A corrida das empresas para a Bolsa de Valores tem colocado um novo tipo de executivo sob os holofotes da mídia e do mercado de capitais. São os profissionais de RI, sigla de Relações com Investidores. Se há dez anos eles cumpriam, basicamente, a função burocrática de registrar os fatos relevantes das empresas na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), hoje eles fazem parte do board das companhias e cuidam de cada detalhe estratégico: da transparência à governança corporativa. Os RIs, como são chamados, passaram a ser os olhos do mercado, os ouvidos dos analistas e a voz da empresa. A valorização desses profissionais aumenta na mesma proporção da adesão das companhias nacionais ao mercado de capitais. Nos últimos três anos, foram 88 empresas que registraram suas ofertas primárias de ações, até o dia 20 de setembro. E todas correram para encontrar o seu RI.

O departamento de RI normalmente trabalha com um diretor, um gerente e um número variado de especialistas e analistas. Parece simples, mas a definição do homem forte dessa área tem feito as empresas gastarem muito tempo em busca do profissional ideal. Há uma carência de especialistas. A Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), ligada à USP, criou um MBA há dois anos para preparar esse novo executivo. ?A área financeira é o primeiro ambiente de pesquisa para encontrar o RI?, diz Patricia Gibin, diretora da Fesa Global Recruiters. Mas essa não é a regra. Para ser um candidato ao cargo, é preciso entender de marketing, comunicação, vendas e finanças. Valoriza-se a ampla formação desse executivo, desde que não falte o conhecimento do mercado no qual atuará.

Alguns setores têm particularidades difíceis de se aprender. É o caso daqueles que necessitam de regulação, como a distribuição de energia. Clarice Assis sabe bem o que isso significa. Convidada em 2003 para a direção da área da AES, que DINHEIRO/523-03/10/2007 SOARES, DO IBRI: ?O RI precisa ter grande preocupação com a informação privilegiada? controla a Eletropaulo no Estado de São Paulo, sempre é requisitada quando notícias sobre um possível apagão energético vêm à tona. Nesses momentos, analistas e

investidores querem saber o posicionamento da empresa. ?Quanto mais acionistas, maior é o número de telefonemas quando as crises do setor são aventadas?, diz ela. Falar com propriedade de um segmento facilita o entendimento dos investidores. ?O profissional de RI precisa de consistência para passar credibilidade para o mercado?, diz Eurico de Carvalho, diretor financeiro e de RI da Klabin Segall.

O mercado imobiliário exige um conhecimento global, sobretudo após a crise recente nos Estados Unidos. Nesse momento, o RI precisa mostrar firmeza e confiança para separar os fatos externos e a capacidade do mercado doméstico. Durante o período da crise, a incorporadora Klabin Segall foi surpreendida com informações que diziam que um empreendimento no bairro carioca do Méier não seria lançado. Para acabar com as especulações, Carvalho levou todos os investidores interessados para ver o local da construção e o estande de vendas. Foi a maneira que o RI encontrou para ser transparente e evitar que as ações despencassem com uma debandada de investidores.

A remuneração do RI pode atingir R$ 1,5 milhão ao ano

Esse tipo de trabalho faz parte da governança corporativa, uma das mais importantes funções do profissional de RI. Ele é o responsável pelas informações chegarem em condições de igualdade e com transparência a todos os investidores. Caso um dado estratégico seja divulgado antes da hora e sirva para uma negociação com as ações da companhia, o RI deve levar esse conhecimento a todos através do fato relevante. ?O RI precisa ter uma grande preocupação com o insider trading e, principalmente, não se omitir?, diz Geraldo Soares, presidente do Instituto Brasileiro de Relações com Investidores (IBRI) e superintendente de RI do Banco Itaú. Por estar na linha de frente da informação de uma empresa, qualquer deslize pode manchar seu histórico profissional. ?O descrédito vai para o nome do RI e não para a empresa?, pontua Carvalho. Na proposta de compra da Perdigão, em 2006, o então diretor da Sadia, Luiz Gonzaga Murat Jr., foi acusado de usar informações privilegiadas na negociação de ações. Foi demitido, fez acordo com a SEC americana e sofre processo na CVM.

Um RI bem-sucedido pode aspirar a vôos mais altos. Antes de ser nomeado presidente da Suzano Petroquímica em setembro de 2006, João Nogueira Batista cuidou da área de RI. No comando da companhia, esteve à frente da reorganização da holding, do lançamento de ações no nível 2 de Governança Corporativa na Bovespa e da venda da empresa para a Petrobras, em agosto,

por R$ 2,7 bilhões. Missão cumprida. Na quinta-feira 27, ele anunciou: ?O meu ciclo na empresa terminou. Parto para novos desafios?, disse aos funcionários.

Como faltam profissionais, os RIs de concorrentes são os alvos. E estão financeiramente valorizados. Levantamento da Fesa mostra que um diretor financeiro que acumula a função de RI pode ganhar quase R$ 1,5 milhão em um ano, entre salários e bônus (veja tabela ?O Valor do RI?). A procura na empresa de recrutamento cresceu 54% de 2006 para este ano. ?Haverá seguramente mais cinco anos de forte crescimento nessa área?, diz Alfredo Assumpção, presidente da Fesa. Os bancos não foram inseridos nesse estudo porque distorceriam os valores. Em 2006, os maiores bônus pagos no UBS Pactual bateram nos R$ 10 milhões ? a média do banco foi de R$ 750 mil.

Muitas vezes, é o diretor-financeiro quem acumula a função do RI. É o caso de Edson dos Santos. Antes de a Redecard protagonizar a maior abertura de capital deste ano, com R$ 4,1 bilhões captados em julho, Santos preparou-se durante quatro meses. Foi o tempo que ficou com o pé na estrada ? outro desafio do RI nas estréias na bolsa. No roadshow pela Europa e pelos Estados Unidos, ele repetiu 137 vezes a mesma apresentação. Mas nem tudo é monótono nessa labuta. Na primeira teleconferência, o executivo enfrentou a fatídica quinta-feira 16 de agosto. Nesse dia, a Bovespa chegou a cair 9% durante aquele pregão. Enquanto Santos falava sobre o desempenho da Redecard, o valor dos papéis mergulhava até 15,51%. No final do dia as ações se recuperaram e fecharam em alta de 2,78%. ?O sucesso não é meu, é da própria empresa?, afirma, sem falsa modéstia. ?Ainda estou aprendendo a ser RI?, diz Santos. Imagine se não estivesse.