Em todas as semanas do ano, religiosamente, 350 pesquisadores batem na porta da casa de 33 mil brasileiros, entram nas cozinhas, vasculham os armários dos banheiros, mexem na despensa e vão embora. No período em que ficam ali, anotam tudo o que podem: quem comprou o que, de que marca e se apareceu um item novo na geladeira. Treinados para o serviço, esses funcionários repassam as informações aos técnicos da LatinPanel, uma das maiores empresas de pesquisa do mundo, que conseguem montar o perfil de compra atualizado do brasileiro. Nessa espionagem liberada, os pesquisadores ficam muito próximos das famílias e têm controle de cada passo dado por elas. ?Um milhão e meio de entrevistas são feitas ano. Sabemos em detalhes o que acontece naquelas quatro paredes?, conta Ana Claudia Fioratti, diretora da LatinPanel, criada a partir uma joint venture de grupos estrangeiros.

Nesse seleto grupo das consultorias especializadas, não falta gente inventando novos modelos de análise e de captura de dados. Em setembro, 20 observadores contratados pelos consultores da Ponte Estratégia passaram o dia tirando fotos de um típico almoço de domingo, na casa de famílias de baixa renda na periferia de São Paulo. Com uma câmera digital nas mãos, eles fotografaram a mesa preparada para a refeição, as principais mercadorias dentro das geladeiras, os eletrodomésticos mais comuns nas cozinhas. E quem bisbilhotava a vida das famílias eram os próprios moradores. ?Queríamos que todos agissem naturalmente e o único jeito foi treinálos para coletar dados em sua residência mesmo?, conta André Torretta, sócio da Ponte Estratégia.

SACOLA CHEIA
R$ 1,4 TRILHÃO

foi quanto os brasileiros gastaram em compras no País no ano passado

Grandes redes varejistas também entraram nessa onda da análise individualizada dos hábitos do cliente. Nos últimos anos, o grupo Pão de Açúcar, com o apoio da consultoria DataPopular, decidiu colocar diretores da empresa dentro da casa de freqüentadores do CompreBem e do Sendas. Em 2005, 11 executivos da rede fluminense, em cargos de direção, passaram uma semana dentro das residências, do início da manhã até as nove da noite, acompanhando passo a passo o cotidiano das famílias de classe C do Rio de Janeiro. O resultado dessa ação teve reflexo nas gôndolas e repercute nas estratégias adotadas pela empresa até hoje. Nas recentes reformas de lojas do Sendas, a área de perfumaria foi parar na frente do ponto-de-venda. Percebeu-se que essa consumidora, mesmo com menor poder de compra, não abria mão da compra de produtos para beleza. E as ações de mídia passaram a levar mais em conta o desejo de consumo das crianças ? personagem considerado fundamental na lista de compra dessas famílias.

Empresas querem desvendar as preferências do consumidor e as mudanças nos hábitos

Na indústria, uma série de adaptações recentes em produtos foi feita, no embalo da estabilidade econômica e das mudanças nos hábitos de compra.