuselagem estreita).” É hora de mostrar frieza e habilidade ao manche.