Após cair 1,26% ontem, quando fechou no menor nível desde 15 de setembro, o dólar à vista esboçou um movimento de recuperação nesta quarta-feira (08), em meio ao sinal positivo da moeda americana no exterior e à perda de fôlego dos preços das commodities. Investidores também começam a se posicionar para divulgação, na quinta-feira (10), do índice de preços ao consumidor (CPI) nos Estados Unidos em janeiro, puxando para cima o retorno dos Treasuries. Se a inflação vier mais pressionada que o previsto, vão crescer as apostas em ação mais agressiva do Federal Reserve.

Apesar da divulgação da ata do Copom, o pregão foi morno, com oscilações modestas da taxa de câmbio, de apenas cerca de três centavos entre a mínima (R$ 5,2517) e a máxima (R$ 5,2887). Afora uma queda pontual pela manhã, a moeda trabalhou com sinal positivo ao longo do dia e encerrou os negócios a R$ 5,2606, avanço de 0,11%. O dólar perde 0,85% em fevereiro e 5,65% no acumulado do ano.

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A ata do colegiado do BC trouxe um tom mais duro que o do comunicado da semana passada, quando a taxa Selic foi elevada em 1,5 ponto porcentual, para 10,75% ao ano. Em sua ata, o Copom revela que suas projeções de inflação para 2022 e 2023 estão acima do teto da meta no seu cenário básico, reitera o risco de desancoragem das expectativas diante das incertezas em torno do “arcabouço fiscal” e acena com “ajustes adicionais” da taxa básica, embora em menor ritmo.

Foi o bastante para que diversas casas – como JP Morgan, Barclays e Bank of America – revisassem para cima suas expectativas para o nível da taxa básica, com prevalência de projeção de alta de 1 ponto porcentual em março e de 0,50 ponto em maio, o que levaria a Selic para 12,25% ao ano. Amanhã, sai o IPCA de janeiro, cuja leitura pode ratificar a aposta em aperto monetário mais intenso.

De forma geral, a avaliação é que, a despeito da expectativa de manutenção de um diferencial de juros elevado, na esteira do aceno do Copom de Selic na casa de 12%, o dólar experimentou hoje uma acomodação no mercado doméstico de câmbio. Há dúvidas se o fluxo de recursos estrangeiros se manterá em ritmo elevado tanto para Bolsa como para a renda fixa, apesar de o Brasil ter taxa real de juros muito atraente.

O diretor de estratégia da Inversa Publicações, Rodrigo Natali, observa que as commodities começam a ter um desempenho “pior na margem”, o que tira o apelo dos ativos domésticos. O real, diz Natali, se beneficiou do fluxo positivo de recursos estrangeiros, fruto da rotação das carteiras promovida pelos investidores estrangeiros em janeiro.

“Fluxo uma hora acaba. Eu vejo os ativos domésticos com um desempenho aquém dos externos daqui para frente. O dólar deve subir tanto lá fora, principalmente frente ao euro, quanto aqui dentro”, diz Natali, que vê espaço para a taxa de câmbio voltar para um patamar entre R$ 5,40 e R$ 5,50. “Com fluxo forte, parece que o mercado deixou de lado a questão fiscal e o risco das eleições. Mas isso pode voltar a ser justificativa para uma alta do dólar”.

A economista do Banco Ourinvest Cristiane Quartaroli observa que o tom hawkish da ata do Copom, com a sinalização de que o ciclo de aperto monetário será mais longo do que o esperado, pode ter dado certo suporte ao real, mantendo o dólar na faixa de R$ 5,26 apesar do fortalecimento da moeda americana lá fora. “Lembrando que o patamar do nosso câmbio ainda é muito elevado, porque o pano de fundo macroeconômico local não é dos melhores. Esse alívio no câmbio parece que será momentâneo”, afirma.

No exterior, o índice DXY – que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes – subiu cerca de 0,20%, ao redor dos 95,600 pontos. A moeda americana teve comportamento misto em relação a emergentes e exportadores de commodities, com alta frente a dois pares do real (peso mexicano e chileno) e queda frente ao rand sul-africano.

O economista-chefe da JF Trust, Eduardo Velho, trabalha com um cenário de valorização do dólar no exterior no curto prazo, dadas as chances de um processo mais prolongado de alta dos juros nos Estados Unidos ao longo deste ano. Números “salgados” de inflação em fevereiro e março tendem a jogar ainda mais pressão sobre o Federal Reserve.

Além da maré externa desfavorável, Velho vê a possibilidade de que a taxa de câmbio doméstica comece a ser “reprecificada” à luz dos riscos fiscais embutidos em uma eventual aprovação da PEC dos Combustíveis, em meio a pressão de gastos em ano eleitoral.

Em relação à ata do Copom, o economista da JF Trust diz que o BC preferiu manter a prudência, ressaltando que a persistência inflacionária também nos Estados Unidos aumenta o risco de taxas de juros maiores no exterior e, por tabela, de piora nas condições financeiras para emergentes. “Em outras palavras, pressão potencial de alta do dólar”, afirma.

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