O empresário Marcelo Gutglas, 69 anos, sobe vagarosamente os degraus da escada de segurança que levam ao topo da montanha-russa do Playcenter, parque de diversões localizado à beira da Marginal Tietê, em São Paulo. Já do alto, ele olha para baixo com atenção, se segura no corrimão e desabafa. “Não tenho mais idade para isso.” 

11.jpg
Gutglas, o fundador: ”A fase de deslumbramento eu já tive, mas acabou.
Não queremos mais ser os maiores, mas os melhores e no tamanho certo”

A cena é espantosa para quem conhece a trajetória do homem que fundou o mais famoso parque de diversões do País, em 1973, e revela muito da trajetória do empresário que já atingiu o topo, caiu e se levantou novamente, como se a sua vida, com o perdão do trocadilho, fosse uma montanha-russa. 

 

Com investimentos iniciais de US$ 1,2 milhão, o espaço se tornou um símbolo da cidade, chegando a receber quase dois milhões de pessoas por ano. Mas nem tudo foi alegria nessa história. Na década de 90, quando Gutglas quis ir além e construir outro parque, o Playcenter entrou em crise e quase fechou seus portões. “A fase de deslumbramento eu já tive, mas acabou. 

 

Não queremos mais ser os maiores, mas os melhores e no tamanho certo”, desabafa Gutglas, um eterno persistente.  Isso mesmo, o empresário ainda luta para trazer os dias de glória novamente. Nos últimos cinco anos, esse boliviano, criado na Argentina e radicado no Brasil há mais de quatro décadas, investiu R$ 17 milhões no grupo, que também conta com pequenos parques em shoppin centers, os chamados Playlands, para fazer com que a empresa volte a faturar mais de R$ 100 milhões. 

 

Detalhe: está conseguindo. O investimento é relativamente pequeno, mas importante para quem recebia 15 mil visitantes por dia e atingiu o fundo do poço, em um certo dia de 2003, ao receber apenas 30 visitantes em seus 85 mil m2 (leia quadro).

  

Para entender como Gutglas se viu em queda livre e como pretende voltar ao topo é preciso voltar no tempo. O ano era 1995 e ele estava mais otimista que nunca. O empresário já havia criado os Playlands — centros de entretenimento localizados em shoppings — e achava que era o momento de realizar seu sonho: um parque temático cinco-estrelas. 

 

Sem dinheiro para um projeto desse porte, buscou a GP Investimentos como sócia. Assim, depois de quatro anos de construção e mais de US$ 170 milhões investidos, nascia o Hopi Hari. Localizado na Rodovia dos Bandeirantes, em Vinhedo, a quase uma hora de São Paulo, teria capacidade para 23,8 mil pessoas por dia. 

 

12.jpg

O sucessor: Roger Ely, o enteado de Gutglas, é o atual diretor-geral

do parque e o único da família envolvido nos negócios

 

Mas nem tudo correu como o planejado. Problemas ambientais e outros imprevistos exigiram mais aportes e o negócio não dava lucro. “Conforme a GP investia mais, a minha parte no negócio diminuía. O Playcenter passou a ter problemas por falta de dinheiro”, diz Gutglas. 

 

“O foco da GP era apenas o Hopi Hari”, conta, com uma boa dose de ressentimento. Em 2000, a dívida do grupo Playcenter chegou a R$ 111 milhões e a GP decidiu vender ativos do grupo, que tinha 48 Playlands, 20 boliches e unidades na Argentina e em Portugal.

 

13.jpg

  

“O Hopi Hari era uma equação que não fechava.” Em 2002, prevendo o pior, Gutglas recomprou  o controle do Playcenter e deixou a sociedade no Hopi Hari. “A GP deixou uma herança ruim, de uma imagem negativa do Playcenter. Retomei esse negócio por paixão”, declara. Procurada, a GP, que em 2009 vendeu o Hopi Hari com dívidas de R$ 500 milhões para a consultoria Íntegra, por R$ 0,01, não quis se pronunciar. 

 

O executivo tem cinco filhos e 15 netos, mas à exceção de Roger Ely, seu enteado, que é diretor-geral do grupo Playcenter, nenhum de seus herdeiros participa dos negócios. 

 

“Ninguém quis trabalhar com o parque”, desabafa. O segmento brasileiro de parques de diversão como um todo sofreu na última década. “A média que uma família brasileira gasta em parques de diversões é de R$ 10 mensais”, conta Francisco Donatiello, presidente da Associação das Empresas de Parques de Diversões no Brasil (Adibra). Nos EUA, esse valor é de US$ 300 (R$ 530). O segmento fatura cerca de R$ 803 milhões por ano e nele Gutglas é unanimidade. “Ele foi  o pioneiro no setor”, afirma Donatiello.