Se quiserem continuar crescendo, as grandes redes de supermercados vão ter de tomar o rumo do Interior e da periferia do País. Na prática, esse movimento já começou. O Carrefour, por exemplo, comprou a rede Planaltão, de Brasília, e a Roncetti, do Espírito Santo, a Mineirão, de Minas Gerais, e a Hiper Manaus, e os colocou sob o guarda-chuva da marca Champion. O Pão de Açúcar levou o Peralta, forte na Baixada Santista, e o Grupo Sonae arrematou o Muffatão, de Cascavel, no Paraná. E o grupo holandês Royal Ahold, quando entrou no Brasil, comprou logo a rede Bom Preço, com sede em Recife e mais de 100 lojas no Nordeste.

Em todos os casos, as grandes redes abriram novas frentes com outras redes e grandes lojas. Mas, agora, garantem os especialistas, os grandes supermercados vão ter que se voltar para um público que anda de ônibus e metrô e não tem carro para fazer suas compras. E que se abastece diariamente no mercadinho da esquina. Nesse terreno haveria um potencial de vendas de cerca de R$ 30 bilhões ao ano, até hoje inexplorado pelos gigantes do setor.

Aliás, são os mercadinhos os grandes desbravadores e que, por enquanto, permanecem a salvo das investidas dos grandalhões. O que se observa no universo dos supermercados é uma grande pulverização de pequenas e médias empresas. Uma recente pesquisa da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), em 4.469 dos 5.507 municípios, constatou que existem 23.220 lojas com duas ou mais caixas registradoras. E que essas lojas estão nas mãos de 18.766 empresas. Isso significa, em média, 1,4 loja para cada empresa. A despeito de grupos como o Pão de Açúcar, que exibem 416 lojas instaladas em 11 Estados. A pulverização de lojas e empresas é, no entanto, justamente inversa quando se fala em faturamento. E, aí sim, se dá a concentração. Os dez maiores grupos do País são responsáveis por quase 50% do faturamento anual do setor, de mais de R$ 60 bilhões.

Do seleto grupo dos cinco maiores, só o Casas Sendas, do Rio de Janeiro, resiste, em quinto lugar, ao assédio do capital internacional. A previsão de Arthur Sendas era faturar R$ 2,5 bilhões em 2000 nas suas 84 lojas. Não se sabe, contudo, até onde irá seu fôlego para enfrentar uma briga de gigantes. Mas Sendas largou na frente. Desde 1998 vem instalando pequenas lojas, de até mil metros quadrados, com cinco mil itens, chamadas de Superex.

Guerrilha. Para Claudio Filisoni de Angelo, coordenador do Programa de Administração de Varejo (Provar) da Universidade de São Paulo, os hipermercados cresceram, nos últimos anos, em cima da redução ou desaparecimento de redes especializadas em eletroeletrônicos, como a Casa Centro, Mappin, Mesbla, G. Aronson e Arapuã. ?A estabilidade da moeda e a inflação baixa abriram um novo nicho de mercado, principalmente na periferia dos grandes centros?, acredita Filisoni. ?Agora, as grandes empresas devem montar lojas com produtos para esse segmento.? É uma tendência já verificada em outras partes do mundo. Nos Estados Unidos, a rede Audi abriu dezenas de lojas com, no máximo, 300 metros quadrados cada.

Os maiores supermercados já produziram estudos sobre a viabilidade de lojas menores em bairros mais pobres. ?Vender bebida, comida e remédio é uma verdadeira operação de guerrilha, só entra quem conhece o terreno?, diz José Humberto Pires de Araújo, presidente da Abras, que vendeu 90% da rede Planaltão para o Carrefour. Segundo ele, as grandes redes passaram os últimos dois anos adaptando as lojas recém-adquiridas aos seus padrões operacionais. ?Em breve vamos divulgar o balanço do setor no ano 2000 e ele vai mostrar que os pequenos supermercados venderam mais?, adianta Pires de Araújo. ?Com isso, os grandes vão avançar sobre o mercado das pequenas lojas.? Não será surpresa, portanto, se nos próximos meses um Carrefour ou um Pão de Açúcar vier a ser aberto na favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, ou na favela de Heliópolis, em São Paulo.