O ministro da Economia, Paulo Guedes, vive hoje uma situação comparável ao que no dicionário econômico é conhecida como a teoria do Paradoxo da Parcimônia. O dilema, elaborado pelo economista britânico John Maynard Keynes na década de 1940, define a encruzilhada entre incentivar o aumento da poupança e a cautela dos gastos públicos em tempos de crise aguda – como a que o Brasil e o mundo atravessam – ou estimular a atividade por meio da expansão dos gastos públicos e do consumo das famílias. Independentemente do caminho que o governo tomar, o presidente Jair Bolsonaro precisará mudar a política do confronto para angariar apoio dos empresários prejudicados pelo lockdown e os parlamentares insatisfeitos com a pouca participação no governo.

A primeira tentativa de aproximação com os empresários aconteceu na quarta-feira (7), quando um encontro orquestrado por Washington Cinel, dono da empresa de segurança Gocil, reuniu com Bolsonaro um time de empresários graúdos. Entre os nomes confirmados pelo RSVP estavam Rubens Ometto, da Cosan; Claudio Lottenberg, presidente do Instituto Coalizão Saúde; André Esteves, do BTG Pactual; Alberto Saraiva, do Habib’s; e João Camargo, do grupo Alpha. O último encontro de Bolsonaro com grandes nomes do empresariado foi em dezembro do ano passado, em um jantar na casa de Paulo Skaf, presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

FALA,TRABALHADOR Manifestação em São Paulo pede por política de geração de empregos. Ajuda do governo para reabertura dos postos foi uma das demandas dos empresários em reunião com Bolsonaro. (Crédito:Divulgação)

Segundo fontes que participaram do encontro da última semana, os empresários cobraram – entre sorrisos, elogios e tapinhas nas costas –, que Bolsonaro intensifique as medidas de enfrentamento da pandemia, sob o risco de o presidente perder sua popularidade e abrir espaço para o retorno do PT em 2022. Foi consenso que a implementação do “Plano Vacina” e a diminuição do discurso negacionista poderia melhorar a imagem do governo neste ano. Na contrapartida, Bolsonaro também fez promessas de enfrentar a situação tributária brasileira, com um plano de simplificação sem elevar as obrigatoriedades fiscais dos empresários. Um empresário que esteve no encontro e conversou com a reportagem garantiu que a postura do presidente foi mais parecida com a do início do mandato do que a vista nos últimos meses. “Ele baixou o tom e pediu apoio dos empresários. Há uma vontade conjunta de fazer o Brasil voltar a caminhar”, disse a fonte à DINHEIRO, na condição de anonimato.

NO CONGRESSO Enquanto empresários e governo trocavam promessas, na Câmara dos Deputados um texto importante e polêmico era aprovado. O projeto de lei em questão versa sobre a liberação da iniciativa privada para comprar vacinas para a imunização de empregados, desde que seja doada a mesma quantidade ao Sistema Único de Saúde (SUS). A proposta será enviada para análise do Senado. Segundo o texto, os empresários poderão comprar vacinas que ainda não tiveram aval da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), desde que autorizadas por agências reconhecidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Essa aquisição pode ser feita diretamente pelas empresas ou por meio de consórcio.

A medida autoriza que trabalhadores prestadores de serviço também sejam beneficiados com a vacinação, inclusive estagiários, autônomos e empregados de empresas de trabalho temporário ou de terceirizadas. O texto prevê que a vacinação dos empregados deve seguir os critérios de prioridade estabelecidos no Programa Nacional de Imunizações (PNI). A proposta foi uma resposta do Congresso à morosidade do plano de vacinação nacional, mas os próprios deputados entendem que essa liberação poderia aprofundar a desigualdade social, beneficiando as pessoas menos vulneráveis economicamente. O deputado Alexandre Padilha (PT-SP), ex-ministro da Saúde, afirmou que os empresários encontrarão barreiras para adquirir os imunizantes já que as produtoras de vacinas comercializam direto com os governos dos países. “Ouçam parlamentares, estão aprovando algo que vai permitir a importação de vacinas de baixa qualidade. As empresas sérias não vão vender o imunizante”, disse.

Mateus Bonomi

“O estado de calamidade pública seria apenas uma licença para gastar, um cheque em branco. ao invés de um sinal de estabilidade, seria o contrário” Paulo Guedes, Ministro da Economia.

Com a semana tomada pela discussão da compra da vacina, a decisão sobre o Orçamento segue uma incógnita, o que tem deixado o ministro da Economia, Paulo Guedes, de cabelo em pé. Segundo ele o texto aprovado na Câmara é inviável e precisará ser revista. “Alguns excessos que ocorreram precisam ser removidos. Tenho certeza de que não foi nada de má-fé [do Congresso]”, afirmou Guedes. “É natural de um time que não jogou junto ainda. É natural que a soma das partes exceda o que era possível fazer. É da política.” Sobre um eventual retorno do estado de calamidade, o ministro disse que seria apenas uma maquiagem. “O estado de calamidade pública seria apenas uma licença para gastar. Seria um cheque em branco”, disse, em live promovida pela XP Investimentos na segunda-feira (5). “Em vez de ser um sinal de estabilidade, seria o contrário.”