Dados do Ministério da Saúde apontam que, entre 2006 e 2015, 1.289 pessoas morreram em acidentes com embarcações no Brasil. O número, porém, pode ser bem maior, alertam especialistas do setor. Por semana, 4,5 mil viagens intermunicipais são realizadas no Brasil por meio de barcos, lanchas e navios, conforme pesquisa Ligações Rodoviárias e Hidroviárias 2016, divulgada no mês passado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

É uma quantidade pequena ante 1,7 milhão de partidas feitas por transporte rodoviário, mas os trajetos de barco respondem por 98% do registrado no Norte.

Na Bahia, onde aconteceu o naufrágio desta quinta-feira, 24, que deixou 18 mortos, segundo a Marinha, o trecho entre Vera Cruz, na Ilha de Itaparica, e a capital baiana é a ligação marítima mais movimentada. São 539 partidas semanais, quase 80 por dia. Em segundo lugar, está a conexão entre Salvador e Itaparica, na mesma ilha, com 228 partidas.

O arquiteto naval Carlos Padovezi, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas, diz que conexões como essa são as que têm a melhor infraestrutura do País. “As embarcações são melhores e há fiscalização. Nesses locais, falando em tese, é mais comum que um acidente aconteça por um erro, por uma avaliação incorreta sobre as condições do mar, do que por questões relacionadas à infraestrutura.”

Procurado, o Comando da Marinha confirma: a causa determinante dos naufrágios, conforme apurado nos inquéritos, é o fator “erro humano”. O excesso de lotação foi responsável por quatro acidentes em 2016 e outros quatro neste ano.

Ainda segundo a Marinha, o maior número de autos de infração em 2017 ocorreu na área que abrange Amazonas, Rondônia, Roraima e Acre – 2.379 de um total de 9,8 mil no País. “No Norte, especialmente no Amazonas, a situação é crítica. E não há nenhuma melhora desde que acompanho o assunto, há três décadas”, diz Padovezi.

A gravidade é relacionada a uma série de fatores, incluindo o fato de os rios locais serem a única conexão entre uma série de municípios e a grande extensão de área que precisa ser fiscalizada pelas autoridades. “Há ainda a questão da renda. A população não tem recursos para financiar viagens em transportes caros”, afirma ele.

Para se ter uma ideia, o estudo do IBGE diz que há 426 partidas semanais entre Belém e Barcarena (PA) – para comparar, entre São Paulo e Ribeirão Preto (SP) há 416. “Como a população não tem como bancar viagens em embarcações maiores, é comum que os donos prefiram ocupá-las com cargas, pois é possível cobrar um pouco mais. Mas isso deixa a qualidade de transporte ainda mais precária. A população aceita porque não tem outra opção”, diz o arquiteto.

Fiscalização

Para uma embarcação circular, a providência inicial é a liberação da Marinha. É o braço das Forças Armadas que se responsabiliza por averiguar a segurança das embarcações e determinar, por exemplo, a lotação máxima de cada barco. Depois, para fazer a operação comercial, o dono precisa credenciar-se nas agências estaduais para fazer viagens no interior de cada Estado ou com a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), para os caso de viagens interestaduais. As agências ainda se ocupam de observar a parte documental dos barcos, mas é a Marinha quem fiscaliza as regras de segurança. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.