Ataques verbais sistemáticos ao sistema de votação eletrônica, como os feitos pelo presidente Jair Bolsonaro sob a cumplicidade de seu entorno militar, serão uma sombra e tanto para o que o Brasil viverá pelos próximos 50 dias (48 até o primeiro turno das eleições mais as 48 horas após os resultados oficiais). Esses movimentos são agravados pela incapacidade de atuação plena e firme do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal Federal (STF), esvaziados e fragilizados pelo estado de inação da Procuradoria-Geral da República (PGR) em qualquer tema que trate do presidente. A estratégia da trupe de JB nem é nova. Mas causa estragos. Desqualifica-se o modelo em nome de questionar o resultado. Mistura legalidade com legitimidade. Seria irônico, já que na maioria das vezes em que ele se elegeu como deputado medíocre e mesmo presidente, foi por meio do modelo de urna eletrônica que agora critica. Mas será a crônica de uma tragédia anunciada. Mesmo que a segurança da tecnologia já tenha sido confirmada por ene organismos nacionais e observadores internacionais. Basta um ataque – que virá – numa linha remota de transmissão de dados dos votos, ou algo equivalente, para que todo o sistema seja colocado em xeque.

Forças Armadas inspecionam código-fonte de urna eletrônica no TSE

Os defensores da democracia no Brasil precisam estar armados de Cartas com mais de milhão de signatários, mas também de armas de contra-ataques de cibersegurança. A orquestração vai ser simples. Ataque-se algo qualquer no sistema, para demonstrar suposta fragilidade, e espalha-se a informação por meio de canais de divulgação de fake news. Com um terço dos eleitores escolhendo JB (número mínimo nas pesquisas eleitorais), estamos falando de 50 milhões de brasileiros apto a acreditar em qualquer bobagem. E quais canais serão esses? Redes sociais. Ou alguém aqui acredita que esses dutos de transmissão de informação estão totalmente controlados. Não estão. Um pouco por descaso de seus próprios proprietários, as Big Techs, e muito porque o próprio modelo é de difícil controle. Por dia, 500 milhões de usuários do Instagram usam seus Stories e em média os 1,4 bilhão de usuários passam na plataforma 53 minutos. checam suas páginas e são impactados por postagens.  são carregadas no Instagram. No YouTube, a cada minuto são transmitidas 694 mil horas de vídeos. É o equivalente a 80 anos de conteúdo exibidos a cada 60 segundos.

Fora os aplicativos de mensagens. Que multiplicam essa avalanche de conteúdos de maneira exponencial. O Telegram, aquele que seria banido do Brasil, vai estar mais ativo do que nunca. É uma questão de princípio de seus fundadores, os irmãos Pavel e Nikolai Durov. Há seis meses escrevi aqui (https://www.istoedinheiro.com.br/telegram-versus-justica-eleitoral-uma-guerra-que-o-brasil-ja-nasce-perdendo/) que a batalha entre o app e a Justiça brasileira é uma guerra que já nasceu vencida: pelos russos. Inteligentes e bilionários, eles criaram um app para não ser controlado por nenhum Estado ou nenhuma pessoa, por mais poderosa que seja. Mesmo que para isso o Telegram possa ser utilizado para ações criminosas. Numa reportagem de 2015, Pavel foi questionado pelo fato de integrantes do grupo radical Estado Islâmico usar o app para trocas de mensagens que geraram ataques e mortes. A resposta de Pavel foi: “Penso que a privacidade, e nosso direito à privacidade, sejam mais importantes que nossos medos de que coisas ruins, como o terrorismo, aconteçam”. Quatro anos depois, quando a Rússia ameaçou banir o Telegram, ele foi altamente irônico: “Devemos banir as palavras. Há informações de que terroristas se comunicam com elas.”

Será nesse ambiente de tecnobatalhas que teremos as eleições presidenciais de 2022. Mais que um teste de resiliência de nossa democracia e de nossas instituições, será um teste de resiliência tecnológica e de nossos comportamentos frente à tecnologia.